quinta-feira, março 10, 2005
FASCISMO — 67
«Ce mal du siècle, le Fascisme...» A epígrafe de "Notre Avant-Guerre" desenha-se diante dos meus olhos no limiar destas linhas... Talvez porque as não escrevo para justificar, interpretar, ou fazer doutrina, talvez porque são apenas um testemunho... Talvez porque se destinam não aos outros, mas a nós, aos da minha raça e da minha geração, aos que nascemos depois da guerra e, partilhando caminhos e combates, de opção em opção, nos encontramos hoje neste lugar que é o mais difícil e o mais grato, impregnados, também nós, desse mal do século... o Fascismo.
E, ao rememorarmos, formulamos interrogações, no correr dos dias, a buscar, sem retoques nem ângulos favorecidos, o retrato em que nos revemos; no tempo e na trajectória a encarar as circunstâncias, as raízes, as determinantes da nossa crença.
E a evocação será profissão de fé que terá, por signatária, toda uma geração que soube reencontrar, nos templos em ruínas de religiões malditas, um Caminho, uma Força, uma Razão de Vida.
Porquê Fascismo — 67? Onde achar as fontes de ressurgimento de nomes proibidos? Como explicar que vinte anos de sistema não tenham aniquilado os derradeiros vestígios daquilo a que Roosevelt chamou a «lepra fascista»? Como ter de admitir que os sobreviventes de ontem sejam olhados hoje como pioneiros? Porquê, em Paris, em Pretória, em Berlim, em Roma, em Madrid, em Lisboa, aparecem homens que sem medo às palavras e às consequências se proclamam fiéis à Ideia, e cerram fileiras em volta de flâmulas que o mundo julgava queimadas — para sempre... E os que o fazem têm na sua maioria vinte anos e riem, com o riso próprio da idade, dos murmúrios e inquietações que levantam.
No limiar da pesquisa abro Drieu, que tenho por exemplar na lucidez: — «Sou fascista porque medi os progressos da decadência...» «Sem deuses, nem mestres, aqueles mortos, estes ainda por nascer, tínhamos apenas a nossa juventude. Em que mais podíamos acreditar?»
Também para nós a Decadência foi circunstância... Encontrámo-la por toda a parte, nos rostos dos homens, nas páginas dos livros e nas instituições, nesta civilização tecnocrática e igualitária, nesta sociedade de bem estar que nos propunham como ideal primeiro. Encontrámo-la, e foi o mais grave dentro de nós, nas dificuldades e desculpas que nos deparámos, quando quisemos impor-nos um rumo. A revolução começa em cada um, por uma revolução de si próprio. O primeiro acto é opção, é renúncia ao que foi, ao que poderia ter sido, às soluções simples, às formas tranquilizadoras. Não fizemos então sacrifício, porque escolhemos, sem pesar pelo que abandonámos, antes com amor pelo que seguimos. «Tínhamos apenas a nossa juventude.» E o melhor do seu entusiasmo, consagrámo-lo ao Fascismo. Por isso, para nós, Fascismo e Juventude se confundem, neste recordar do tempo que passou...
A primeira impressão da ideia é de alegria e de esperança. Lemos então Brasillach, cronista por excelência dos anos trinta, e não ficámos indiferentes à mensagem, mau grado as brumas e os ensinamentos dos mais velhos que dominavam o panorama. E sentimos o mesmo ânimo que impulsionara Brasillach, sentimo-lo a percorrer-nos as artérias, o mesmo orgulho a acicatar-nos a vontade, a mesma fé a dominar-nos o espírito — ao memoriar esse fascismo dos desfiles, das bandeiras, das catedrais de luz, dos heróis mortos em combate, o fascismo «imenso e rubro» de José António, de Corneliu Codreanu, o fascismo da Falange, do Alcazar, do Congresso de Nuremberga, da Legião do Arcanjo S. Miguel... O primeiro fascismo, o fascismo da nossa adolescência, que nos fez faltar às aulas, reconstruir o mundo em «reuniões secretas» e folhas copiografadas, o fascismo em nome do qual travámos escaramuças e conhecemos companheiros. Aprendemos aí o ethos da amizade, em que um camarada é um irmão de sangue porque pensa como nós, porque vive e luta ao nosso lado. Aprendemos a alegria e a esperança que não mais nos deixaram. E também a lutar com determinação, mas sem ódio, simplesmente...
