segunda-feira, outubro 31, 2005
Blogues nacionalistas
Uma excelente ideia foi a de arrumar num único local uma lista de blogues de orientação nacionalista, que na sua diversidade exprimam um forte e alargado movimento de opinião unido apenas pela ideia nacional.
Dai nasceu este Blogs Nacionalistas, que só funcionará e terá utilidade se for conduzido como um serviço geral, destinado a reunir informação que depois cada um usará como lhe aprouver, e de acordo com as suas preferências.
Precisa consequentemente da colaboração de todos os potenciais beneficiários.
Para já, denota claramente a necessidade de actualização e aperfeiçoamento: será fácil acrescentar inúmeros blogues de inspiração nacionalista, tanto aqueles de que gostamos mais como aqueles que gostamos menos (quando queremos servir uma causa, os nossos gostos e simpatias pessoais são irrelevantes e temos que conseguir encará-los como tal).
O que importa não somos nós, mas aquilo que servimos por acreditarmos estar acima de nós.
Já agora, porque me parecem estar realmente a desempenhar a sua missão de serviço à causa de forma particularmente empenhada e dinâmica saúdo o Margem Sul e os seus responsáveis.
Vão em frente, de peito aberto, sem temores reverenciais perante o espírito de capelinha, o exclusivismo de grupo, a mentalidade de clube juvenil, que esterilizam as frágeis tentativas políticas de certo nacionalismo: não tememos ninguém, porque partimos à conquista de todos!
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Dai nasceu este Blogs Nacionalistas, que só funcionará e terá utilidade se for conduzido como um serviço geral, destinado a reunir informação que depois cada um usará como lhe aprouver, e de acordo com as suas preferências.
Precisa consequentemente da colaboração de todos os potenciais beneficiários.
Para já, denota claramente a necessidade de actualização e aperfeiçoamento: será fácil acrescentar inúmeros blogues de inspiração nacionalista, tanto aqueles de que gostamos mais como aqueles que gostamos menos (quando queremos servir uma causa, os nossos gostos e simpatias pessoais são irrelevantes e temos que conseguir encará-los como tal).
O que importa não somos nós, mas aquilo que servimos por acreditarmos estar acima de nós.
Já agora, porque me parecem estar realmente a desempenhar a sua missão de serviço à causa de forma particularmente empenhada e dinâmica saúdo o Margem Sul e os seus responsáveis.
Vão em frente, de peito aberto, sem temores reverenciais perante o espírito de capelinha, o exclusivismo de grupo, a mentalidade de clube juvenil, que esterilizam as frágeis tentativas políticas de certo nacionalismo: não tememos ninguém, porque partimos à conquista de todos!
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Sete magníficos
Os blogues eleitos para os destaques de hoje, pela qualidade do que nos oferecem, são sete, como os samurais de Kurosawa e os aventureiros de Sturges.
Ei-los, para que Vossas Excelências os coloquem entre os favoritos:
Mas o Rei Vai Nu! - onde o Engenheiro escreve brilhantemente sobre João Luís César das Neves, o marketing de uma nação e Bernardo Guedes da Silva.
O Batalha Final - onde o Rebatet disserta sobre o homem europeu face ao indivíduo.
O Pasquim da Reacção - onde o Corcunda ensina sobre a virtude e o horizonte do conservadorismo.
O Aliança Nacional - onde ACR e Manuel Brás raciocinam sobre o novo conceito de guerra ou as razões da greve dos juízes, e evocam as memórias das aldeias da Serra de Estrela.
O Euro-Ultramarino - que discorre sem temor nem falsas referências sobre os chorões de Mar del Plata.
O Combustões - onde Miguel Castelo Branco comenta os erros das Cassandras e os acertos de Mascarenhas Barreto.
E o Santos da Casa - onde FGSantos reflecte sobre os desafios do Irão, os temores de Israel e os dramas da imigração.
Todos, todos, a erguer nos píncaros da blogosfera. Quem ajuda a dar-lhes o lugar merecido? Vamos trabalhar em conjunto na promoção publicitária?
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Ei-los, para que Vossas Excelências os coloquem entre os favoritos:
Mas o Rei Vai Nu! - onde o Engenheiro escreve brilhantemente sobre João Luís César das Neves, o marketing de uma nação e Bernardo Guedes da Silva.
O Batalha Final - onde o Rebatet disserta sobre o homem europeu face ao indivíduo.
O Pasquim da Reacção - onde o Corcunda ensina sobre a virtude e o horizonte do conservadorismo.
O Aliança Nacional - onde ACR e Manuel Brás raciocinam sobre o novo conceito de guerra ou as razões da greve dos juízes, e evocam as memórias das aldeias da Serra de Estrela.
O Euro-Ultramarino - que discorre sem temor nem falsas referências sobre os chorões de Mar del Plata.
O Combustões - onde Miguel Castelo Branco comenta os erros das Cassandras e os acertos de Mascarenhas Barreto.
E o Santos da Casa - onde FGSantos reflecte sobre os desafios do Irão, os temores de Israel e os dramas da imigração.
Todos, todos, a erguer nos píncaros da blogosfera. Quem ajuda a dar-lhes o lugar merecido? Vamos trabalhar em conjunto na promoção publicitária?
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domingo, outubro 30, 2005
O GREMIALISMO INTEGRALISTA ANTECEDEU O CESARISMO SOCIALISTA DO FASCISMO
Quem quer que procure referir-se acidental ou superficialmente a determinado período, instituição, movimento de ideias ou sucessão de acontecimentos, começa por, melancolicamente, afirmar que a sua história está por fazer. Esta afirmação é um lugar-comum.
É um lugar-comum tranquilizante da maior ou menor noção de responsabilidade do articulista, se é que a tem: por ele se justifica a fuga ao trabalho em profundidade, sem obliterarmos deliberadamente o que nele de verdade se contém.
Entendamo-nos, se não me fiz compreender: a história, tanto a remota como a contemporânea, está sempre feita, e está sempre por fazer. Os homens são quem a faz, a interpreta, a escreve, a repete, a deturpa, a falsifica, a escamoteia e até a rasga ou varre dos arquivos e da memória quando ela se não coaduna com as suas ideologias e os seus prementes interesses. Tem sido assim em todos os tempos. Mas nos sinistros que estamos vivendo, atinge-se o supremo grau da ignomínia, da mais larvada e inconcebível desfaçatez.
