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quinta-feira, agosto 19, 2004

SALAZAR, visto por Franco Nogueira 

Na revista "Política", de que era director Jaime Nogueira Pinto, no seu n.º 14/15, correspondente à quinzena de 15 a 30.07.1971, o Embaixador Franco Nogueira publicou um breve texto onde, com a sua excepcional capacidade de descrição e síntese, transmitiu a sua visão do Presidente Salazar, como pessoa e como governante. Aqui vai.

"Na sua extrema complexidade, Salazar foi acima de tudo uma vontade inquebrantável, com domínio constante e absoluto sobre todo o seu ser. Da sua energia íntima retirava toda a sua força. Sensível, nervoso, emotivo, permanecia contudo sempre sereno, frio, sem cóleras, desapaixonado, sem pressas, sem excitação, em particular quando em torno de si todos se mostravam incertos e perplexos. Nunca o abandonava a sua lucidez, que usava como método de penetração e conhecimento da realidade, nem jamais se obscurecia ou enfraquecia a sua capacidade de análise demorada, lenta, minuciosa, de que extraía conclusões e sínteses, arquivava-as de forma sistemática, e dava depois a sensação de haver reflectido durante séculos sobre cada assunto ou situação. Aderia e entregava-se a tudo quanto o cercasse em cada instante; cuidava de cada problema com uma absorção exclusiva e intensa, como se nenhum outro existisse e como se, para encontrar a melhor solução, tivesse à sua frente a eternidade. Criador da lei, era o seu primeiro escravo, e submetia-se-lhe como seu mais humilde servo. Defensor do Estado, não subordinava essa defesa a quaisquer outros critérios ou considerações; era glacial no tratamento e condução dos negócios públicos; e por acto de vontade calcava gostos pessoais, vencia emoções, suprimia ressentimentos, desconhecia ofensas. Escutava sem interromper, com atenção concentrada, e retinha com fidelidade quanto se lhe dizia; não se sentia afrontado com objecções ou ideias opostas; não era impressionável, nem influenciável; mas factos e argumentos alteravam a sua posição. Era intransigente nos princípios, mesmo que pudesse correr risco de destruição; mas era flexível na táctica e subtil na mudança de rumo; e dava à nova linha que prosseguisse uma nova construção lógica, de modo a não se contradizer nem desmentir. Considerava-se emanação genuína do povo, de cujos interesses se sentia universitário, e cujos sentimentos misteriosamente compreendia e avaliava. Era céptico e indiferente perante as élites. Delegava autoridade, e aguardava que cada um cumprisse o seu dever; mas não tinha no íntimo a segurança de que o fizessem. Não pedia favores, e não aceitava obséquios que lhe criassem dependências ou familiaridades. Interessava-se por tudo, e informava-se nos mínimos pormenores; e sabia em cada momento qual a posição política e pessoal de cada homem que contasse no País. Tinha acima de tudo um ângulo de visão só nacional."

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