Depois, julgo que crescemos depressa... Seria muito exigir romantismos duradouros aos que viviam no exílio, testemunhas de tantas cobardias e abdicações.
O tempo e os homens se encarregaram de nos trazer a justa medida entre ilusão e real que se chama lucidez. Mas antes disso, quantas vezes nos quedámos, como o cavaleiro andante de Antero, de espada quebrada e armadura rota, indecisos, quase vencidos, quase a ceder, quase a partir... E houve quem o fizesse por prudência, por desgosto, por cálculo. Alguns traíram, alguns traíram-nos e traíram a sua juventude...
Chega-nos, outra vez, a voz de Drieu: «É preciso ficar, a gritar a verdade até que vos estrangulem... É preciso não ir embora nunca...» É preciso ficar... Cerrámos os dentes, fincámos os pés e ficámos... Talvez porque para nós a própria batalha fosse já vitória, talvez porque, como dizia Degueldre, por esse tempo fuzilado, não importava perder ou ganhar, o essencial era batermo-nos. E, de novo, Drieu: «O Fascismo é a crispação do homem europeu em torno da ideia de virtude viril que sente ameaçada pelo curso inevitável das coisas para a paz definitiva...» Para nós, em certo momento, o Fascismo foi isso, uma crispação contra o inevitável, um combate em que não contabilizámos amigos e inimigos, perdas ou ganhos. Um combate em que nem sequer nos importou vencer, só ficar, até ao fim...
«Fascismo é uma concepção subjectiva da vida, uma moral, antes de mais uma estética...» As palavras de Turiais foram, nessa ocasião, tentadoras. Assim como Malraux viu na Revolução Marxista a terra prometida do heroísmo, para alguns de nós o Fascismo, foi isso e só isso, uma Pátria de guerreiros. Turiais morreu em 1944, no exército de Leclerc... Creio que é importante meditarmos nisto, pois também para nós, a certa altura, corremos o perigo de nos transformarmos em soldados sem bandeira, em mártires por engano...
Então, lemos e meditámos páginas sobre Coerência e Fidelidade. Nos exemplos, nas palavras e no sangue dos companheiros mortos, aprendemos a lição dos deveres amargos por obscuros, que o heroísmo pode ser uma conquista do quotidiano, que vencer era um imperativo e o primeiro. Compreendemos que nas mãos guardávamos um futuro, demasiado grande para se jogar de ânimo leve. E compreendemos, também, que a perdermos, nem sequer seríamos lembrados...
Compreendemos que o preço da Coerência seria, por enquanto, não o sangue, mas o ostracismo e o silêncio. E na sombra talhámos metódica, implacavelmente, os alicerces da Revolução. E este aceitar de um dever, de um trabalho obscuro, foi para nós medida da fidelidade...
Porque só se luta pelo que se ama, só se ama o que se respeita e só se respeita o que se conhece, impusemo-nos as disciplinas de estudo e da reflexão. Como inimigos do comum, sabíamos que tínhamos que ser os melhores, os mais esclarecidos...
Na herança do passado buscámos raízes e coordenadas... A sugestão podia vir de uma página das Sagas, da história de Eric ou Leif que navegaram para Ocidente, do rosto de um condottieri esculpido por Verrochio, das crónicas desses homens brancos que em Quinhentos talhavam Impérios... Mas havia sempre a força unificadora da mesma Raça e da mesma Cultura... E em homens distantes no tempo e no lugar, dos centuriões anónimos do limes aos pioneiros afrikanders, em Robert Clive, em Dupleix, em Albuquerque, em Mousinho, descobrimos idêntico sentir de Império...
Reencontramos a tradição do cristianismo viril das catedrais e da Contra-Reforma, a lição de Inácio de Loiola e de Teresa de Ávila, no nosso tempo Charles Péguy a ensinar que as cidades carnais são corpo real na cidade de Deus, por cidades carnais a morrer no Chemin des Dames, deixando-nos esta divisa: «Morrer jovem, numa grande batalha, eis a suprema felicidade...».
