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sábado, agosto 27, 2005

NÓS OS VENCIDOS 

No meio da desorientação que convulsiona o mundo, temos de nos manter lúcidos e firmes, combativos e cheios de fé. De vez em quando, o desânimo ou o cepticismo assaltam-nos, ao vermos que tantos esforços ficam incompreendidos e gorados, ao sentirmos que a nossa actividade é repelida ou aperreada, até por responsáveis e por gentes de uma coisa a que chamam direitas, ao verificarmos o esmagador potencial dos inimigos, desde o domínio político e económico, até nos meios de propaganda — e tudo isto no nosso país e pelo globo além.
No entanto, a nossa fé e a nossa vontade, o imperativo do dever, a fidelidade indomável, a consciência da justiça, o amor da verdade, impelem-nos a continuar, devem ser as bases e o propulsor da esperança, uma ardorosa alegria juvenil.
Não podemos desistir nem trair. Não podemos acomodar-nos nem degenerar. Não podemos submeter-nos nem envenenar-nos bebendo enfeitiçadas ideologias adversárias.
A primeira condição de triunfo, é o exame das nossas posições, inventariando e revivificando a nossa doutrina, definindo-lhe as suas formulações, reerguendo-a como bandeira orgulhosa e como arma eficaz. Apanhados no torvelinho destes endoidados tempos, quase ficamos, às vezes, entontecidos ou anestesiados, chegamos a estar perplexos ou iludidos, sofremos um pouco do ópio e do veneno de propagandas insistentes. A cura reside num apelo à consciencialização, e num relembrar e aprofundar das nossas ideias, e no exercício, em comum, do nosso combate.
A realidade é que fomos vencidos, não nos iludamos. Apesar disso, nem estamos convencidos nem desistentes. A nossa hora há-de chegar. E a hora de hoje é a de resistência, de recuperação e procura de desforra.
Fomos vencidos. Tripudiam, por toda a parte, a democracia e o comunismo, os nossos inimigos de ontem e de sempre, mais ou menos descobertos, mais ou menos disfarçados, mais ou menos virulentos, mais ou menos manhosos ou tirânicos, dulcorosos ou arrogantes. Não nos esqueçamos. Fomos vencidos.
A doutrina é a mesma, porém. A verdade é a mesma, sem jaça. Tal o seu alcance luminoso, acutilante, tal a comunicativa expressividade da sua língua de fogo, tal o vigor do seu braço, tal a reserva alimentícia do seu campo, que todos os dias, a todo o momento, por todas as formas, os inimigos se empenham em desfigurá-la. Eles dizem que é uma ultrapassada mentira. Eles dizem que está morta e abandonada, que só a violência a manteve, que os povos não a querem mais. Eles dizem que os seus defensores e porta-estandartes são fantasmas, são defuntos odiados. Mas esses dizedores não descansam e, com fúria e constância alarmada, insultam os fantasmas, caluniam os vencidos, obrigam os seus defensores a calarem-se, montam gigantescas máquinas para destruir a ansiedade que, nas gentes, sobe a procurar, neste abismo nocturno, a perdida luz.
Fomos vencidos. Nenhuma das grandes potências de hoje incarna a justiça e defende a doutrina sã. Nenhum grupo de estados é, para nós, o bloco condutor. Os partidos influentes, as ideologias dominantes limitam-se a paliativos ou avançam à propagação do erro.
A nossa ideia foi vencida. Na actividade que tenhamos de desenvolver, como indivíduos, grupo ou movimento, procuraremos alianças, mas condicionais, daremos apoios mas momentâneos e em certos casos ou circunstâncias. Nunca nos esqueçamos, porém, de fazer reservas e apontar discordâncias, de denunciar os males e distinguir os campos, de instaurar a doutrina certa e pura.
Vencidos nos encontramos, oprimidos entre o capitalismo e o comunismo, entre a civilização tecnicista e a revolta dos primitivos ou atrasados, entre os imperialismos económicos e a anarquia dos descolonizados, entre o individualismo plutocrático e a rasoira igualitária-confusionista-escravizante do marxismo-leninismo. De um lado, a mística anárquica, rebanhista, multitudinária, a devorância selvaticamente tirânica da Rússia soviética; ou o requinte cerebralmente cruel, a xenofobia, o neofitismo marxista, o faminto formigueiro da China Vermelha. Do outro lado, a trepidância incultural, o pragmatismo estreito, a grosseria recém-chegada, a soberba tecnicista dos Americanos. Ao lado de uns e ao lado de outros, marionetados por uns ou outros, na ilusão de que se furtam a uns e outros em cujas malhas caem, os pobres-diabos, os atrasados, os primitivos, desde a África à Ásia, e os espertinhos que desembocam em serventuários, ao jeito de vaidosos degaullismos.
