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segunda-feira, setembro 20, 2004

NACIONALISMO REVOLUCIONÁRIO E NACIONALISMO REACCIONÁRIO 

I – Os dados da questão
Há um pensamento nacionalista que é uma edição de pequenas vaidades, um círculo estreito e fechado. Essencialmente chauvinista, procura mais transplantar o passado (encarado não como passado, mas como presente) para a actualidade, do que injectar vida nova e continuar o fio histórico da comunidade.
Este nacionalismo estreito (que José António designava, neologicamente, como "nacionalitarismo") recorre frequentemente a uma semântica "patriótica", mas tem uma visão irremediavelmente "classista" do Estado, uma concepção "maniqueísta" da vida social, um entendimento "romântico" da realidade nacional. Numa atitude tipicamente "reaccionária", volta-se de costas para o futuro, e a cumprir uma "unidade de destino" prefere servir de sustentáculo ao regime que melhor lhe assegure a sobrevivência como materialização socio-política.
Enquanto pensamento, fecha-se no mais fanático dos dogmatismos; como forma política, pelo contrário, renega toda a sua crença para poder sobreviver; como forma de acção, prefere, como dizia Ortega, "a pousada ao caminho".
Mas há um outro nacionalismo que não pretende negar a realidade, com base numa qualquer pseudomoral objectiva. Rejeitando a atitude seráfica do diletante perante o fenómeno político, assume-se como mensageiro e agente de uma revolução radicalmente diversa das suas formas históricas, sempre de índole particularista. Não quer uma revolução de classe, mas uma revolução totalizante, "solidária". E não deseja sobretudo o contrário de uma revolução, mas uma revolução (classista) ao contrário.
E este "nacionalismo revolucionário" (é-o, materialmente. Formalmente, pode assumir aspectos semânticos e "superestruturais" diversificados) não é só uma base de resistência: embora construído, pensado e alicerçado à sombra e fora dos vários avatares do Estado Moderno, constitui cada vez mais, com o ruir sucessivo das formas políticas hodiernas, "uma alternativa".
Alternativa que pode assumir-se como projecto político. E é disso que queremos aqui dar notícia.

1 – Como filosofia de acção opõe-se às formas de romantismo político
Não é uma "ideologia", ou seja, não é "um sistema global de interpretação do mundo histórico-político" (acepção de R. Aron, in "Trois Études sur la Societé Industrielle"). Não pretende pegar no "homem real" e adaptá-lo a uma construção especulativa, mas restituir à sociedade o seu perdido aspecto humano. Daí o procurar ajustar as instituições à sociedade real, e não o contrário. O nacionalismo revolucionário quer, "não estabelecer um programa para o ano 2000", mas agir pragmaticamente, conforme o exigirem os interesses da nação/unidade de destino no universal, e do povo/comunidade social solidária. Por isto, não interessam tanto as justificações que se possam fabricar para acompanhar a acção política, mas sim essa mesma acção, não tomada como "moral absoluta", mas intrinsecamente moral, já que destinada a alterar um conjunto de estruturas para as restituir à realidade (1).
Tem do "povo", não o conhecimento superficial dos teóricos liberais, mas o convívio real com as camadas produtivas da população, partindo, pois, para qualquer análise do homem com o seu ambiente familiar, profissional, cultural, não do "cidadão", indivíduo reduzido ao estado abstracto e despojado, pela ideologia demoliberal, das suas qualidades sensíveis.

2 – Demonstra que a posse do território não é uma questão moral
Sabe que a nação não é uma construção teórica, nem uma mera unidade geográfica, étnica ou político-económica, mas uma "unidade trigeracional" (Ortega, Duguit, Spirito), uma "comunidade de destino no universal" (Evola, José António, Guénon), que só sobreviverá enquanto for forte, e só será forte se souber preservar a sua unidade física, independentemente, da forma política que adopte. Mais do que uma desfasada "politique de grandeur", politica do real e do possível, sem desvarios ou miragens mas sobretudo sem concessões. Porque, em última análise, dá -se razão a Hobbes: "A liberdade é o poder".
A defesa do território não é, pois, na sua essência, uma questão moral: é um imperativo de sobrevivência.