E a tal ponto que - para homologar na barafunda do agiornamento compromissos que vinham de longe - se praticaram no Concílio Vaticano II e se estão praticando no Sínodo Episcopal em curso, os mais nefandos pecados contra o Espírito Santo: a contradição da verdade reconhecida por tal. Quando se aceita, para base de rectificações e renovações teológicas e litúrgicas, a inverosímil e estúpida lenda dos seis milhões de judeus exterminados pelo Nacional-Socialismo - tudo se torna possível, as próprias vestes sagradas se deixam enxovalhar pela mentira e conspurcar pela crápula. Ao parlamento episcopal, ora decorrente em Roma, vai ser - ao que se afirma - submetida a questão premente e candente do condicionamento da natalidade e da licitude dos abortivos ou anti-conceptivos. Se o Santo Padre não refreia as bestas do Apocalipse que tão livremente escoiceiam as muralhas da Fé, bem pode sair dali, para alívio de uns e justificação de outros, alguma nova, alguma sacrílega jaculatória.
***
Os últimos sessenta anos, tanto nacional como internacionalmente, podem dividir-se - arbitrariamente, como, aliás, todos os parcelamentos ou emparcelamentos históricos - em dois períodos de aproximadamente trinta anos. O primeiro vai da fugaz ditadura de João Franco ao ponto culminante e decisivo da Guerra da Libertação de Espanha. O segundo remonta à génese, condução e consequências da segunda deflagração mundial provocada deliberadamente pelo semitismo plutocrático e pelo comunismo arrogante: é a guerra ao Fascismo esmagado e sempre redivivo; é a guerra que não terminou no satânico massacre de Hiroshima e Nagasaki nem nas depurações, genocídios e caçadas aos vencidos que se prolongam até ao presente; é aquela guerra de que Salazar disse - enquanto funcionavam as forcas em Nuremberga e as execuções sumárias por toda a Europa - ter sido mal declarada, pior conduzida e catastroficamente rematada...
Em 1907, a democracia política e o liberalismo económico constituíam o sistema universal de governo dos povos. À parte as ainda tímidas e pouco divulgadas doutrinas da Action Française, não se vislumbra qualquer vigoroso impulso de reacção contra a hegemonia macónico-liberal. Pelo contrário tendo caducado, mais ou menos ostensivamente e por toda a parte, as leis liberalistas que haviam abolido os grémios de artes e ofícios, as novas associações de trabalhadores surgiam como organismos da classe trabalhadora, como clubes do socialismo, primeiro, como baluartes inexpugnáveis do marxismo, tão depressa a segunda Internacional lhe entregou os comandos da Confederação Geral do Trabalho.
Cristalizando, o liberalismo entrava em decadência irreversível, mas a democracia, seu expoente político, não se resignava a uma decrepitude que pressagiava a morte. Para sobreviver, teve de insuflar de marxismo todos os partidos e movimentos de sentido radical ou revolucionário ainda saudosos dos tempos heróicos do bolivarismo e do garibaldismo.
Foi neste ambiente de radicalismo gambettiano que se formou e preparou para a insurreição o neo-jacobinismo dos republicanos triunfante em 5 de Outubro: das lojas recebiam a inspiração; das associações de classe o apoio; das choças de carbonários o incentivo para a intolerância e a violência.
Toda a legislação da ditadura revolucionária de 1910-1911 está impregnada do mais corrosivo anticolonialismo. Mais que os decretos em que se abalavam os fundamentos da família e da propriedade, de inequívoca inspiração marxista - e posto que, na prática, o catolicismo fosse menos que a sombra de uma força - foram as tigrinas repressões e arbitrários entraves ao culto livre da religião o que mais contribuiu para fomentar uma reacção que poucos anos depois criaria núcleos de estudo e de acção consciencializadores do Nacionalismo integral.
***
Quando a primeira Grande Guerra eclodiu, não foi difícil verificar que, pelo menos do lado dos aliados ocidentais, se erguia um paredão ideológico contra o qual deveriam baquear todos os adversários (e já então eram muitos) da democracia: a sua vitória sobre os impérios centrais (cujas instituições, aliás, eram igualmente democráticas...) concedeu-lhes poderes discricionários para retalharem e subjugarem o mundo. Desse mundo imaginário à imagem e semelhança da maçonaria, escapava-se irremediavelmente a Rússia.
O marxismo ali implantado e consolidado, ao mesmo tempo que fomentava a subversão do caduco mundo liberalista, inspirava igualmente o advento de movimentos de legítima defesa naqueles povos que, tendo suportado as sevícias democráticas, não estavam dispostos a deixarem-se aniquilar pela revindicta do comunismo.
Onde a injustiça era maior, mais brava e fulminante foi a reacção. O semitismo todo poderoso e senhor de quase todas as alavancas do Estado, não permitiu que essa reacção tomasse vulto na Alemanha, logo a seguir ao diktat de Versalhes. Só por isso o Fascismo, como doutrina de ordem política e de justiça social, teve o seu advento na Itália, enquanto a judiaria internacional negociava nos corredores do Vaticano a excomunhão da Action Française.
Não pode negar-se que a doutrinação de Maurras e dos outros catedráticos do Nacionalismo francês actuou em alguns casos como catalisadora do pensamento dos fundadores e vulgarizadores do Integralismo Lusitano. É preciso notar, porém, que este - ao contrário do Nacional-Socialismo e do Fascismo - era um movimento de ideias, e não um desfile de milícias ou uma algarada de massas.
Quando quis ser, isto é, quando alguém criado nas suas fileiras, (onde, se não houvera ousadia para restaurar as instituições tradicionais, o Verbo actuara eficazmente na restauração da Inteligência...) tentou sair à rua e galvanizar cortes encamisadas e militarizadas numa tradução portuguesa e barata do Nacional-Socialismo então a caminho do triunfo - era tarde. Era tarde porque a Nação já nessa altura reconhecia como o seu único chefe a Salazar.
Era tarde também porque os defuntos partidos demo-parlamentares, varridos mas não convencidos da actividade política que só clandestinamente podiam exercer, ainda nesse ano de 1931 reincidiam nas suas tentativas insurreccionais de 1927 e 1929, agora precisamente quando a Revolução de 28 de Maio ia institucionalizar-se na lei orgânica da Nação, no estatuto constitucional que com ligeiras alterações, rege, com não menor eficácia do que qualquer Constituição em qualquer outro país, as relações entre o Estado e os cidadãos...