Apesar da opressão e das limitações onde nos encontramos, nós, os vencidos, podemos, ainda, achar opções construtivas. Dentre os males, escolher o menor, se outra saída não existe, é, de algum modo, jogar, para ganhar oportunidades e para obter adversário mais fraco. Dentre os maus escolher o que mais importantes virtudes conserva e mais altos valores defende, é, pelo menos, preservar uma reserva de energias promissoras. Que estas opções não nos levem, porém, a uma adesão total, a uma confusão extensiva, a um silêncio ou desistências quanto à verdade íntegra e perfeita.
Nesta visão atenta e vigilante, conduzida pela ortodoxia, várias decisões nos compete tomar.
Assim, embora detestemos, nos Americanos, o estilo de vida, a mentalidade, os interesses exploradores, a estrutura plutocrática, o sistema em democracia, embora precisemos de condenar tudo isso, constantemente, de cada vez mais o denunciar, devemos apoiar a sua actividade obstrutora do comunismo (especialmente daquelas entidades e organizações que extremamente o fazem), devemos aprovar a sua luta no Vietname e a decisiva violência desse esforço guerreiro.
Assim, embora odiemos o capitalismo plutocrático, a finança internacional e apátrida, o egoísmo de tantos ricos, preferimos que eles vençam, num primeiro tempo, a entregar-nos à tirania da subversão, da inveja, do materialismo (teórico e prático), do individualismo solto ou desfeito em número escravo. Até porque a vitória comunista seria muito mais actuante e absorvedora, muito mais rígida, dedicada e eficiente na sua conservação, muito menos estúpida ou ingénua nos processos, muito menos sabotável e dividida.
Assim, apoiarmos, onde os encontrarmos, a hierarquia e a harmonia, o espírito de luta e de aperfeiçoamento, a ultrapassagem do egoísmo e do particularismo fechado, o amor da comunidade e a dedicação do Estado, o culto da fidelidade, da disciplina, da honra e da glória militar. Rendamos preito aos heróis. Elogiamos o patriotismo, o nacionalismo, as diferentes concreções, forjadas, conjuntamente, pela geografia, pelo sangue, pela história, pelo espírito, enfim. Com isto, é a vocação da unidade e da universalidade que defendemos.
Apoiamos a Europa, isto é, em primeiro lugar, o espírito europeu, porque, nele e por enquanto e para já, a humanidade encontrou a sua realização mais alta, desde há milénios, e será esse espírito o inspirador e conformador dos povos do mundo, dentro da sua maneira própria, será uma irrecusável missão especificamente humana. Apoiamos, outrossim, a Europa como unidade que deve constituir-se, Império na organização geral dos Impérios, para bem comum universal.
Apoiamos a raça branca, espalhada pelo mundo e auxiliando-o, porque é ela, por agora, a melhor portadora desse espírito de Europa. E não quer isto significar desprezo ou exploração das outras raças, mas sim ajuda, ensino, condução e libertação materialista de raça. Acreditamos, perfeitamente, que um não-branco seja espiritualmente europeu. É, assim, ainda, que nos batemos, em todos os campos possíveis, a favor de uma justiça social que dê a cada homem uma valorização plena das suas várias esferas e o coloque em funcionário e expansão, na estrutura una da comunidade, na realização ascendente dos valores.
A hora de hoje é confusionista e adversa. Reinam os miasmas e as várias formas de opressão. Nós somos um reduto de fiéis, uma simples minoria contra a avalanche dos bárbaros e dos guzanos, hábeis, diabólicos, aliciadores. Mas quando a dissolução e o paganismo dominavam o Império romano (o mundo de então), a minoria cristã soube resistir e criar prosélitos e expandir-se; quando a heresia dos arianos tomou conta dos povos europeus, a minoria ortodoxamente católica resistiu e jugulou-a; quando a Península caiu, de lés a lés, nas mãos dos mouros, a minoria cristã, confinada a um migalho das Astúrias, resistiu e desencadeou dali a Reconquista.
Na História, nenhum estádio é definitivo, nenhuma provação é inultrapassável. Os ventos da História são pretensiosa invenção e grosseiro determinismo de quem nos quer desarmar. «O mundo só tem o sentido que nós lhe dermos», proclamou Schiller.
Lúcidos, fiéis, ardorosos, combativos — acabaremos por vencer.
Goulart Nogueira
(In Agora, n.º 321, págs. 11/12, 09.09.1967)

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