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domingo, junho 26, 2005

«A FILOSOFIA TOMISTA EM PORTUGAL» DE PINHARANDA GOMES 

Prosseguindo o seu meritório esforço de revelar aos portugueses o pensamento português, Pinharanda Gomes publicou mais um volume intitulado "A Filosofia Tomista em Portugal". O núcleo básico do trabalho é constituído pela tradução do muito falado mas pouco lido artigo de Ferreira Deusdado, publicado em 1898, com esse mesmo título, na "Revue Neo-Scolastique de Philosophie" de Lovaina. Pinharanda Gomes antecedeu-o de um interessante estudo crítico acerca das ideias de Deusdado: e como este, obviamente, se deteve em 1898, Pinharanda Gomes propôs-se prosseguir o labor do mestre insigne de "Criminalidade e Educação", traçando o panorama do movimento tomista no nosso país até 1973 (e arrancando de um pouco antes de 1898, isto é, de 1879, data da «Aeterni Patris» de Leão XIII).
Embora o texto do livro, na maior parte, seja de sua autoria, Pinharanda Gomes, num gesto de modéstia só digno de louvor, não fez colocar o seu nome na portada da obra, acaso porque a sua inspiração principal a bebeu em Ferreira Deusdado, que assim homenageou discretamente.
Claro que, do ponto de vista da pura erudição, não estamos, talvez, perante nada de totalmente inatacável. Mas como não somos profissionalmente eruditos, não possuímos autoridade para, nesse plano, nos pronunciarmos. Aliás, cremos que Pinharanda Gomes, mais do que apresentar algo de acabado e definitivo, pretendeu apresentar um esquema e fornecer elementos valiosos para uma futura história, minuciosa e integral, do tomismo nacional, no período compreendido entre 1879 e 1973.
De qualquer forma, tal qual surge, "A Filosofia Tomista em Portugal" representa, já, muitas e muitas horas de reflexão, investigação e pesquisas exaustivas. Não quer isto significar que, ali e além, não lhe encontremos defeitos. Mas o que há que não tenha defeitos? A perfeição só existe em Deus.
Determinados pontos suscitam, de facto, a nossa perplexidade. Por exemplo: Pinharanda Gomes atribui ao prof. Cabral de Moncada uma «tendência tomista». Este último autodenominava-se um neo-kantiano influenciado pela Fenomenologia (1). Desconfiando às vezes das filiações que os pensadores atribuem a si próprios — quanto a nós o prof. Cabral de Moncada foi, antes, um fenomenólogo influenciado pelo neo-kantismo — o que não vemos maneira é de o considerarmos tomista. Admirava S. Tomás, respeitava imenso o Tomismo? Sem dúvida. Daí a ter uma tendência tomista vai, no entanto, uma certa distância.
Por outro lado, supomos que Maria Manuela Saraiva, mais do que pelo existencialismo, foi marcada pela influência da Fenomenologia, ainda que, entre uma e outra corrente, nem sempre se faça uma distinção clara (Spiegelberg inclui Heidegger, Sartre, Merleau-Ponty, etc., em «The Phenomenological Movement»).
Não compreendemos, também, porque é que Pinharanda Gomes cita na bibliografia certos autores brasileiros deixando outros de fora. Pois Leonel Franca, v.g., não mereceria uma referência? E a propósito de bibliografia? O critério seguido por Pinharanda Gomes nem sempre o aplaudimos. Se é nela mencionado um ensaio de Cruz Pontes — «Latim e Filosofia» — que só indirectamente se relaciona com Tomismo, porque não referir as suas belas teses sobre Pedro Hispano?
E anote-se que a «Teoria do Conhecimento» de Diamantino Martins, não aparece ao lado de outros livros do mesmo pensador, decerto por lapso.
Mais um ou outro ponto mereceria comentário. Mas, tal como os apontados, são meros pormenores. E em meros pormenores não é de insistir.
Estamos, seja como for, perante um livro digno de todo o respeito e apreço, muito acima das vulgaridades marxista e marxizantes que hoje desabam sobre a nossa terra (e de que as actas de participação de compatriotas nossos — chamemos-lhes — no Congresso Hegel, de Lisboa, são, salvo excepções, deplorável testemunho).
Pinharanda Gomes, fiel a si próprio, não alinha no rebanho dos tristes devotos de S. Marx cá do rectângulo.
Ainda bem! E honra lhe seja por isso.
António José de Brito
Nota:
1 - Cfr. Luís Cabral de Moncada, «Para a História da Filosofia em Portugal no Século XX - Apontamento», Coimbra, 1960, pp.9-10.
(In «A Rua», n.º 135, pág. 18, 11.01.1979)

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