Nos escritos de Spengler, de Georges Sorel, em Mosca, em Pareto, num certo Valéry, no Jünger de entre duas guerras, colhemos diagnósticos do nosso tempo, aprendemos o papel dos homens de vontade, das ideias de grandeza e decadência no destino dos povos.
E não deixamos de incluir entre os mestres ao lado de um Giovanni Gentile, de um Ernst Krieck os nomes de Maurras, de Donoso Cortes, de Alfredo Pimenta.
Reaccionários? Somos reaccionários no sentido de Constantin Léontiev, que dizia não poder conceber que os poetas tivessem cantado, os mártires tivessem morrido, os cavaleiros lutado nos torneios para que o burguês se viesse divertir sobre as ruínas desse passado de grandeza. Como o monge de Optina, espírito profundamente religioso, revoltamo-nos contra a mediocridade do século, contra os literatos, os satisfeitos, os curiosos, que pelo ensino médio julgam tudo entender e resolver. Como combatemos esse socialismo («capitalismo das classes inferiores» lhe chamou Spengler), que nos diziam ser a chave do Paraíso... Somos, sim, pelo socialismo que não funciona «à base da inveja», que requer a dignificação popular, que é amor da justiça, defendemos essa atitude moral ditada pela vontade de integrar o povo na Nação, pois que é uma exigência ética, do mesmo sentido de harmonia que ordenou o nosso pensamento.
Deste modo e só deste, somos reaccionários... Como no ataque intransigente aos dogmas da sociedade técnica, ao individualismo igualitário, à democracia, ao enrichissez-vous, fomos os verdadeiros e únicos revolucionários...
E se em Guénon e Evola colhemos as coordenadas da revolta contra o mundo moderno, em Ezra Pound, em Tomazzo Fillipo Marinetti, em alguns de Orfeu, aplaudimos a autêntica modernidade, a que leva os estigmas do génio e da criação...
Nas páginas dos mais próximos, num Roger Nimier, num Jean René Huguenin (estou a lembrar-me de "Une Autre Jeunesse"), encontramos a mesma frescura, a mesma juventude, o mesmo desprezo pelo intelectualismo fácil, pela mediocridade dos homens e dos dias, a mesma atitude que nos seduziu na adolescência...
Como ao ler, agora «Ma peau au bout de mes idées» do capitão Phillipe Sergent, ainda mais certos ficámos de que nos contemporâneos há homens, de que vale a pena fazer tudo para ser digno de tais companheiros.
Nomes, destinos cruzados, onde aprendemos, meditamos, onde construímos, onde achamos motivos de renovação e vivificação da fé de adolescência...
Aqui chegados, cumpre dizer algo sobre o futuro. E de novo o autor de Socialismo Fascista, que nos guiou na retrospectiva, vem indicar-nos o caminho a seguir. Restaurar os valores de aristocracia e de autoridade, fazer a revolução a partir de uma minoria activa, disciplinada, unida por estreitos laços de fidelidade ideal e pessoal, informada no culto dos valores espirituais, de Deus, da Raça, do Império, animada por indefectível vontade do poder, disposta a ir até ao fim, até à vitória...
«Em tempo de paz a juventude recebe exemplos, em tempo de guerra dá-os» escreveu Bonnard. Quis Deus que vivêssemos estes anos tormentosos e difíceis, «anos decisivos» em que se joga o futuro do mundo e da civilização, este tempo de guerra impiedosa e total; é com alegria que nos submetemos às suas determinações e com fé que nos preparamos para cumprir a nossa missão, contentes por tudo ter sido assim...
Antes do termo, olho ainda os outros, os adversários, os críticos, os indiferentes, os que estão e vão ficar na terra de ninguém... Não posso deixar de sorrir ao teor dos seus argumentos, ao símile das águas do rio que passam e não voltam, refúgio e consolação com que escondem o rosto da verdade...
Noutros lugares, alguns hierarcas vêem-nos com suspeição, a pensar talvez utilizar-nos, abandonando-nos depois... Mas não se iludam: amamos demasiado a liberdade da nossa juventude, para sermos mercenários ou lacaios de alguém... E depois há o pequenino grão que pode fazer ruir todo o sistema... É que os que, sem medo às palavras e às consequências, aqui estamos, aqui militamos, neste Fascismo 67 — temos vinte anos. Portanto, o que nos importa que sejais contra nós, se os vossos filhos estão connosco?...