***
É natural que o cesarismo socialista preconizado por Oliveira Martins nas conclusões do seu "Portugal Contemporâneo", e tão auspiciosamente estabelecido e organizado em Itália pelo génio romano de Mussolini, conferisse certa homogeneidade, para não dizer unidade, nas directrizes revolucionárias que fizeram triunfar o Movimento Nacional de 28 de Maio. Já então o Fascismo tinha quatro anos de vida desafogada e próspera. Mas a revolução na inteligência portuguesa precedera de quase uma dezena de anos o advento do Fascismo. O novo nacionalismo, embora de pés bem assentes na tradição e nas verdades eternas, advogava um neo-gremialismo ou corporativismo mais livre e flexível do que as Confrarias de Artes e Ofícios da Idade Média e infinitamente mais humano do que os ergástulos profissionais dos Colégios Romanos ou das Confederações Gerais do Trabalho dos nossos dias.
Não é de admirar, portanto, que já durante o consulado de Sidónio Pais (cinco anos antes da Marcha sobre Roma!) alguns postulados do Integralismo Lusitano merecessem a melhor compreensão e acolhimento do seu governo. Um crime monstruoso, seguido das reacções e contra-reacções dos primeiros meses de 1919 e prolongadas até 19 de Outubro de 1921, afogaram em sangue essas primeiras e esperançosas experiências. Mas o ideal da reestruturação nacional pelo gremialismo ou corporativismo radicara-se tão fortemente no nosso nacionalismo, que nem as querelas dinásticas nem os melindres pessoais dos seus doutrinadores, relegados para um injusto ostracismo por um movimento puramente militar, apagaram ou esmoreceram o ímpeto convincente e a força ascensional.
***
Não teria sido profunda, mas seria estultícia negar a influência que entre nós - como, aliás, em todo o mundo - exerceu o Fascismo e o Nacional-Socialismo, e, com a derrota militar destes, o marxismo, único e verdadeiro triunfador da guerra antifascista.
À vitória pelas armas, porém, nem sempre corresponde uma decisiva vitória política: a Santa Aliança derrotou a França da Revolução, e, no entanto, o século XIX foi, por excelência, o século da democracia e do liberalismo...
Essa influência de sinal positivo entre os anos 30 e 40, rodou para o quadrante negativo quando todos os meios de propaganda, de informação e de pressão e repressão foram utilizados contra os defensores da Europa. Os vingativos vampiros que tanto sangue fascista beberam nos primeiros dois anos que se seguiram à vitória do comunismo, do semitismo e do sacristianismo, não lograram nessa altura beber o nosso. Mas os vampiros não nos perdoaram nunca o auxílio que prestámos à Espanha na gesta incomparável da sua libertação. Essa dívida de sangue é a que há sete anos estamos pagando nas nossas províncias ultramarinas.
Até quando? Só Deus o sabe. ...Apesar das ameaçadoras nuvens que de todos os lados se erguiam contra o seu império, Mussolini afirmou um dia que o século XX seria o século do fascio. O Duce, porém, era um chefe político, não era um profeta, e nenhum outro futuro próximo se espera na Itália que não seja o do comunismo, em cujas mãos já todos os poderes, incluindo os espirituais, se encontram...
Mesmo assim, e por mais árdua que seja a tarefa, o Nacionalismo português espera e confia. Confia na sua força e na força de um destino sobre-humano que lhe franqueia as portas de uma nova missão universalista. Espera a nova primavera de juventude e de beleza que perfumou de esperança a mais digna e generosa de todas as gerações.
César de Oliveira
(In «Agora», n.º 329, 04.11.1967, pág. 10)
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É um lugar-comum tranquilizante da maior ou menor noção de responsabilidade do articulista, se é que a tem: por ele se justifica a fuga ao trabalho em profundidade, sem obliterarmos deliberadamente o que nele de verdade se contém.
Entendamo-nos, se não me fiz compreender: a história, tanto a remota como a contemporânea, está sempre feita, e está sempre por fazer. Os homens são quem a faz, a interpreta, a escreve, a repete, a deturpa, a falsifica, a escamoteia e até a rasga ou varre dos arquivos e da memória quando ela se não coaduna com as suas ideologias e os seus prementes interesses. Tem sido assim em todos os tempos. Mas nos sinistros que estamos vivendo, atinge-se o supremo grau da ignomínia, da mais larvada e inconcebível desfaçatez.
E a tal ponto que - para homologar na barafunda do agiornamento compromissos que vinham de longe - se praticaram no Concílio Vaticano II e se estão praticando no Sínodo Episcopal em curso, os mais nefandos pecados contra o Espírito Santo: a contradição da verdade reconhecida por tal. Quando se aceita, para base de rectificações e renovações teológicas e litúrgicas, a inverosímil e estúpida lenda dos seis milhões de judeus exterminados pelo Nacional-Socialismo - tudo se torna possível, as próprias vestes sagradas se deixam enxovalhar pela mentira e conspurcar pela crápula. Ao parlamento episcopal, ora decorrente em Roma, vai ser - ao que se afirma - submetida a questão premente e candente do condicionamento da natalidade e da licitude dos abortivos ou anti-conceptivos. Se o Santo Padre não refreia as bestas do Apocalipse que tão livremente escoiceiam as muralhas da Fé, bem pode sair dali, para alívio de uns e justificação de outros, alguma nova, alguma sacrílega jaculatória.
***
Os últimos sessenta anos, tanto nacional como internacionalmente, podem dividir-se - arbitrariamente, como, aliás, todos os parcelamentos ou emparcelamentos históricos - em dois períodos de aproximadamente trinta anos. O primeiro vai da fugaz ditadura de João Franco ao ponto culminante e decisivo da Guerra da Libertação de Espanha. O segundo remonta à génese, condução e consequências da segunda deflagração mundial provocada deliberadamente pelo semitismo plutocrático e pelo comunismo arrogante: é a guerra ao Fascismo esmagado e sempre redivivo; é a guerra que não terminou no satânico massacre de Hiroshima e Nagasaki nem nas depurações, genocídios e caçadas aos vencidos que se prolongam até ao presente; é aquela guerra de que Salazar disse - enquanto funcionavam as forcas em Nuremberga e as execuções sumárias por toda a Europa - ter sido mal declarada, pior conduzida e catastroficamente rematada...
