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terça-feira, setembro 21, 2004

NACIONALISMO REVOLUCIONÁRIO E NACIONALISMO REACCIONÁRIO 

II – Nova visão da política
Nova atitude perante o mundo


1. "Não há pensamento sem acção. Só se pensa na medida em que, agindo sobre o pensamento, este é experimentado, adaptado, e lhe é assegurado um sólido degrau para subir mais alto... Mas, em última análise, ninguém sentirá que se correu um risco real ao prosseguir se esse pensamento, se não nos deixarmos morrer por essas mesmas ideias" (Drieu La Rochelle).
Vimos, no artigo anterior, que a realidade passível da designação "nacionalismo revolucionário" não concebe a acção ideológica como um vector desconexo, e muito menos estranho, em relação à acção política. A militância, qualidade tomada como base essencial da acção revolucionária, exige precisamente a unidade entre pensamento e acção que refere Drieu. Porque, se a transformação da realidade passa pela luta política, entendida como acção directa, esta só adquire sentido e eficácia (eficácia "porque" sentido) se moldada e informada por um edifício normativo, ainda que reduzido a um aspecto básico.
O diletante analisa, disserta e (por vezes) conclui, mas não trata de se aplicar em transformar o Mundo. A sua memória cultural serve-lhe de espelho, e não de martelo. Ao militante, e ao militante revolucionário em particular, interessa uma "política de mudança": porque acredita e deseja que a revolução se cumpra ante a constatação de uma realidade que não pode durar mais (e a este nível há uma necessidade de mudança intelectualmente formulada, apesar de se poder fundar numa mera regra de sobrevivência animal) e porque compreende que "viver é, antes de mais, comprometer-se".
Para o que vimos chamando "nacionalismo revolucionário", o pensamento não pode assim erigir-se em entidade que impeça a acção revolucionária. Melhor, essa acção é o preço pelo qual o pensamento actua sobre a realidade.
E ver-se-á sem custo que, em muitas ocasiões, a acção revolucionária forja uma certa consciência. Tomemos só um exemplo: em Budapeste, durante o Outono de 56, os operários metalúrgicos que defenderam as pontes da cidade contra os tanques soviéticos não tinham com certeza qualquer veleidade de estarem a mudar o que quer que fosse à face da Terra. Limitavam-se a defender o solo onde viviam e tinham visto a luz perante os uniformes cinzentos daqueles que lhes apareciam como carrascos e esbulhadores. Mas em Novembro já destruíam a estátua de Estaline, no centro da cidade, e escreviam "slogans" nacionalistas nas paredes esburacadas pelo tiroteio. O próprio Kremlin se apercebeu desta tomada de consciência, deste "salto dialéctico" do campo do instinto de defesa para o do sentimento colectivo da existência nacional, com amigos e inimigos delineados, com "leitmotivs" diversos erigidos em estandartes de combate. Sintomático é o facto de, para Moscovo e para o governo Nagy, tudo ter começado com “tumultos dispersos de arruaceiros" e terminado "numa conspiração organizada pelo fascismo nacional e internacional", reprimida em sangue.
Aquele que ergue uma barricada pode fazê-lo por opção e convicção intelectual, assim como o que atira uma pedra instintivamente o faz por ter sido agredido o seu "espaço vital", o seu quadro de vivência. Porém, em qualquer dos casos nada impede que se possa encontrar a consciência política no fim do cano de uma espingarda.
2. Tudo isto para concluir que, ao "nacionalismo revolucionário" repugna o fraccionamento arbitrário e artificial da realidade. Pensamento e acção são uma realidade e só um raciocínio especulativo de raiz formalista os encarará como entidades completamente autónomas e dotadas de qualidades contrárias.
Porque em lugar de contemplar interessa agir, no tempo e no lugar próprios. Tínhamos delimitado alguns parâmetros do pensamento nacionalista revolucionário. Eis agora, inseparáveis "de facto", as propostas.

