sábado, abril 03, 2004
Álbum de Abril
Estando próximo o aniversário da negra data, não queremos deixar de contribuir para as comemorações.
Com esse intuito altruísta reproduz-se a seguir uma sequência poética composta por Rodrigo Emílio para o sétimo aniversário do 25 de Abril.
Reportagem
'stão às ordens da desordem
desalinho e desmazelo.
Grande afluência de flores,
a enfeiti(ç)ar o flagelo.
Pistolas-metralhadoras,
de cravo à boca - a mordê-lo:
de boca em flor, todas elas.
Atraentes, os traidores
ajardinam as lapelas:
derreados de flores,
lembram noivas e donzelas...
Fazem turismo,os janotas,
e desfilam, toleirões:
- de esporas, boinas e botas,
de orelhas e cinturões
pendem cravos idiotas
(hortas de cravos!); e as bocas
mastigam a voz em notas
de cansativas canções.
Vitoriam-se as derrotas.
Há clamores. Declamações...
Exibindo-se, a desoras,
pelas principais artérias,
deambulam gordas hordas
de gandulos e galdérias.
Toda a matula anda aos bordos:
Já ninguém se tem nas pernas -
salvo o judeu-agiota,
que também ajuda à festa.
Em vista de ser da corda,
sem demora acorre; e, à pressa,
outorga pastas e postas,
trauteia líricas lérias.
Como manda o protocolo,
toma de assalto as casernas;
abre portas, fecha portas
(portas, não: porta-moedas)
e, às pancadinhas nas costas,
tira o ventre de misérias
a magotes e magotes
de majores e de megeras.
Com traição às quatro rodas,
e outrossim à roda delas,
giram jeeps e unimogs
(por sinal, bastante beras!)
dando transporte de borla
- e sei lá se de capelo...-
a fornadas de uniformes
reles, reles, reles, reles...
(Co'a canalha tão canora
que a bordo deles se vê,
mais parecem wagons J
chaimites e berliets!...)
Recordo umas quantas fotos
datadinhas desse tempo:
são tão cómicas - tão cómicas -
que causa vómitos vê-las.
Coisa mais indecorosa,
francamente não conheço:
vai dar a tropa uma volta
- barbas ao vento, e o cabelo
a pedir valente corte,
tosquia sem paralelo,
boa tesoura da poda,
talhos de foice... e martelo.
Embalada, a fox-trot,
no bercinho dos pneus,
verde fauna, rubra flora,
move-se a malta soez
numa interminável frota
de gipões e de mercedes.
Transborda, a deitar por fora,
festejando mil revezes.
(- "Fora! Abaixo! Abaixo! Fora
já com eles! Morte a eles!...")
É, decerto, a maior corja
de camaleões e camelos,
de que há registo e memória
nos anais do pesadelo!...
Noto o sórdido recorte
d'uns recrutas de entremez
que, a monte, nas plataformas,
tremem como varas verdes.
(- 'starão a dormir na forma,
ou são apenas más rezes
condecoradas de nódoas,
limpando as mãos à parede?!...
- É bem outra a sua história.
O caso é simples, e é este:
cavaram todos de Angola,
amarelinhos de medo,
a sete-pés,cem-à-hora,
não fosse a guerra tecê-las...)
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Estando próximo o aniversário da negra data, não queremos deixar de contribuir para as comemorações.
Com esse intuito altruísta reproduz-se a seguir uma sequência poética composta por Rodrigo Emílio para o sétimo aniversário do 25 de Abril.
Reportagem
'stão às ordens da desordem
desalinho e desmazelo.
Grande afluência de flores,
a enfeiti(ç)ar o flagelo.
Pistolas-metralhadoras,
de cravo à boca - a mordê-lo:
de boca em flor, todas elas.
Atraentes, os traidores
ajardinam as lapelas:
derreados de flores,
lembram noivas e donzelas...
Fazem turismo,os janotas,
e desfilam, toleirões:
- de esporas, boinas e botas,
de orelhas e cinturões
pendem cravos idiotas
(hortas de cravos!); e as bocas
mastigam a voz em notas
de cansativas canções.
Vitoriam-se as derrotas.
Há clamores. Declamações...
Exibindo-se, a desoras,
pelas principais artérias,
deambulam gordas hordas
de gandulos e galdérias.
Toda a matula anda aos bordos:
Já ninguém se tem nas pernas -
salvo o judeu-agiota,
que também ajuda à festa.
Em vista de ser da corda,
sem demora acorre; e, à pressa,
outorga pastas e postas,
trauteia líricas lérias.
Como manda o protocolo,
toma de assalto as casernas;
abre portas, fecha portas
(portas, não: porta-moedas)
e, às pancadinhas nas costas,
tira o ventre de misérias
a magotes e magotes
de majores e de megeras.
Com traição às quatro rodas,
e outrossim à roda delas,
giram jeeps e unimogs
(por sinal, bastante beras!)
dando transporte de borla
- e sei lá se de capelo...-
a fornadas de uniformes
reles, reles, reles, reles...
(Co'a canalha tão canora
que a bordo deles se vê,
mais parecem wagons J
chaimites e berliets!...)
Recordo umas quantas fotos
datadinhas desse tempo:
são tão cómicas - tão cómicas -
que causa vómitos vê-las.
Coisa mais indecorosa,
francamente não conheço:
vai dar a tropa uma volta
- barbas ao vento, e o cabelo
a pedir valente corte,
tosquia sem paralelo,
boa tesoura da poda,
talhos de foice... e martelo.
Embalada, a fox-trot,
no bercinho dos pneus,
verde fauna, rubra flora,
move-se a malta soez
numa interminável frota
de gipões e de mercedes.
Transborda, a deitar por fora,
festejando mil revezes.
(- "Fora! Abaixo! Abaixo! Fora
já com eles! Morte a eles!...")
É, decerto, a maior corja
de camaleões e camelos,
de que há registo e memória
nos anais do pesadelo!...
Noto o sórdido recorte
d'uns recrutas de entremez
que, a monte, nas plataformas,
tremem como varas verdes.
(- 'starão a dormir na forma,
ou são apenas más rezes
condecoradas de nódoas,
limpando as mãos à parede?!...
- É bem outra a sua história.
O caso é simples, e é este:
cavaram todos de Angola,
amarelinhos de medo,
a sete-pés,cem-à-hora,
não fosse a guerra tecê-las...)
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