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segunda-feira, fevereiro 28, 2011

Fazer nossa a causa do povo 

A acreditar em vários e concorridos grupos do facebook haveria razões para crer que em Portugal a corrupção, o nepotismo, a partidocracia, a incompetência e a irresponsabilidade geral teriam os dias contados. É tal a animação e tão grande o entusiasmo que a julgar por essa aparência o socratismo e o sistema que ele representa seriam varridos da nossa terra por estes dias que aí estão a chegar.
E todavia há razões para recear que assim não seja. A esquerda, que mesmo detestando Sócrates vê nele a defesa possível contra o seu próprio descalabro, está disposta a tudo para o aguentar no poder. O PCP dispõe-se a fazer de morto só para não atrapalhar, o BE agita-se em manobras de suporte mesmo à custa da sua unidade interna, a extrema-esquerda anarquizante faz o seu papel habitual, de berrar contra o fascismo para distrair do que está. Todos eles temem, e com razão, que desabando o edifício do socratismo também alguns estilhaços lhes caiam em cima - e que o que vier a seguir ainda lhes seja mais desagradável. Agarram-se ao mau para fugir ao pior.
Efectivamente, toda a esquerda sente que o povo em geral tem consciência de que se estamos como estamos foi porque a esquerda nos conduziu até aqui; e que não será já possível apagar essa certeza. Quase quatro décadas de crimes, desleixo, incapacidade, mediocridade absoluta, trouxeram-nos até à pior crise que Portugal já viveu. A esquerda sabe que terá que viver com essa mancha de vergonha inapagável até ao fim dos seus dias.
Mas a direita instalada também nada fará para remover Sócrates e os seus, fora das regras da alternância contratualizada. Toda ela vive e sempre viveu como parte do mesmo sistema, e a sua única ambição é assegurar que a rotação dos protagonistas continue a decorrer pacificamente e sem sobressaltos. Logicamente, todo o seu esforço agora consiste em convencer-nos do imperativo da estabilidade, da confiança, até que chegue o momento adequado para efectivar a substituição da equipa dirigente - sem que nada mais se modifique e sem que nenhuma das partes perca nada de essencial. Uma vez alcançado esse objectivo, nada mudaria de relevante - surgindo tão só as figurinhas irrelevantes de Passos Coelho e de Portas mais novo a centralizar em si o desprezo e a raiva hoje em dia canalizados para Sócrates.
Neste contexto, o sistema - que governa mal mas defende-se bem, como já disse alguém - pode sair-se melhor do que julgam os mais precipitados.
Não é que não sejam reais, e bem fundados, o descontentamento e a revolta que assolam a generalidade dos nossos concidadãos. Não é que não seja autêntica e genuína a vontade de mudar, a rejeição da classe política, manifestados por camadas cada vez mais representativas da população.
Tudo isso é bem verdadeiro, e a nós compete-nos estar desse lado - fazer nossa a causa do povo. Todavia, também é verdade que essa movimentação difusa e inorgânica carece de um programa, de uma estrutura, de um enquadramento. As pessoas sabem o que não querem, mas ainda não sabem o que querem. Significativamente, de entre os múltiplos grupos que surgiram a convocar gente para manifestações multitudinárias já no próximo dia 12 a exigir o derrube do governo e a demissão de toda a classe política não vi ainda ninguém com uma ideia clara sobre o que fazer no dia seguinte.
Contudo, e para acabar: já não é nada mau que se assente sobre o que não se quer. Tratemos então de combater contra o que se rejeita - e o Futuro dirá o resto.

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