POLÍTICA DE RUPTURA COM A ACTUAL VISÃO MANIQUEISTA DO MUNDO
2.1. A luta nacionalista revolucionária desenrola-se, não contra os Estados (também contra eles, como é evidente), mas sobretudo contra o Estado, na sua essência, "tal como o conhecemos, a Leste e a Oeste", simples cobertura de uma ordem injusta, que, apesar das variações "superestruturais", permanece a mesma. E logo aqui se vê o que separa este nacionalismo das direitas e das esquerdas regimistas. Estas querelam-se "dentro" do sistema, apenas visam o "poder legal" e gritam por reformas, para que nada se transforme essencialmente, sob a capa da adaptação às exigências de renovação histórica. Como dizia Georges Valois, um socialista revolucionário dos anos 20, "coisa curiosa: longe de visar o Estado, os homens da direita e da esquerda ergueram-se uns contra os outros, segundo as palavras de ordem: todos erguidos contra o comunismo! Ergamo-nos todos contra o clericalismo, ou a reacção, ou o fascismo! E foi assim que vários governos obtiveram a paz e que o Estado Parlamentar ainda permanece de pé".
Porque Direitas e Esquerdas são afinal produtos de uma mesma lógica, encontram-se unidas por um cordão umbilical que lhes permite subsistir umas em função das outras. Irmãs inimigas põem-se geralmente de acordo quando se trata de reprimir aqueles que podem realmente pôr em perigo o "establishment". Importante ainda é referir que a existência de uma "direita" e de uma "esquerda", nascidas historicamente de uma disposição parlamentar, serve de justificação às cliques partidárias que pretendem dar do seu regime uma ideia de liberdade a que chamam "pluralismo". Mas não há liberdade alguma, quer nas "democracias parlamentares", quer nas "democracias populares": é sempre a mesma casta que ocupa a Administração e detém as chaves do Estado. Tentar provar-se a excelência da "democracia ocidental", individualista, fraccionária, dominada pelos “lobbies" e pelos vários grupos de pressão, devido à sua "superioridade moral" (mercê da existência de "liberdades políticas") em relação ao sistema concentracionário, burocratizado, planificado de Leste, é esquecer deliberadamente que o que separa os dois subsistemas é apenas um factor "quantitativo": Moscovo conseguiu levar até às últimas consequências os pressupostos das utopias oitocentistas, e, dando-se conta do fracasso, executa agora um retrocesso. Mais tarde ou mais cedo, como sublinhava Emmanuel Todd, a URSS será "totalmente" recuperada para a "sociedade de consumo", pondo-se fim ao cisma que dividiu durante anos a civilização que "o burguês criou à sua imagem e semelhança". Werner Sombart provou, ainda no princípio do século, que não existiria fundamental dissemelhança entre um "capitalismo estabilizado e regulamentado e um socialismo racionalizado e que utilize todos os recursos da técnica". Ambos se baseariam no mesmo vício: a desumanização, o desconhecimento e a agressão sistemática da realidade.
É por isto que, liberto da obsessão quantitativa que tolda a vista às formas políticas contemporâneas, preconiza o nacionalismo revolucionário uma "nova ordem" social, económica e política.
2.1.1. Na base, a questão da propriedade privada ou colectiva é pragmática, e não de princípios. Ou seja, a propriedade vale pelos seus resultados sociais (Manoilesco, Spirito, Nasti), e a superioridade de um sistema deriva da experiência da sua aplicação. De qualquer forma procura em linhas gerais o NR reconciliar o valor essencial que é o trabalho, com as necessidades de investimento, através da prática de um sistema de justiça distributiva "real", que se oponha quer ao "capitalismo puro e duro", sugador das energias nacionais, quer ao "socialismo" dos teóricos, que privilegia a justiça formal, e ainda ao "comunismo" concentracionário, que concretiza de uma forma brutal os sonhos mais inconfessáveis da casta tecnocrática anglo saxónica e europeia.
2.1.2. Propõe a participação de todos os corpos de interesse público na formação da vontade política do Estado, participação que variará de intensidade na razão directa da importância dessas entidades na construção e manutenção da vida em sociedade. Defende a revitalização dos espaços culturais nacionais, o fortalecimento da resistência à política de blocos, a criação de novas áreas económicas internacionais que proporcionem uma saída eficaz do actual impasse gerado entre países ricos e países pobres, entre economias dominadas e dominantes.
NUNO ROGEIRO (Setembro de 1979)

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