Em 1907, a democracia política e o liberalismo económico constituíam o sistema universal de governo dos povos. À parte as ainda tímidas e pouco divulgadas doutrinas da Action Française, não se vislumbra qualquer vigoroso impulso de reacção contra a hegemonia macónico-liberal. Pelo contrário tendo caducado, mais ou menos ostensivamente e por toda a parte, as leis liberalistas que haviam abolido os grémios de artes e ofícios, as novas associações de trabalhadores surgiam como organismos da classe trabalhadora, como clubes do socialismo, primeiro, como baluartes inexpugnáveis do marxismo, tão depressa a segunda Internacional lhe entregou os comandos da Confederação Geral do Trabalho.
Cristalizando, o liberalismo entrava em decadência irreversível, mas a democracia, seu expoente político, não se resignava a uma decrepitude que pressagiava a morte. Para sobreviver, teve de insuflar de marxismo todos os partidos e movimentos de sentido radical ou revolucionário ainda saudosos dos tempos heróicos do bolivarismo e do garibaldismo.
Foi neste ambiente de radicalismo gambettiano que se formou e preparou para a insurreição o neo-jacobinismo dos republicanos triunfante em 5 de Outubro: das lojas recebiam a inspiração; das associações de classe o apoio; das choças de carbonários o incentivo para a intolerância e a violência.
Toda a legislação da ditadura revolucionária de 1910-1911 está impregnada do mais corrosivo anticolonialismo. Mais que os decretos em que se abalavam os fundamentos da família e da propriedade, de inequívoca inspiração marxista - e posto que, na prática, o catolicismo fosse menos que a sombra de uma força - foram as tigrinas repressões e arbitrários entraves ao culto livre da religião o que mais contribuiu para fomentar uma reacção que poucos anos depois criaria núcleos de estudo e de acção consciencializadores do Nacionalismo integral.
***
Quando a primeira Grande Guerra eclodiu, não foi difícil verificar que, pelo menos do lado dos aliados ocidentais, se erguia um paredão ideológico contra o qual deveriam baquear todos os adversários (e já então eram muitos) da democracia: a sua vitória sobre os impérios centrais (cujas instituições, aliás, eram igualmente democráticas...) concedeu-lhes poderes discricionários para retalharem e subjugarem o mundo. Desse mundo imaginário à imagem e semelhança da maçonaria, escapava-se irremediavelmente a Rússia.
O marxismo ali implantado e consolidado, ao mesmo tempo que fomentava a subversão do caduco mundo liberalista, inspirava igualmente o advento de movimentos de legítima defesa naqueles povos que, tendo suportado as sevícias democráticas, não estavam dispostos a deixarem-se aniquilar pela revindicta do comunismo.
Onde a injustiça era maior, mais brava e fulminante foi a reacção. O semitismo todo poderoso e senhor de quase todas as alavancas do Estado, não permitiu que essa reacção tomasse vulto na Alemanha, logo a seguir ao diktat de Versalhes. Só por isso o Fascismo, como doutrina de ordem política e de justiça social, teve o seu advento na Itália, enquanto a judiaria internacional negociava nos corredores do Vaticano a excomunhão da Action Française.
Não pode negar-se que a doutrinação de Maurras e dos outros catedráticos do Nacionalismo francês actuou em alguns casos como catalisadora do pensamento dos fundadores e vulgarizadores do Integralismo Lusitano. É preciso notar, porém, que este - ao contrário do Nacional-Socialismo e do Fascismo - era um movimento de ideias, e não um desfile de milícias ou uma algarada de massas.
Quando quis ser, isto é, quando alguém criado nas suas fileiras, (onde, se não houvera ousadia para restaurar as instituições tradicionais, o Verbo actuara eficazmente na restauração da Inteligência...) tentou sair à rua e galvanizar cortes encamisadas e militarizadas numa tradução portuguesa e barata do Nacional-Socialismo então a caminho do triunfo - era tarde. Era tarde porque a Nação já nessa altura reconhecia como o seu único chefe a Salazar.
Era tarde também porque os defuntos partidos demo-parlamentares, varridos mas não convencidos da actividade política que só clandestinamente podiam exercer, ainda nesse ano de 1931 reincidiam nas suas tentativas insurreccionais de 1927 e 1929, agora precisamente quando a Revolução de 28 de Maio ia institucionalizar-se na lei orgânica da Nação, no estatuto constitucional que com ligeiras alterações, rege, com não menor eficácia do que qualquer Constituição em qualquer outro país, as relações entre o Estado e os cidadãos...
***
É natural que o cesarismo socialista preconizado por Oliveira Martins nas conclusões do seu "Portugal Contemporâneo", e tão auspiciosamente estabelecido e organizado em Itália pelo génio romano de Mussolini, conferisse certa homogeneidade, para não dizer unidade, nas directrizes revolucionárias que fizeram triunfar o Movimento Nacional de 28 de Maio. Já então o Fascismo tinha quatro anos de vida desafogada e próspera. Mas a revolução na inteligência portuguesa precedera de quase uma dezena de anos o advento do Fascismo. O novo nacionalismo, embora de pés bem assentes na tradição e nas verdades eternas, advogava um neo-gremialismo ou corporativismo mais livre e flexível do que as Confrarias de Artes e Ofícios da Idade Média e infinitamente mais humano do que os ergástulos profissionais dos Colégios Romanos ou das Confederações Gerais do Trabalho dos nossos dias.
Não é de admirar, portanto, que já durante o consulado de Sidónio Pais (cinco anos antes da Marcha sobre Roma!) alguns postulados do Integralismo Lusitano merecessem a melhor compreensão e acolhimento do seu governo. Um crime monstruoso, seguido das reacções e contra-reacções dos primeiros meses de 1919 e prolongadas até 19 de Outubro de 1921, afogaram em sangue essas primeiras e esperançosas experiências. Mas o ideal da reestruturação nacional pelo gremialismo ou corporativismo radicara-se tão fortemente no nosso nacionalismo, que nem as querelas dinásticas nem os melindres pessoais dos seus doutrinadores, relegados para um injusto ostracismo por um movimento puramente militar, apagaram ou esmoreceram o ímpeto convincente e a força ascensional.
