<$BlogRSDURL$>

sexta-feira, junho 24, 2005

UNIDADE E DIVERSIDADE 

Afastando do espírito os abraços sacrílegos entre o ditador de Angola, que preferiu à qualidade de português a de súbdito russo-cubano, e um chefe de Estado que, por ter obtido uma maioria de papelinhos numa urna, julga representar a Pátria (como se a Pátria se pudesse reduzir a uma soma de votos em vasos eleitorais); não dedicando sequer um instante de reflexão séria à ridícula crise entre o P.S. e os seus lacaios do C.D.S., procuremos meditar em torno de temas que não nos façam ou corar de vergonha ou sorrir de comiseração.
Num volume, aliás, cheio de interesse — Vu de Droite — Alain de Benoist procura definir o pensamento de Direita pelo repúdio do igualitarismo nivelador e pela apologia da diversidade.
Longe de nós a pretensão de caracterizar, aqui, exaustivamente, o pensamento da Direita. O que, todavia, cremos poder levar a cabo, é talvez afastar as caracterizações que se revelam insuficientes e inadequadas. E supomos que as notas que Alain de Benoist traz à colação são precisamente inaplicáveis às doutrinas imemorialmente consideradas de Direita.
Estas repelem, sem dúvida, o igualitarismo. Mas há mil maneiras de o fazer e o que interessa, de um ponto de vista analítico, é apontar de que forma e porquê é o igualitarismo repelido. Ora, pela nossa parte, não pensamos que a Direita o repudie por um amor desmedido e entusiasta da diversidade. O culto da diversidade significa o incremento de todos os antagonismos e incompatibilidades. A sua tendência limite está na anarquia, na guerra de todos contra todos de que tanto falava e preocupava Hobbes.
A diversidade, tomada como valor, aplica-se aos povos e aos indivíduos. Estes serão tanto mais diversos quanto mais se opuserem entre si. Oposição, porém, é sinónimo de mútua incompatibilidade, e mútua incompatibilidade de exclusão recíproca. Logo, o culto da diversidade só poderá encontrar satisfação na eliminação do diverso, pois que é isso que a exclusão recíproca de opostos exige.
Simplesmente com a eliminação do diverso ou, pelo menos, a redução a nada das diferenças mais acentuadas, está-se a destruir o culto da diversidade. Se este implica ou conduz, logicamente, àquela eliminação, nega-se a si próprio, é algo de inconcebível.
É incontestável que Alain de Benoist fala em estabelecer uma hierarquia com base na apologia do diverso. Trata-se, contudo, de uma mera declaração de intenções, muito de aplaudir, por certo, mas sem qualquer viabilidade num plano de coerência. Para haver hierarquia é preciso o diverso, por isso nem se discute. Só que o diverso unicamente não basta, antes tem de ser submetido a um padrão unitário, em função do qual possa ser valorado, disciplinado e situado.
De resto, e em rigor, a diversidade não é uma noção subsistente por si, como não o é, também, a de pura unidade. Os elementos diversos apenas são diversos se puderem ser comparados, isto é, se houver relações que os liguem entre si e, portanto, os unifiquem. Por seu turno, a unidade não é uma mónada isolada e exclusivamente existe se abranger e incluir em si tudo o que for diverso (não acontecendo isto a unidade é, ela, um membro de uma pluralidade).
A ideia subsistente em si e por si é a de unidade na diversidade e de diversidade na unidade, ideia que, repelindo o absurdo igualitarismo (absurdo, visto ter de considerar os diversos idênticos, enquanto iguais, e não idênticos, enquanto diversos), não cai no excesso contrário, que é o abandono a toda a força centrífuga e dissociadora.
Essa unidade do diverso, que mantém a pluralidade dentro dos limites razoáveis e a faz dar vida a uma totalidade sem produzir a dissolução anárquica, é o que corresponde ao tradicional conceito de ordem, daquela ordem a que aludia Maurras quando proclamava a Igreja católica «L`Église de l`Ordre» e que não se confunde com a simples tranquilidade nas ruas. Semelhante conceito representa património clássico do que habitualmente se designa pelo termo de Direita. Não possui, com certeza, a marca de uma novidade acabada de chegar de Paris, mas julgamos preferível mantermo-nos aferrados a ele do que abandonarmo-nos, por amor de uma duvidosa originalidade e pelo gosto mórbido da inovação, a noções assaz confusas e de consequências lastimáveis.
António José de Brito
(In «A Rua», n.º 111, pág. 6, 27.07.1978)

0 Comentários
Comments: Enviar um comentário
Divulgue o seu blog! Blog search directory

This page is powered by Blogger. Isn't yours?