<$BlogRSDURL$>

sábado, agosto 30, 2008

A nova Rússia (I) 

(um artigo de Nuno Rogeiro)

Os factos, no terreno, são poderosos. É muito provável que, apesar da ajuda americana, da visita da mulher de John McCain, dos protestos da OTAN, das reclamações junto da Justiça internacional, a Geórgia tenha de (sobre) viver, permanentemente amputada de dois territórios vitais: a Ossétia do Sul e a Abkházia.
Não é também impossível que na região de Adjara, na costa do Mar Negro, onde fica o porto de Batumi, regresse um vento autonomista, que pode derivar para uma nova independência. Na melhor das hipóteses, a Geórgia será um estado retalhado e anormal, expropriado de um acesso marítimo largo e pleno, impossibilitado de construir vias de comunicação lógicas, de montar gasodutos e oleodutos pouco dispendiosos, de gerir, em plenitude, o espaço urbano e rural.
Por agora, a Duma quer apenas a "legalização" do separatismo georgiano. Mais tarde, se a presidência Medvedev concordar, pode propor a integração, na Federação russa, dos novos estados, onde se usa já o passaporte moscovita.
Claro que esta via contraria a posição da Rússia na questão do Kosovo, onde se mostrou adversa ao reconhecimento "unilateral" da ex-província jugoslava.
Claro que esta opção destrói o argumentário moscovita, até agora baseado, em primeira linha, no direito internacional e na estabilidade dos tratados.
Claro que o mesmo caminho pode fortificar o separatismo dentro da Rússia, e o regresso da questão chechena.
Mas esta foi a linha vermelha que o Kremlin traçou no chão. É muito clara, e foi admitida recentemente por um vice-ministro dos negócios estrangeiros da Rússia: Moscovo não engolirá todas as soluções geopolíticas que o Ocidente lhe proponha, nem aceitará todos os "factos consumados" de expansão da OTAN. Recuou no caso da Polónia, Hungria, República Checa e Eslováquia. Voltou a recuar no caso das repúblicas bálticas. Mas não recuará mais.
O ministro dos Negócios Estrangeiros inglês, David Milliband, diz acertadamente que, na Eurásia, não há "ex-URSS", mas sim um novo mapa de estados independentes, nascido depois de 1991. De qualquer maneira, os factos a que aludimos são mais fortes do que a "legalidade": a Rússia reclama o direito de proteger, mesmo pelas armas, os seus cidadãos fora de fronteiras, ou as comunidades russófonas alegadamente ameaçadas, naquilo que foi a União Soviética.
Isto cria um precedente, como é óbvio. Na Europa, muitos estados possuem laços de língua e cultura com grupos étnicos que ficaram separados da pátria-mãe. Polacos, alemães, italianos, checos, húngaros, para citar só alguns, existem em comunidades definidas, dentro de países onde não se fala o seu dialecto, e onde vivem como povos "integrados". O que seria se as nações de origem quisessem "protegê-los", autonomizá-los ou "libertá-los"?
O espectro de uma nova desordem europeia existe, e a comunidade regional de estados necessita, urgentemente, de uma conferência mediadora. Esta deve acordar, relembrar, reforçar ou criar regras de coexistência, resolução de conflitos, definição espacial e vizinhança, antes que os apóstolos do caos triunfem.
A "Nova Rússia" terá de fazer parte desse acordo. É um erro grave cortar todas as linhas de contacto com Moscovo. Mas há que acertar princípios de equidade, impedindo a progressão militarista e o crescendo de ameaças.
O diálogo não pode resumir-se a uma medição de forças. Ou voltaremos ao tempo em que as fronteiras são definidas pelo alcance da artilharia.

1 Comentários
Comments:
O Nuno Rogeiro é uma pessoa com muita piada, pois não deixa nem uma palavrinha crítica sobre a influência, ou ingerência, dos EUA e Israel no assunto. Vá lá, citou um Inglês...
 
Enviar um comentário
Divulgue o seu blog! Blog search directory

This page is powered by Blogger. Isn't yours?