***
Não teria sido profunda, mas seria estultícia negar a influência que entre nós - como, aliás, em todo o mundo - exerceu o Fascismo e o Nacional-Socialismo, e, com a derrota militar destes, o marxismo, único e verdadeiro triunfador da guerra antifascista.
À vitória pelas armas, porém, nem sempre corresponde uma decisiva vitória política: a Santa Aliança derrotou a França da Revolução, e, no entanto, o século XIX foi, por excelência, o século da democracia e do liberalismo...
Essa influência de sinal positivo entre os anos 30 e 40, rodou para o quadrante negativo quando todos os meios de propaganda, de informação e de pressão e repressão foram utilizados contra os defensores da Europa. Os vingativos vampiros que tanto sangue fascista beberam nos primeiros dois anos que se seguiram à vitória do comunismo, do semitismo e do sacristianismo, não lograram nessa altura beber o nosso. Mas os vampiros não nos perdoaram nunca o auxílio que prestámos à Espanha na gesta incomparável da sua libertação. Essa dívida de sangue é a que há sete anos estamos pagando nas nossas províncias ultramarinas.
Até quando? Só Deus o sabe. ...Apesar das ameaçadoras nuvens que de todos os lados se erguiam contra o seu império, Mussolini afirmou um dia que o século XX seria o século do fascio. O Duce, porém, era um chefe político, não era um profeta, e nenhum outro futuro próximo se espera na Itália que não seja o do comunismo, em cujas mãos já todos os poderes, incluindo os espirituais, se encontram...
Mesmo assim, e por mais árdua que seja a tarefa, o Nacionalismo português espera e confia. Confia na sua força e na força de um destino sobre-humano que lhe franqueia as portas de uma nova missão universalista. Espera a nova primavera de juventude e de beleza que perfumou de esperança a mais digna e generosa de todas as gerações.
César de Oliveira
(In «Agora», n.º 329, 04.11.1967, pág. 10)
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ESTILO FASCISTA
Em 28 de Outubro de 1922, a Itália foi o teatro de um acontecimento de primordial importância não somente para o povo italiano como para o mundo inteiro.
Desde a madrugada, grupos de homens reunidos em algumas localidades da Úmbria, da Sabina e do litoral firenziano, iniciaram a sua marcha sobre Roma, erguendo bandeiras italianas e os estandartes negros do Fascismo. Naquela marcha vitoriosa participaram homens de todas as condições sociais e de todas as idades. Irmanados por uma mesma fé na grandeza da Pátria, marchavam com entusiasmo rapazes de dezasseis e dezassete anos, e veteranos, antigos combatentes do Carso e da Piave, vencedores nos campos de batalha italianos durante a grande guerra. Uma única vontade animava estes homens, física e espiritualmente tão diferentes: acabar com a mediocridade democrática e a balbúrdia parlamentar, criar uma Nova Ordem, que correspondesse melhor às necessidades sociais do momento e que pudesse restituir à Itália a sua antiga grandeza.
O que o Fascismo procurava destruir era a organização liberal e democrática do Estado. O Fascismo tinha de forjar a nova alma da Nação e não recuou perante as inúmeras dificuldades desta missão. Com firmeza e decisão, lançou-se na luta, por vezes sangrenta e sempre implacável, que durou mais de três anos e tornou muitas vezes necessário o uso de meios-extra-legais; o último deles foi a própria marcha sobre Roma que implantou o Regime Fascista na Itália.
Será, contudo, o Fascismo um fenómeno político puramente italiano que, por conseguinte, tem a sua única aplicação na península itálica? Não, sem dúvida, porque se assim fosse realmente nunca poderia ter inspirado tão profundamente outros Estados europeus.
É certo que o Fascismo nasceu na Itália e estava relacionado com problemas e necessidades particulares da nação italiana, mas podemos afirmar que este fenómeno político, originando um grande movimento de ideias, obedeceu a todos os ocidentais, facto que pode explicar a sua expansão na Europa.
Este sentido ocidental do movimento fascista foi reconhecido pelo próprio Mussolini, que declarou em 1933: «O Fascismo é um fenómeno essencialmente italiano que contém elementos universais (como doutrina) e elementos práticos (como legislação) que podem também ser adoptados por outros povos. Também há, no Fascismo, um núcleo central de ideias, de sentimentos, de doutrinas que estão relacionadas com a nossa tradição histórica mais antiga, isto é, a romana, e que lhe dão a sua originalidade.»
Mais do que uma simples corrente de pensamento o Fascismo é uma nova maneira de viver. O Duce declarou um dia que o elemento fundamental da mística fascista é a recusa orgulhosa do comodismo burguês. Esta mística vivificadora, intransigente, juvenil, conseguiu imprimir um estilo característico em todas as manifestações da vida social. Após um século de liberalismo em que as grandes certezas eram discutidas, as verdades mais sagradas negadas, os princípios fundamentais desprezados, um estilo novo, sincero, firme, sério, apareceu na vida política dos povos que sacudiram o jugo demo-liberal e seguiram o magnífico exemplo do Fascismo italiano.
Quanto a nós, a nossa posição está bem definida. Continuamos fiéis ao estilo fascista que caracterizou até agora a nossa maneira de viver perigosamente, porque somos jovens e recusamos ceder a pressões burguesas provenientes de grupos que temem a nossa intransigência e condenam a nossa juventude.
Se o Fascismo é o fim das greves, o fim das desordens, o fim dos abusos contra o interesse nacional, então declaro com orgulho que sou fascista. Se é ser fascista querer proteger a autoridade do Estado, defender o Império, lutar contra a traição, não há dúvida que ainda há muitos fascistas em Portugal.
O estilo fascista tem algo de profundamente irritante para os mentores do republicanismo demo-liberal: a combatividade. Frente à apatia liberal, as juventudes de uniforme que desfilavam de braço erguido, com passo firme e atitude altiva, representavam o fim dos chamados princípios de 89. Eis porque este estilo juvenil, alegre e militar, considerado perigoso pelos vencedores da última guerra, foi condenado. Mas ninguém nos poderá jamais obrigar ao abandono deste estilo que tanto contribuiu para a nossa formação.
