<$BlogRSDURL$>

quinta-feira, julho 28, 2005

O jogo da Itália na ascensão do fascismo 

Cremos já ter lido algures que a diferença fundamental entre as direitas e as esquerdas é que as primeiras dizem a verdade, rude que ela seja, nas promessas e nas ameaças; ao passo que as esquerdas se agitam sempre enganadoras em sonhos mais ou menos perturbantes, mas sempre falazes.
Quando Churchill prometeu aos ingleses sangue, suor e lágrimas, era um homem das direitas.
Quando Hitler ameaçou, antes de chegar ao Poder, "cabeças rolarão na serradura!" era um homem das direitas.
Quando Salazar prometeu uma "política de sacrifícios" procedia como homem das direitas.
As esquerdas, por seu lado, prometem sempre a liberdade, a paz, a emancipação, a igualdade, a instrução, o amor fraternal, a tolerância, a fartura, a assistência completa, a vida barata. E, como é sabido, essas promessas ficam sempre a alimentar as amarguras da desilusão.
Mussolini terá pois de ser considerado das direitas, na medida em que afirmava em 1920:
"Ao contrário dos socialistas, nós não enganamos as multidões. Nós falamos da Itália e do seu futuro. Não renunciamos às nossas afirmações de carácter imperialista. Muitos acólitos podem prejudicar um partido de disputantes, não um partido de soldados como o nosso. A nossa disciplina política é ao mesmo tempo disciplina militar. Os nossos recrutas desejam combater e não discutir. Mesmo aos sindicatos nós nunca prometemos demasiada felicidade. Saberemos defender as conquistas operárias, mas se for preciso saberemos também impor sacrifícios."
Isto refere-se, porém, às atitudes anteriores ao Poder. E depois do Poder?
Em 31 de Outubro de 1922, depois de ter dado ordem de desmobilização às suas milícias, mais de cinquenta mil fascistas desfilaram em Roma perante o Altar da Pátria, em homenagem ao Soldado Desconhecido, e perante o Quirinal, onde o Rei Vítor Manuel assistiu, durante cinco horas ao marchar dos camisas negras entre os quais sobressaíam algumas camisas vermelhas garibaldinas, bandeiras ondeando ao vento, cantos entusiásticos de juventude, álálá vibrante de esperança e de força.
Mussolini estava presidente de um Ministério para o qual chamou ministros de outros partidos: um liberal, Gentile; um nacionalista, Federzoni; um radical, Cesaró; um popular, Tangorra. Não representavam estes os partidos a que pertenciam: eram antes personalidades que se juntavam num gabinete de intenção nacional, independentemente dos partidos. É certo que estes não tardaram a perder a sua importância. Bastou para isso que o Governo passasse a depender, não da Câmara dos Deputados, mas somente do Rei e do Partido.
Mais do que os artifícios das combinações políticas, porém, valia o espírito novo que varria a Itália e não deixava de surpreender a Europa e as Américas, desfeitas pelo remoer corrosivo das partidocracias. Em breve a Itália, disciplinada e progressiva, com o orçamento equilibrado, a economia em crescimento, a instrução difundida, a previdência cuidada, começava a ser respeitada e até apontada como exemplo pelos países menos suspeitos de antidemocráticos. Já vimos como foi apreciado em Portugal pelo democrata Cunha Leal. Todavia, na América, ainda em 1937 o Presidente Roosevelt dizia a um filho do Duce:
"A Itália é o único país com o qual, sem trair as suas tradições democráticas, os Estados Unidos podem manter as melhores relações. Isto pela sua história, pela sua posição geográfica e pela sede da Igreja Católica, que está no seu território. Mussolini é o único a poder manter o equilíbrio europeu. A Alemanha e a Rússia estão nos pólos extremos da América e nada pode fazer-se com esses dois países".
E depois destas palavras, o Presidente propunha um encontro entre os dois, em águas neutras, por exemplo em navio no alto mar.