3 –Pretende uma estrutura do Estado que não se exige na sociedade civil
Defende um modelo de Estado em que se oblitere o presente divórcio entre classes produtivas e "classe política". O Estado terá de ser a mera conformação da sociedade, o reflexo da sua vivência, da sua estrutura e do seu sentir.
Assim, o poder deve ser exercido pelas forças reais da nação, sindicatos, associações de produtores, autarquias, e não pelas máquinas partidárias ou pela casta que segregam, elementos essenciais de desagregação e entidades estranhas ao “país real", que, pelo trabalho quotidiano, assegura a continuidade material da unidade política usufruída pela oligarquia dominante.

4 – Luta por uma adaptação do “político” ao real
Por mais malabarismos formais que se efectuem, os actuais sistemas políticos continuam a assemelhar-se a uma fotografia amarelecida, a um "cliché". E isto, porque o grande drama do mundo moderno é o de a evolução política não ter acompanhado e tido em conta o avançar das ciências físicas e humanas, das próprias modificações da textura social.
Ora, o nacionalismo revolucionário não procura ignorar, antes salienta, a validade da contribuição dos novos ramos científicos, para uma melhor compreensão do comportamento humano e da vida social. Enquanto as ideologias dominantes se atarefam em pintar o homem ideal às suas manipulações, aquele procura surpreender o homem no seu meio, interpretando os seus gestos mais elementares à luz dos modernos dados das várias disciplinas antropológicas, procurando libertar a acção política de dogmas indemonstráveis, para a encarar como uma continuidade do todo.
Estes princípios, tomados como pólos de acção, levarão consequentemente a uma prática política determinada. Exporemos, proximamente, o que, nas coordenadas do mundo moderno, poderá ser uma política nacionalista revolucionária.
Aí veremos sinteticamente aquilo que separa o "militante", que sabe unir o pensamento à acção, do "diletante", que pela sua atitude inútil e dispersiva, apenas serve para adiar os mecanismos de mudança, entendidos talvez ainda só por alguns, mas que muitos já pressentem como realidade inelutável.
NUNO ROGEIRO (Setembro de 1979)

(1) Quando Georges Sorel reflectia sobre a "violência neces­sária " à acção política revolucionária exprimia, de certo mo­do, o carácter anti‑intelectualista que viria a assumir a luta na­cionalista revolucionária, o seu receio de servir de trampolim a uma “ideologia”, entendida no sentido que apontámos, como uma visão fraccionária do mundo.
Karl Marx viu também com clareza o problema, aperceben­do‑se da deformação da realida­de produzida pela mundividên­cia burguesa. Quando Marx fala nos “fetiches”, refere‑se às justificações encontradas pela burguesia ascendente para manter a sua ordem . Essas justifica­ções, sem base real sensível, an­tes fruto de uma construção teórica, constituiriam o elemento ideológico, jurídico e político da ordem capitalista, elemento que se consubstancia­va finalmente no Estado. Este, como estrutura classista, deveeria assim desaparecer. Mas Marx, ao pretender desmontar a ilusão política para recuperar a. realidade, encerrava‑se tam­bém, imperceptivelmente, num edifício formal desfasado dessa mesma realidade. E criou‑se as­sim uma mitologia, uma religião tanto mais ambígua quanto pretensamente científica. Ora, o que a filosofia de acção na­cionalista revolucionária e a vi­são analítica neomaquiavélica a que frequentemente recorre pretendem é ultrapassar os fraccionamentos no real provo­cados pelo “idealismo" demoliberal (com as suas variantes, mais ou menos "sociais"), e pe­la sua doença infantil, o pseudo‑realismo marxista, afinal, um neo‑romantismo
.
N.R.

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