Luís Fernandes
(In «Agora», n.º 329, 04.11.1967, pág. 6)
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Desde a madrugada, grupos de homens reunidos em algumas localidades da Úmbria, da Sabina e do litoral firenziano, iniciaram a sua marcha sobre Roma, erguendo bandeiras italianas e os estandartes negros do Fascismo. Naquela marcha vitoriosa participaram homens de todas as condições sociais e de todas as idades. Irmanados por uma mesma fé na grandeza da Pátria, marchavam com entusiasmo rapazes de dezasseis e dezassete anos, e veteranos, antigos combatentes do Carso e da Piave, vencedores nos campos de batalha italianos durante a grande guerra. Uma única vontade animava estes homens, física e espiritualmente tão diferentes: acabar com a mediocridade democrática e a balbúrdia parlamentar, criar uma Nova Ordem, que correspondesse melhor às necessidades sociais do momento e que pudesse restituir à Itália a sua antiga grandeza.
O que o Fascismo procurava destruir era a organização liberal e democrática do Estado. O Fascismo tinha de forjar a nova alma da Nação e não recuou perante as inúmeras dificuldades desta missão. Com firmeza e decisão, lançou-se na luta, por vezes sangrenta e sempre implacável, que durou mais de três anos e tornou muitas vezes necessário o uso de meios-extra-legais; o último deles foi a própria marcha sobre Roma que implantou o Regime Fascista na Itália.
Será, contudo, o Fascismo um fenómeno político puramente italiano que, por conseguinte, tem a sua única aplicação na península itálica? Não, sem dúvida, porque se assim fosse realmente nunca poderia ter inspirado tão profundamente outros Estados europeus.
É certo que o Fascismo nasceu na Itália e estava relacionado com problemas e necessidades particulares da nação italiana, mas podemos afirmar que este fenómeno político, originando um grande movimento de ideias, obedeceu a todos os ocidentais, facto que pode explicar a sua expansão na Europa.
Este sentido ocidental do movimento fascista foi reconhecido pelo próprio Mussolini, que declarou em 1933: «O Fascismo é um fenómeno essencialmente italiano que contém elementos universais (como doutrina) e elementos práticos (como legislação) que podem também ser adoptados por outros povos. Também há, no Fascismo, um núcleo central de ideias, de sentimentos, de doutrinas que estão relacionadas com a nossa tradição histórica mais antiga, isto é, a romana, e que lhe dão a sua originalidade.»
Mais do que uma simples corrente de pensamento o Fascismo é uma nova maneira de viver. O Duce declarou um dia que o elemento fundamental da mística fascista é a recusa orgulhosa do comodismo burguês. Esta mística vivificadora, intransigente, juvenil, conseguiu imprimir um estilo característico em todas as manifestações da vida social. Após um século de liberalismo em que as grandes certezas eram discutidas, as verdades mais sagradas negadas, os princípios fundamentais desprezados, um estilo novo, sincero, firme, sério, apareceu na vida política dos povos que sacudiram o jugo demo-liberal e seguiram o magnífico exemplo do Fascismo italiano.
Quanto a nós, a nossa posição está bem definida. Continuamos fiéis ao estilo fascista que caracterizou até agora a nossa maneira de viver perigosamente, porque somos jovens e recusamos ceder a pressões burguesas provenientes de grupos que temem a nossa intransigência e condenam a nossa juventude.
Se o Fascismo é o fim das greves, o fim das desordens, o fim dos abusos contra o interesse nacional, então declaro com orgulho que sou fascista. Se é ser fascista querer proteger a autoridade do Estado, defender o Império, lutar contra a traição, não há dúvida que ainda há muitos fascistas em Portugal.
O estilo fascista tem algo de profundamente irritante para os mentores do republicanismo demo-liberal: a combatividade. Frente à apatia liberal, as juventudes de uniforme que desfilavam de braço erguido, com passo firme e atitude altiva, representavam o fim dos chamados princípios de 89. Eis porque este estilo juvenil, alegre e militar, considerado perigoso pelos vencedores da última guerra, foi condenado. Mas ninguém nos poderá jamais obrigar ao abandono deste estilo que tanto contribuiu para a nossa formação.
Luís Fernandes
(In «Agora», n.º 329, 04.11.1967, pág. 6)
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sábado, outubro 29, 2005
Geoestratégia
Recebi a nova "lettre message" de "Geostratégie", um portal excelente para quem gosta de se manter informado sobre os acontecimentos realmente importantes a nível da política internacional e da geoestratégia, normalmente despercebidos na imprensa comum.
Um rico manancial de informações: Geostratégie.
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Um rico manancial de informações: Geostratégie.
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O oceano das palavras
Há três dias atrás o blogue Oceano das palavras, um blogue feito em Seia e que eu nem sequer tinha mencionado quando falei nos blogues senenses, teve a delicadeza de fazer uma referência ao meu blogue.
Esclareço que geralmente dou muita atenção ao que se passa na blogosfera, e nomeadamente pesquiso as referências que são feitas a este lugar isolado, facto que naturalmente me sensibiliza pelo que significa de reconhecimento do trabalho aqui efectuado (manter um blogue é trabalho, sim senhor, mesmo que se chegue a gostar dele).
Agradeço portanto ao Oceano das palavras, que me pareceu um blogue bem feito e interessante, diversificado nos temas e com apresentação gráfica de grande nível técnico (tudo bem diferente da monotonia deste tugúrio).
Trouxe-me à memória a lembrança simpática dos tempos em que eu comia no "Camelo", e a amabilidade e atenção permanentes do Jorge Camelo. Tenho saudades do Inverno de Seia, sobretudo disso, do Inverno, da lareira e da comida quente, e do frio aconchegado e reconfortante. Entenda-se lá isto, eu gosto do frio.
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Esclareço que geralmente dou muita atenção ao que se passa na blogosfera, e nomeadamente pesquiso as referências que são feitas a este lugar isolado, facto que naturalmente me sensibiliza pelo que significa de reconhecimento do trabalho aqui efectuado (manter um blogue é trabalho, sim senhor, mesmo que se chegue a gostar dele).
Agradeço portanto ao Oceano das palavras, que me pareceu um blogue bem feito e interessante, diversificado nos temas e com apresentação gráfica de grande nível técnico (tudo bem diferente da monotonia deste tugúrio).
