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sexta-feira, novembro 04, 2005

A DEMOCRACIA 

Leio no Temps, o grande orgão republicano e liberal da França, estas palavras que traduzo para mais facilmente serem assimiladas por quem de direito — o leitor da rua:
Separa-nos perto de ano e meio da consulta normal do sufrágio universal. A campanha eleitoral de 1940 virá pois interromper o esforço governamental e parlamentar para a restauração e mesmo a reconstituição da nação... Uma campanha eleitoral começa dez ou doze meses antes das eleições; e o menos que se pode dizer é que se estabelece assim uma atmosfera pouco favorável ao exame dos grandes problemas cuja solução pode ter influência no futuro da França.
Assim falou o velho Padre-Mestre do Liberalismo e do Republicanismo da França. E falou luminosamente, com acerto indiscutível.
Não se pode traçar em tão poucas palavras, tão formal e transparente condenação do regime electivo e do sistema republicano.
De facto, o Sufrágio universal está na base, na essência, na alma desse regime e deste sistema.
Ora se a consulta do Sufrágio universal implica, na confissão autorizada do Temps, a interrupção do esforço governativo e parlamentar para a restauração e mesmo a reconstituição da França; se da campanha eleitoral inerente a essa consulta, o menos que se pode dizer é que ela estabelece atmosfera pouco favorável ao exame dos grandes problemas nacionais, — ou a lógica é uma batata, ou o interesse da Nação impõe que não se consulte o Sufrágio universal nem se entre na tal campanha eleitoral de dez ou doze meses.
Mas sem a campanha eleitoral, a consulta do Sufrágio universal é um absurdo ou uma mistificação confessada. E sem Sufrágio, não há República, não há Democracia, não há Povo soberano.
Por outro lado, se a campanha eleitoral impede o exame justo dos grandes problemas nacionais; se a consulta do Sufrágio universal interrompe o esforço dos Poderes públicos para a restauração da França, logicamente, imperativamente se conclui que a República que não pode ser sem aquela campanha e sem esta consulta, é contrária, por definição ao Interesse nacional. Eu já o sabia. Já estava infelizmente, farto de o saber: mas magnífico foi que o dissesse o grande jornal republicano da França.
Tudo isto analisado e filtrado leva a uma síntese que se não pode ocultar: Viva o Rei, para que a Nação possa viver!
O Sufrágio universal, ou, por outras palavras, o regime electivo é o regime da guerra civil permanente.
Mais acesa nuns países, mais branda, noutros; com manifestações mais espaçadas, além — a guerra civil é, em toda a parte, a característica diferencial do regime electivo.
Onde há opiniões, há discórdias; onde há discórdias, há separação, há luta — há paixões, há invejas, há intrigas, há corrupção de almas, há guerra civil.
Não é nos vários processos do Sufrágio universal que está o mal. Esses processos têm defensores e adversários: todos se equivalem. Lista única, lista uninominal, lista plurinominal; círculo único, círculos pequenos, círculos grandes — tudo isso tem os seus prós e os seus contras. O que não tem prós e só tem contras — é o regime do Sufrágio universal, o regime electivo. É no regime que está o mal, não é nas suas modalidades.
Ninguém perguntou ao homem se queria que a cabeça governasse o corpo; ninguém perguntou às criaturas se queriam que Deus as governasse; ninguém pergunta aos navios se querem que o leme os conduza; ninguém pergunta aos animais se querem que o instinto os guie.
Porque se há-de perguntar aos povos, autênticas abstracções ou indiscutíveis artifícios, se querem que os governe este ou aqueles, isto ou aquilo?
Como o homem tem a cabeça que não depende da sua opinião; como as criaturas têm Deus que não depende dos seus votos; como o navio tem o leme que não depende da sua vontade; como o animal tem o instinto que não depende dele próprio — os povos têm o seu chefe natural, o que os criou, o que lhes deu vida, se identificou com eles e é a sua mais alta representação: o Rei. A linguagem humana ainda não produziu palavra que substituísse esta, em homenagem aos melindres de certas pessoas. É o Rei, o chefe natural dos povos. E como há o Rei electivo e o Rei hereditário, a vida dos povos mostra a toda a hora a superioridade do segundo sobre o primeiro. Porque o Rei eleito sempre, de qualquer forma, ficava sujeito aos que o escolheram. Verdadeiramente independente; plenamente senhor de si próprio, o Rei hereditário.
Tendo sempre, diante dos olhos, as responsabilidades do Passado, não se desviando, portanto, em momento só das responsabilidades do Presente; e atento sempre às responsabilidades do Futuro — o Rei hereditário é, independentemente dos defeitos inerentes a todas as coisas humanas, o melhor, o mais eficaz, o mais fecundo, o mais seguro e mais sólido dos regimes: é o único que corresponde, que traduz, humanamente, o governo divino. E sem em todas as suas acções, o homem deve procurar aproximar-se das acções de Deus, não compreendo como é que, precisamente em problema tão difícil como este do governo de sociedades humanas, ele se há-de afastar do exemplo da ordem divina, ele se há-de opor à lição divina!
Se a concepção monoteísta é, como toda a gente sabe, superior à concepção politeísta, no governo dos povos, o Um é superior ao Muitos.
Mas o Um para ser autenticamente Um precisa de nada dever ao Muitos — nem a sua posição, nem as suas funções, nem o seu futuro. Logo, o Rei hereditário e não o Rei electivo; logo, o Chefe hereditário, e não o Chefe electivo; logo o regime que está acima das vontades individuais, dos caprichos da ocasião, das paixões momentâneas — isto é, o Regime hereditário, e não o Regime electivo.
O Regime hereditário une, aglutina, solidifica; o Regime electivo dissocia, desagrega, pulveriza.
A Família é possível, porque o seu chefe é hereditário; uma vez que se introduza na Família o sistema electivo, a Família morre.
Ora as Nações não são mais do que Famílias em ponto grande.
Alfredo Pimenta
(In A Voz, n.º 4188, págs. 1/2, 22.10.1938)

1 Comentários
Comments:
"... o governo divino."

Que lata!

Este Pimentinha deve ter estudado nas madrasas de Kabul e Teerão.

" E sem Sufrágio, não há República..."

Outra atoarda.
Em 1938, o sr,Pimenta já deveria ter a e experi~encia empírica para saber que a República não é forçosamente democrática...assim como as monarquias, já na altura, não erma forçosamente anti-democráticas.

Os maiores e mais violentos Estados totalitários do séc.XX foram TODOS Repúblicas.
TODOS!
 
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