quinta-feira, maio 26, 2005
DEMOCRACIA CRISTÃ
À medida que os diversos países iam sendo libertados para sua felicidade, para suprema ventura da Humanidade, para triunfo dos valores morais, para um maior culto da justiça, etc; à medida que os exércitos das Nações Unidas iam levando de vencida o Fascismo hediondo que, atrás de si, arrastava destruições de catedrais (como a de Colónia), mosteiros e abadias (como Montecassino), julgamentos de adversários vencidos (como em Nuremberga), e o fuzilamento e a prisão de intelectuais (como Brasillach, Georges Suarez, Maurras, Carrel); à medida que os abnegados Três Grandes consolidavam mais e mais a sua vitória, iam aparecendo nas nações que, jubilosamente, ressurgiam para uma nova vida, imensidades de partidos, todos evidentemente dispostos a erguer bem alto o estandarte da Liberdade e da Emancipação e a fazer triunfar a bandeira da Democracia.
Em breve, dentre o informe e desordenado caos, veio a destacar-se uma tendência hoje em dia eleitoralmente triunfante na França, na Bélgica, na Holanda, na Itália, na Áustria, na Hungria, na Baviera, e que tomou a designação geral de Democracia Cristã.
As razões do seu êxito, não são difíceis de apreender. Para os que militavam nas direitas por simples inércia, para os que temem a política de missão e detestam o viver perigosamente, a abnegação e o sacrifício, para os amigos da persuasão que, aristocraticamente, envolvem na mesma expressão de desdém o Fascismo e o Comunismo, para todos esses inimigos dos extremismos, a Democracia Cristã, partido do centro, é o refúgio ideal. Mesmo o seu anti-comunismo não chega a ser suficiente para lhe trazer incómodos (Graças a Deus! Senão, o que se poderia vir a perder).
Na França, realmente, o filósofo do Movimento Republicano Popular (católicos) o Sr. Jacques Maritain, ex-membro da "Action Française", inimigo do Estado Novo português - o que não é obstáculo a entrevistas elogiosas no órgão da União Nacional, onde um redactor daquele jornal se faz procurador dos admiradores e discípulos portugueses do inimigo do Governo por todos os motivos legítimo da sua Pátria (1) - o Sr. Jacques Maritain, é partidário da cooperação com os comunistas e a sua participação na obra comum. (2) E um outro militante, nome de grande relevo na literatura, perfilha, igualmente, essa tendência: é o Sr. Mauriac. Aliás, estas duas atitudes mostram até uma louvável coerência de ideias, pois, durante a guerra de Espanha, os católicos que mais decididamente se mostraram partidários da vitória soviética na Península foram, juntamente com Bernanos, os srs. Maritain e Mauriac.
O partido, mesmo, apesar de todas as lutas eleitorais, aceita formar governo de coligação em que ao lado de Bidault presidente, surge Thorez vice-presidente, Thorez traidor à França a soldo de Moscovo. Enternecedor espectáculo! O chefe da Resistência e um desertor! É que poderosas afinidades os unem - ainda está fresco o sangue dos que caíram pela França e pela Europa.
Mas dado que o Movimento Republicano Popular tem precursores e quadros um pouco extravagantes (3) precursores em que se conta Lamennais e quadros intelectuais de que fazem parte as redacções de periódicos como o «Sept» (4), «La Vie Intelectuelle», etc., podia dar-se a circunstância da sua atitude ser isolada de entre os movimentos cristãos-democratas contemporâneos.
Mas não, infelizmente não. Assim, na Itália, o vice-presidente do partido Attilio Piccioni disse em entrevista: «Quanto aos comunistas não somos em princípio pela contra colaboração. Só pomos duas condições: que os comunistas nos apresentem e a todo o povo italiano um programa definido e que possam ser considerados verdadeiramente um partido nacional» (5).
Como se vê, para a Democracia Cristã colaborar com o marxismo não é necessário muito: basta que haja um programa definido qualquer que ele seja e que Moscovo suspenda as relações com os seus partidários, embora o perigo internacionalista subsista, pelo menos ideologicamente. Até nisto se mantém fiel à herança dos velhos partidos conservadores em que a transigência com o inimigo era de bom tom. E não é só esta característica que mantém.