Jaime Nogueira Pinto
(In «Agora», n.º 329, 04.11.1967, pág. 13.)
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E, ao rememorarmos, formulamos interrogações, no correr dos dias, a buscar, sem retoques nem ângulos favorecidos, o retrato em que nos revemos; no tempo e na trajectória a encarar as circunstâncias, as raízes, as determinantes da nossa crença.
E a evocação será profissão de fé que terá, por signatária, toda uma geração que soube reencontrar, nos templos em ruínas de religiões malditas, um Caminho, uma Força, uma Razão de Vida.
Porquê Fascismo — 67? Onde achar as fontes de ressurgimento de nomes proibidos? Como explicar que vinte anos de sistema não tenham aniquilado os derradeiros vestígios daquilo a que Roosevelt chamou a «lepra fascista»? Como ter de admitir que os sobreviventes de ontem sejam olhados hoje como pioneiros? Porquê, em Paris, em Pretória, em Berlim, em Roma, em Madrid, em Lisboa, aparecem homens que sem medo às palavras e às consequências se proclamam fiéis à Ideia, e cerram fileiras em volta de flâmulas que o mundo julgava queimadas — para sempre... E os que o fazem têm na sua maioria vinte anos e riem, com o riso próprio da idade, dos murmúrios e inquietações que levantam.
No limiar da pesquisa abro Drieu, que tenho por exemplar na lucidez: — «Sou fascista porque medi os progressos da decadência...» «Sem deuses, nem mestres, aqueles mortos, estes ainda por nascer, tínhamos apenas a nossa juventude. Em que mais podíamos acreditar?»
Também para nós a Decadência foi circunstância... Encontrámo-la por toda a parte, nos rostos dos homens, nas páginas dos livros e nas instituições, nesta civilização tecnocrática e igualitária, nesta sociedade de bem estar que nos propunham como ideal primeiro. Encontrámo-la, e foi o mais grave dentro de nós, nas dificuldades e desculpas que nos deparámos, quando quisemos impor-nos um rumo. A revolução começa em cada um, por uma revolução de si próprio. O primeiro acto é opção, é renúncia ao que foi, ao que poderia ter sido, às soluções simples, às formas tranquilizadoras. Não fizemos então sacrifício, porque escolhemos, sem pesar pelo que abandonámos, antes com amor pelo que seguimos. «Tínhamos apenas a nossa juventude.» E o melhor do seu entusiasmo, consagrámo-lo ao Fascismo. Por isso, para nós, Fascismo e Juventude se confundem, neste recordar do tempo que passou...
A primeira impressão da ideia é de alegria e de esperança. Lemos então Brasillach, cronista por excelência dos anos trinta, e não ficámos indiferentes à mensagem, mau grado as brumas e os ensinamentos dos mais velhos que dominavam o panorama. E sentimos o mesmo ânimo que impulsionara Brasillach, sentimo-lo a percorrer-nos as artérias, o mesmo orgulho a acicatar-nos a vontade, a mesma fé a dominar-nos o espírito — ao memoriar esse fascismo dos desfiles, das bandeiras, das catedrais de luz, dos heróis mortos em combate, o fascismo «imenso e rubro» de José António, de Corneliu Codreanu, o fascismo da Falange, do Alcazar, do Congresso de Nuremberga, da Legião do Arcanjo S. Miguel... O primeiro fascismo, o fascismo da nossa adolescência, que nos fez faltar às aulas, reconstruir o mundo em «reuniões secretas» e folhas copiografadas, o fascismo em nome do qual travámos escaramuças e conhecemos companheiros. Aprendemos aí o ethos da amizade, em que um camarada é um irmão de sangue porque pensa como nós, porque vive e luta ao nosso lado. Aprendemos a alegria e a esperança que não mais nos deixaram. E também a lutar com determinação, mas sem ódio, simplesmente...
Depois, julgo que crescemos depressa... Seria muito exigir romantismos duradouros aos que viviam no exílio, testemunhas de tantas cobardias e abdicações.