Trouxe-me à memória a lembrança simpática dos tempos em que eu comia no "Camelo", e a amabilidade e atenção permanentes do Jorge Camelo. Tenho saudades do Inverno de Seia, sobretudo disso, do Inverno, da lareira e da comida quente, e do frio aconchegado e reconfortante. Entenda-se lá isto, eu gosto do frio.
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quinta-feira, outubro 27, 2005
Tierra y Pueblo
Anuncia-se para os próximos dias 5 a 7 de Novembro a realização do II Colóquio da associação Tierra y Pueblo, estando prevista a presença de muitas e variadas personalidades ligadas ao panorama cultural e político identitário.
Quem não puder assistir pessoalmente, terá que acompanhar o acontecimento pelo site Tierra y Pueblo.
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Quem não puder assistir pessoalmente, terá que acompanhar o acontecimento pelo site Tierra y Pueblo.
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"Orgulhosamente Só"
Ora aqui está um blogue que deixamos injustamente só: merecia mais atenções de todos os que combatem as pestes universais do esquerdismo, do socialismo e do comunismo, com todas as suas variantes hard ou soft.
Excelente a última transcrição de Olavo de Carvalho!
Tratem de visitar o "Orgulhosamente Só".
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Excelente a última transcrição de Olavo de Carvalho!
Tratem de visitar o "Orgulhosamente Só".
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Prussian blue
As gémeas Lynx e Lamb Gaede, de treze anos, estão a fazer furor na cena musical: são as Prussian Blue.
Descubra você mesmo o que têm as duas meninas da Califórnia de "Blonde Hair Blue Eyes".
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Descubra você mesmo o que têm as duas meninas da Califórnia de "Blonde Hair Blue Eyes".
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quarta-feira, outubro 26, 2005
Os melhores dos mais recentes
Escolho estes:
- "O fim do regime" e "A questão turca"
- Epílogo, regeneração e renascimento
- Humor brasileiro (tem mesmo graça!)
- Rodrigues dos Santos e Mascarenhas Barreto
- Les maladies de la Démocratie
- De "No silêncio da noite lisboeta" ao "Codex plagiarius"
- a "Nostalgia de Outono", de Luys de Santamarina
- o megacomércio e os centros históricos
- sobre o neorealismo político
(Se lerem tudo o que eu mando, ainda ficam uns fascistas deveras instruídos).
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- "O fim do regime" e "A questão turca"
- Epílogo, regeneração e renascimento
- Humor brasileiro (tem mesmo graça!)
- Rodrigues dos Santos e Mascarenhas Barreto
- Les maladies de la Démocratie
- De "No silêncio da noite lisboeta" ao "Codex plagiarius"
- a "Nostalgia de Outono", de Luys de Santamarina
- o megacomércio e os centros históricos
- sobre o neorealismo político
(Se lerem tudo o que eu mando, ainda ficam uns fascistas deveras instruídos).
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Sobre colonização e descolonização
É crucial reflectir sobre a História: leia-se o apelo à verdade sobre a descolonização, e em complemento o comentário do Sexo dos Anjos a esse respeito.
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segunda-feira, outubro 24, 2005
Seia na blogosfera
Reparei agora que existem bastantes senenses marcando a blogosfera: além de António da Cruz Rodrigues, da Folgosa do Salvador, já aqui mencionado em múltiplas ocasiões, dou como exemplos António João Ferrão, João Tilly, Nuno Almeida, Paulo Alexandre, e um longo etc. que representa uma boa cobertura na rede para a zona de entrada da Estrela.
Conhecem Seia e a Serra da Estrela?
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Conhecem Seia e a Serra da Estrela?
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OS QUE NÃO FORAM CONSULTADOS
Dias há em que a gente fica triste com o ofício que tem. Imagino como não deve ser enervante para as cozinheiras, nesses dias, a atmosfera das frituras e a companhia das caçarolas; como não deve ser monótono para o ferreiro o gemido das bigornas; como não deve ser triste, muito triste, o vai-e-vem da agulha na mão picada da velha costureira. Cada ofício é uma prisão: as coisas ficam sendo o que são pelo bagaço. E o cárcere do ofício é duro, asfixiante, enervante...
Ora, a minha profissão — assim me parece nesses dias — é ainda mais triste do que as outras. A cozinheira vê seus pratos feitos, substancialmente constituídos; e vê a alegria da casa alimentar-se de seu feijão. O ferreiro vê o ferro curvar-se, conformar-se e obedecer. E a costureira vê a perseverante agulha conquistar o pano de ponto em ponto, obrigando-o a seguir os contornos de um corpo e os movimentos de uma alma. Nesses ofícios tudo é concreto, tudo é palpável.
Considerem agora o meu. Que fabrico eu? Palavras. Escritas ou faladas, da manhã à noite, no papel, na sala de aula, ou diante de um microfone que esconde não sei quantos ouvintes — talvez nenhum — eu cozinho palavras, eu forjo palavras, eu costuro palavras. "Words, words, words..." Meu ofício é um ronronar que já dura trinta anos. Triste ofício. E não sou eu que só dele descreio. Tu também, amigo leitor, tu também não crês no meu ofício. Gostas de ler. Aprovas-me quando logro alinhavar com alguma felicidade os meus adjetivos ou quando prego com boa linha as minhas conjunções. Mas confessa: na verdade, não acreditas muito no valor dessa procissão de sinais escritos, e muito menos crês no fugaz valor do som articulado que sai duma velha garganta cansada de ronronar. Palavras hoje, palavras amanhã. Em tempo e contra tempo...
Ora, estando eu num desses dias de preamar da melancolia, um outro oficial do mesmo ofício contou-me uma linda história. Ele pronunciava, diante de seleto auditório (como se costuma dizer) uma conferência sobre casamento, limitação de natalidade e aborto. Acabada a conferência e ouvidas as palmas que, como todos os sons, também se perdem no ar, o nosso conferencista voltou para casa. Ia triste. Revolvia na memória as ressonâncias do que dissera. O seleto auditório estava, evidentemente, de acordo com o que ele dissera. O universo continuava o mesmo depois da conferência; ou se não, se mudara, se o trajeto de algum átomo sofrera algum desvio milimétrico, as vidas, os corações, os seletos corações, ao contrário, seguiriam seus itinerários sem que o sopro das palavras conseguisse desviá-los. O que é uma conferência? Um sopro. Um vento. Falar é modo requintado de abanar... No caderninho de notas do conferencista, estão as outras conferências aprazadas: depois de amanhã, dia 15, dia 24, etc., etc., etc.