Isto não significa que entre 1922 e o ano do convite de Roosevelt a vida tenha sido para o fascismo em mar de rosas. Pelo contrário, foram anos árduos de trabalho a grossas contrariedades.
Já que falamos em Duce, devemos esclarecer que o nome não é de origem fascista. Foi-lhe dado em 1913 pelos socialistas, durante um banquete em que se festejava a sua saída da prisão onde sofrera pena por actividades revolucionárias. Um veterano do partido, Vernocchi, declarou ali:
- A partir de hoje, Benito, tu não és só representante dos socialistas romanhóis, tu és o Duce de todos os socialistas revolucionários da Itália!
No Poder, Mussolini procurou fazer a conciliação nacional, acolhendo gente de todos os sectores políticos, à excepção do socialista. A essa boa vontade correspondeu das forças inimigas, como é habitual, claramente ou não, uma luta constante. Basta dizer isto: apesar da oposição que lhe fez a Maçonaria, só em 1925 considerou aquela associação ilegal, sabendo embora que tanto o Rei como o general Badoglio lhe eram afectos. Quase vinte anos depois, quando o Grande Conselho Fascista depôs Mussolini, catorze dos dezanove conselheiros eram maçons.
Além disso, como governar é descontentar, e como o Poder corrói - e daí a necessidade política das mutações - o governo de Mussolini não escapou a estas fatalidades governativas.
Quando a crise surgiu em 1924, o Duce reagiu com a ofensiva contra o parlamentarismo e a dialéctica dos partidos. Mais do que por princípio, por necessidade de acção.
A partir de 1925 foi o período mais intenso de reorganização política, económica e social. A política do trabalho, em especial viria a ser objecto de interesse e de estudo em todo o Mundo.
Em 1929, pelo Pacto de Latrão, põe-se termo à questão romana, que trazia desavindos a Itália e o Papado.
Passemos por cima de toda a obra de remoçamento moral e de reconstrução material do país. Deixemos as obras de Macarese e a secagem dos mortíferos pântanos Pontinos, no local dos quais se ergueram cidades modernas. Atenhamo-nos aos factos de espacial relevância externa.
A pujança do país leva os italianos a alastrarem pela Somália, pela Eritreia, pela Líbia, empreendendo ali obras colossais. Em Maio de 1936, após sete meses de uma campanha militar modelarmente organizada, a Etiópia era incorporada no império italiano. Mais um passo no caminho que já o carbonário Mazzini, em 1870, desejara à
Itália: o de charneira entre o Ocidente e o Oriente. E assim recebeu a Sociedade das Nações uma das suas maiores derrotas.
Já por essa época a Alemanha pré e nacional-socialista ia conseguindo, perante a estupidez das democracias europeias, a conquista do que pretendia, a principiar pela anulação das reparações de guerra e pelo rearmamento. Em 1934 procura forçar a Áustria ao Anschluss.
A 25 de Julho, um grupo de nazis assassina o chanceler austríaco, o católico Dolfuss. Substitui-o Schuschnigg. 0 Ocidente alarma-se. Berlim irá atacar?
Mussolini manda avançar duas divisões para o Brenner, a fim de defenderem a Europa da ofensiva hitleriana.
Contudo, as democracias ocidentais continuavam cegas. Insistiam nos erros de sempre. Na guerra civil de Espanha não entenderam o que estava efectivamente em jogo na Península Ibérica. Não reagiram à ocupação da Renânia, nem à anexação da Boémia e da Morávia, nem à tutela da Eslováquia. No encontro de Munique, em 1938, Mussolini alinhava com o parceiro mais jovem, mais decidido, mais eficiente: o alemão.
O encontro é já da França e da Inglaterra com o Eixo Berlim-Roma.
A entrada da Itália na guerra ao lado da Alemanha foi uma consequência da passividade obtusa das democracias ocidentais, quando deixaram as tropas italianas, em 1934, sozinhas, nos desfiladeiros do Brenner.
Esse erro custaria depois milhões de mortos.
BARRADAS DE OLIVEIRA
(A Rua, n.º 110, 20 de Julho de 1978)

0 Comentários
Comments: Enviar um comentário
Divulgue o seu blog! Blog search directory

This page is powered by Blogger. Isn't yours?