O tempo e os homens se encarregaram de nos trazer a justa medida entre ilusão e real que se chama lucidez. Mas antes disso, quantas vezes nos quedámos, como o cavaleiro andante de Antero, de espada quebrada e armadura rota, indecisos, quase vencidos, quase a ceder, quase a partir... E houve quem o fizesse por prudência, por desgosto, por cálculo. Alguns traíram, alguns traíram-nos e traíram a sua juventude...
Chega-nos, outra vez, a voz de Drieu: «É preciso ficar, a gritar a verdade até que vos estrangulem... É preciso não ir embora nunca...» É preciso ficar... Cerrámos os dentes, fincámos os pés e ficámos... Talvez porque para nós a própria batalha fosse já vitória, talvez porque, como dizia Degueldre, por esse tempo fuzilado, não importava perder ou ganhar, o essencial era batermo-nos. E, de novo, Drieu: «O Fascismo é a crispação do homem europeu em torno da ideia de virtude viril que sente ameaçada pelo curso inevitável das coisas para a paz definitiva...» Para nós, em certo momento, o Fascismo foi isso, uma crispação contra o inevitável, um combate em que não contabilizámos amigos e inimigos, perdas ou ganhos. Um combate em que nem sequer nos importou vencer, só ficar, até ao fim...
«Fascismo é uma concepção subjectiva da vida, uma moral, antes de mais uma estética...» As palavras de Turiais foram, nessa ocasião, tentadoras. Assim como Malraux viu na Revolução Marxista a terra prometida do heroísmo, para alguns de nós o Fascismo, foi isso e só isso, uma Pátria de guerreiros. Turiais morreu em 1944, no exército de Leclerc... Creio que é importante meditarmos nisto, pois também para nós, a certa altura, corremos o perigo de nos transformarmos em soldados sem bandeira, em mártires por engano...
Então, lemos e meditámos páginas sobre Coerência e Fidelidade. Nos exemplos, nas palavras e no sangue dos companheiros mortos, aprendemos a lição dos deveres amargos por obscuros, que o heroísmo pode ser uma conquista do quotidiano, que vencer era um imperativo e o primeiro. Compreendemos que nas mãos guardávamos um futuro, demasiado grande para se jogar de ânimo leve. E compreendemos, também, que a perdermos, nem sequer seríamos lembrados...
Compreendemos que o preço da Coerência seria, por enquanto, não o sangue, mas o ostracismo e o silêncio. E na sombra talhámos metódica, implacavelmente, os alicerces da Revolução. E este aceitar de um dever, de um trabalho obscuro, foi para nós medida da fidelidade...
Porque só se luta pelo que se ama, só se ama o que se respeita e só se respeita o que se conhece, impusemo-nos as disciplinas de estudo e da reflexão. Como inimigos do comum, sabíamos que tínhamos que ser os melhores, os mais esclarecidos...
Na herança do passado buscámos raízes e coordenadas... A sugestão podia vir de uma página das Sagas, da história de Eric ou Leif que navegaram para Ocidente, do rosto de um condottieri esculpido por Verrochio, das crónicas desses homens brancos que em Quinhentos talhavam Impérios... Mas havia sempre a força unificadora da mesma Raça e da mesma Cultura... E em homens distantes no tempo e no lugar, dos centuriões anónimos do limes aos pioneiros afrikanders, em Robert Clive, em Dupleix, em Albuquerque, em Mousinho, descobrimos idêntico sentir de Império...
Reencontramos a tradição do cristianismo viril das catedrais e da Contra-Reforma, a lição de Inácio de Loiola e de Teresa de Ávila, no nosso tempo Charles Péguy a ensinar que as cidades carnais são corpo real na cidade de Deus, por cidades carnais a morrer no Chemin des Dames, deixando-nos esta divisa: «Morrer jovem, numa grande batalha, eis a suprema felicidade...».
Nos escritos de Spengler, de Georges Sorel, em Mosca, em Pareto, num certo Valéry, no Jünger de entre duas guerras, colhemos diagnósticos do nosso tempo, aprendemos o papel dos homens de vontade, das ideias de grandeza e decadência no destino dos povos.