A Democracia Cristã acredita no sufrágio universal que Pio IX chamava de «mentira universal», acredita que os incapazes de governar têm competência para escolher os que hão-de governar; a Democracia Cristã acredita na separação dos poderes que coloca o Estado numa situação absurda tirando-lhe toda e qualquer unidade de acção, a ele que deve ser o centro dirigente da vida nacional; a Democracia Cristã é republicana, desejando, pois, que o poder dependa do arbítrio da multidão ignara; a Democracia Cristã defende a existência dos partidos políticos, factores de dissolução nacional, que transformam os países em autênticos campos de guerra civil, guerra civil de que só vêm a aproveitar os arrivistas, os videirinhos de toda a espécie.
A Democracia Cristã tenta encarnar no nosso século os princípios da Revolução satânica que, pela voz de alguns dos seus corifeus, já ousa afirmar ser de raiz católica, embora desviada e transformada, tenta encarnar os princípios da destruição e da morte.
Partido dos tímidos e dos resignados, ao serviço duma ideologia mortífera, envolvida em ténues véus de conservantismo e de moderação, é bem um resíduo vetusto do estúpido século destinado a desaparecer, quando renascerem «para ventura dos povos e tranquilidade do mundo» os princípios eternos da vitoriosa Contra-Revolução.
António José de Brito
Nota do Autor - Sempre que empregamos a expressão Democracia Cristã, não queremos de forma alguma referir-nos ao sentido que Leão XIII por exemplo lhe atribuía. Com efeito, o Pontífice ensinava que «seria injusto que o termo de Democracia Cristã fosse desvirtuado para um sentido político... só se deve empregá-lo tirando-lhe todo o sentido político e não lhe ligando outra significação a não ser uma acção beneficiente e cristã para com o povo» (Encíclica "Graves de communi"). Ora nós, evidentemente, queremos apenas fazer menção aos partidos políticos que tomam tal designação.
Notas:
1 - Cfr. Diário da Manhã de 30 de Maio de 1946, número 5408-Ano XVI.
2 - Cfr. Christianisme et Démocratie, pág. 95.
3 - Segundo nos informou solicitamente o jornal que foi do Cons. Fernando de Sousa, etc., de 18 de Dezembro de 1944, sob o título «Em França - O Movimento Republicano Popular».
4 - (durante a guerra de Espanha, defensor dos rojos)
5 - Cfr. Diário da Manhã de 26 de Maio de 1946, n.º 5404-Ano XV.
(In «A Nação» n.º 24 de 03.08.1946)
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Em breve, dentre o informe e desordenado caos, veio a destacar-se uma tendência hoje em dia eleitoralmente triunfante na França, na Bélgica, na Holanda, na Itália, na Áustria, na Hungria, na Baviera, e que tomou a designação geral de Democracia Cristã.
As razões do seu êxito, não são difíceis de apreender. Para os que militavam nas direitas por simples inércia, para os que temem a política de missão e detestam o viver perigosamente, a abnegação e o sacrifício, para os amigos da persuasão que, aristocraticamente, envolvem na mesma expressão de desdém o Fascismo e o Comunismo, para todos esses inimigos dos extremismos, a Democracia Cristã, partido do centro, é o refúgio ideal. Mesmo o seu anti-comunismo não chega a ser suficiente para lhe trazer incómodos (Graças a Deus! Senão, o que se poderia vir a perder).
Na França, realmente, o filósofo do Movimento Republicano Popular (católicos) o Sr. Jacques Maritain, ex-membro da "Action Française", inimigo do Estado Novo português - o que não é obstáculo a entrevistas elogiosas no órgão da União Nacional, onde um redactor daquele jornal se faz procurador dos admiradores e discípulos portugueses do inimigo do Governo por todos os motivos legítimo da sua Pátria (1) - o Sr. Jacques Maritain, é partidário da cooperação com os comunistas e a sua participação na obra comum. (2) E um outro militante, nome de grande relevo na literatura, perfilha, igualmente, essa tendência: é o Sr. Mauriac. Aliás, estas duas atitudes mostram até uma louvável coerência de ideias, pois, durante a guerra de Espanha, os católicos que mais decididamente se mostraram partidários da vitória soviética na Península foram, juntamente com Bernanos, os srs. Maritain e Mauriac.