E não deixamos de incluir entre os mestres ao lado de um Giovanni Gentile, de um Ernst Krieck os nomes de Maurras, de Donoso Cortes, de Alfredo Pimenta.
Reaccionários? Somos reaccionários no sentido de Constantin Léontiev, que dizia não poder conceber que os poetas tivessem cantado, os mártires tivessem morrido, os cavaleiros lutado nos torneios para que o burguês se viesse divertir sobre as ruínas desse passado de grandeza. Como o monge de Optina, espírito profundamente religioso, revoltamo-nos contra a mediocridade do século, contra os literatos, os satisfeitos, os curiosos, que pelo ensino médio julgam tudo entender e resolver. Como combatemos esse socialismo («capitalismo das classes inferiores» lhe chamou Spengler), que nos diziam ser a chave do Paraíso... Somos, sim, pelo socialismo que não funciona «à base da inveja», que requer a dignificação popular, que é amor da justiça, defendemos essa atitude moral ditada pela vontade de integrar o povo na Nação, pois que é uma exigência ética, do mesmo sentido de harmonia que ordenou o nosso pensamento.
Deste modo e só deste, somos reaccionários... Como no ataque intransigente aos dogmas da sociedade técnica, ao individualismo igualitário, à democracia, ao enrichissez-vous, fomos os verdadeiros e únicos revolucionários...
E se em Guénon e Evola colhemos as coordenadas da revolta contra o mundo moderno, em Ezra Pound, em Tomazzo Fillipo Marinetti, em alguns de Orfeu, aplaudimos a autêntica modernidade, a que leva os estigmas do génio e da criação...
Nas páginas dos mais próximos, num Roger Nimier, num Jean René Huguenin (estou a lembrar-me de "Une Autre Jeunesse"), encontramos a mesma frescura, a mesma juventude, o mesmo desprezo pelo intelectualismo fácil, pela mediocridade dos homens e dos dias, a mesma atitude que nos seduziu na adolescência...
Como ao ler, agora «Ma peau au bout de mes idées» do capitão Phillipe Sergent, ainda mais certos ficámos de que nos contemporâneos há homens, de que vale a pena fazer tudo para ser digno de tais companheiros.
Nomes, destinos cruzados, onde aprendemos, meditamos, onde construímos, onde achamos motivos de renovação e vivificação da fé de adolescência...
Aqui chegados, cumpre dizer algo sobre o futuro. E de novo o autor de Socialismo Fascista, que nos guiou na retrospectiva, vem indicar-nos o caminho a seguir. Restaurar os valores de aristocracia e de autoridade, fazer a revolução a partir de uma minoria activa, disciplinada, unida por estreitos laços de fidelidade ideal e pessoal, informada no culto dos valores espirituais, de Deus, da Raça, do Império, animada por indefectível vontade do poder, disposta a ir até ao fim, até à vitória...
«Em tempo de paz a juventude recebe exemplos, em tempo de guerra dá-os» escreveu Bonnard. Quis Deus que vivêssemos estes anos tormentosos e difíceis, «anos decisivos» em que se joga o futuro do mundo e da civilização, este tempo de guerra impiedosa e total; é com alegria que nos submetemos às suas determinações e com fé que nos preparamos para cumprir a nossa missão, contentes por tudo ter sido assim...
Antes do termo, olho ainda os outros, os adversários, os críticos, os indiferentes, os que estão e vão ficar na terra de ninguém... Não posso deixar de sorrir ao teor dos seus argumentos, ao símile das águas do rio que passam e não voltam, refúgio e consolação com que escondem o rosto da verdade...
Noutros lugares, alguns hierarcas vêem-nos com suspeição, a pensar talvez utilizar-nos, abandonando-nos depois... Mas não se iludam: amamos demasiado a liberdade da nossa juventude, para sermos mercenários ou lacaios de alguém... E depois há o pequenino grão que pode fazer ruir todo o sistema... É que os que, sem medo às palavras e às consequências, aqui estamos, aqui militamos, neste Fascismo 67 — temos vinte anos. Portanto, o que nos importa que sejais contra nós, se os vossos filhos estão connosco?...
Jaime Nogueira Pinto
(In «Agora», n.º 329, 04.11.1967, pág. 13.)
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