O partido, mesmo, apesar de todas as lutas eleitorais, aceita formar governo de coligação em que ao lado de Bidault presidente, surge Thorez vice-presidente, Thorez traidor à França a soldo de Moscovo. Enternecedor espectáculo! O chefe da Resistência e um desertor! É que poderosas afinidades os unem - ainda está fresco o sangue dos que caíram pela França e pela Europa.
Mas dado que o Movimento Republicano Popular tem precursores e quadros um pouco extravagantes (3) precursores em que se conta Lamennais e quadros intelectuais de que fazem parte as redacções de periódicos como o «Sept» (4), «La Vie Intelectuelle», etc., podia dar-se a circunstância da sua atitude ser isolada de entre os movimentos cristãos-democratas contemporâneos.
Mas não, infelizmente não. Assim, na Itália, o vice-presidente do partido Attilio Piccioni disse em entrevista: «Quanto aos comunistas não somos em princípio pela contra colaboração. Só pomos duas condições: que os comunistas nos apresentem e a todo o povo italiano um programa definido e que possam ser considerados verdadeiramente um partido nacional» (5).
Como se vê, para a Democracia Cristã colaborar com o marxismo não é necessário muito: basta que haja um programa definido qualquer que ele seja e que Moscovo suspenda as relações com os seus partidários, embora o perigo internacionalista subsista, pelo menos ideologicamente. Até nisto se mantém fiel à herança dos velhos partidos conservadores em que a transigência com o inimigo era de bom tom. E não é só esta característica que mantém.
A Democracia Cristã acredita no sufrágio universal que Pio IX chamava de «mentira universal», acredita que os incapazes de governar têm competência para escolher os que hão-de governar; a Democracia Cristã acredita na separação dos poderes que coloca o Estado numa situação absurda tirando-lhe toda e qualquer unidade de acção, a ele que deve ser o centro dirigente da vida nacional; a Democracia Cristã é republicana, desejando, pois, que o poder dependa do arbítrio da multidão ignara; a Democracia Cristã defende a existência dos partidos políticos, factores de dissolução nacional, que transformam os países em autênticos campos de guerra civil, guerra civil de que só vêm a aproveitar os arrivistas, os videirinhos de toda a espécie.
A Democracia Cristã tenta encarnar no nosso século os princípios da Revolução satânica que, pela voz de alguns dos seus corifeus, já ousa afirmar ser de raiz católica, embora desviada e transformada, tenta encarnar os princípios da destruição e da morte.
Partido dos tímidos e dos resignados, ao serviço duma ideologia mortífera, envolvida em ténues véus de conservantismo e de moderação, é bem um resíduo vetusto do estúpido século destinado a desaparecer, quando renascerem «para ventura dos povos e tranquilidade do mundo» os princípios eternos da vitoriosa Contra-Revolução.
António José de Brito
Nota do Autor - Sempre que empregamos a expressão Democracia Cristã, não queremos de forma alguma referir-nos ao sentido que Leão XIII por exemplo lhe atribuía. Com efeito, o Pontífice ensinava que «seria injusto que o termo de Democracia Cristã fosse desvirtuado para um sentido político... só se deve empregá-lo tirando-lhe todo o sentido político e não lhe ligando outra significação a não ser uma acção beneficiente e cristã para com o povo» (Encíclica "Graves de communi"). Ora nós, evidentemente, queremos apenas fazer menção aos partidos políticos que tomam tal designação.
Notas:
1 - Cfr. Diário da Manhã de 30 de Maio de 1946, número 5408-Ano XVI.
2 - Cfr. Christianisme et Démocratie, pág. 95.
3 - Segundo nos informou solicitamente o jornal que foi do Cons. Fernando de Sousa, etc., de 18 de Dezembro de 1944, sob o título «Em França - O Movimento Republicano Popular».
4 - (durante a guerra de Espanha, defensor dos rojos)
5 - Cfr. Diário da Manhã de 26 de Maio de 1946, n.º 5404-Ano XV.
(In «A Nação» n.º 24 de 03.08.1946)
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