Quatro meses mais tarde, estando o nosso orador à porta de uma livraria a ver passar o mundo, é abordado por uma moça risonha com sete meses bem contados de gravidez, E sem mais preâmbulos, apresentou-se:
— Naquela conferência eu estava de três meses. E não ia ficar. Tinha resolvido não ficar. Mas o senhor disse aquela frase...
A moça despediu-se. Dobrou a esquina. O conferencista viu ainda uma vez o majestoso perfil da gravidez, e quedou-se a pensar. Que frase? Não se lembrava. Lembrou-se de uma página de Edgar Allan Poe, onde o poeta diz que as estrelas do céu nasceram de palavras de amor. A sua frase — que frase? — lá com suas conjunções, advérbios e proposições fizera alguma coisa maior, infinitamente maior do que as estrelas do céu: salvara uma criança. Será menino ou menina?
* * *
Ouvi hoje contar o caso de um acrobata americano que teve uma idéia. "Brain wave". Uma idéia nova para seu programa de televisão. É assim: em pé no rebordo do telhado de um arranha-céu ele faz cabriolas, não com seu próprio corpo, mas com o corpo de uma criancinha de meses que ele atira para o ar, apanha, equilibra, muda de mão e passa entre as pernas. Como se vê, o espetáculo deve ter sido excitante e gostoso para os pupilas cansadas de outros espetáculos mais rotineiros.
Essa história lembrou-me outra. Estavam duas ou três senhoras de nossa melhor sociedade, dessas que tomam chá de chapéu, a discutir o caso de um desabusado cirurgião (também da melhor sociedade) que provocara um aborto sem consultar ninguém. Dizia, então, uma das senhoras, a do chapéu de lilás: "Eu acho que a família deve ser consultada..." A dama de chapéu cor-de-amora foi mais precisa: "Eu acho que compete à mãe, exclusivamente, resolver o caso". E estava a conversa neste ponto quando um amigo meu, tímido e gago, que nunca consegue ser ouvido por ninguém, sugeriu que quem devia ser consultada era a criança. E é a ausência dessa consulta que me horrorizou na história do acrobata. Por muito menos zangou-se um dia Jack London, numa tourada, porque os touros e cavalos não eram ouvidos.
Mas ninguém ouviu a reflexão de meu amigo. Como ninguém ouve a misteriosa linguagem com que os embriões de dois a três meses declaram categoricamente que querem viver. Como também cada dia menos se ouve a linguagem, já menos mistificada, das crianças de dois ou três anos que são energicamente contrárias ao divórcio. O fato é esse: na ginástica, no aborto e no divórcio, há pessoas, personagens, pessoas humanas, vivas, que estão envolvidas e que não são ouvidas.
"Ora, direis, ouvir crianças... certo perdeste o siso!", dirá algum leitor que ainda se lembre dos esplendores do nosso parnaso. Como é possível ouvir um embrião? Como se pode ponderar o que diz uma criança de dois anos?
Digo-te eu, leitor, que foste tu que perdeste o siso. E acrescento: o mundo está como está, e o nosso Brasil chegou onde sabemos que chegou, porque as pessoas (a começar pelas da melhor sociedade) não têm mais ouvidos para ouvir e entender a linguagem dos fetos. Fuzilam-se inocentes, aos milhões, sem remorsos, dada a circunstância supersônica de seus protestos. Vou explicar-te, amigo, mais uma vez, como se pode ouvir o que não fala, e consultar o que não tem a idade da razão. É muito simples: ouvindo e consultando a lei que está gravada na natureza das coisas, a lei que qualquer consciência desobstruída de chás e chapéus pode ouvir e consultar. Uma boa lavadeira, uma honesta cozinheira, sem procurar psicólogos e sociólogos, têm ouvidos para a voz da Inocência perfeita, para a voz que condena o aborto, o divórcio, e outras acrobacias feitas com carne de gente.
* * *
Por falar em aborto, ouvi dizer que na Suíça tornou-se legal. Não sei detalhes. Não sei em circunstâncias, pelos quatro cantões da Suíça, tornou-se admissível matar a criança que teve a impertinência de brotar num ventre de moça. Imagino que os suíços, que são reconhecidamente um povo ordeiro e asseado, e sobretudo muito deferente com os turistas, tenham descoberto excelentes razões para assassinar pequeninos suíços. Uma das razões que imagino seria a seguinte: mata-se a criança excedente pelo bem da pátria e da família. Um pouco como se queima o café, para valorizá-lo. De uma senhora, que tem um Pontiac verde-claro, já ouvi dizer que se justifica "não guardar" para manter o "padrão de vida". Não se guarda a criança para guardar-se o Pontiac. Outra senhora, um pouco menos desvairada, alega que fuzila a criança não nascida em benefício das outras já nascidas.
Esses argumentos chegaram aos ouvidos de meu amigo Álvaro Tavares que sugere uma emenda para a teoria dessa senhora que mata um filho em benefício dos outros: admitido que se deva matar um para benefício da família e da sociedade, devemos deixar a criança nascer, e, mais tarde, num conselho de família, escolher a criança mais feia, ou mais bronca na tabuada, ou mais birrenta na mesa, e então executá-la para o maior bem da família e da pátria.
Concordo inteiramente com essa emenda apresentada pelo meu amigo Álvaro Tavares. Em nome da psicologia, da sociologia e da eugenia, acho precipitada a pena de morte que recai sobre a "criança desconhecida". O mundo, entre seus momentos de prolongado desvario, já teve a idéia de honrar o soldado desconhecido; mas nos seus piores momentos ainda não teve a idéia de fuzilar um criminoso desconhecido. E muito menos um desconhecido inocente. Aprovo pois a emenda e aqui acrescento o meu pesponto. Em lugar do conselho de família, eu sugiro que consultem um psicotécnico.
Voltando aos suíços, confesso que não me espantei demais com a notícia. Tenho desconfiança desses países muito ordeiros, muito arrumados. Tenho horror a hotéis. Só me espanto com uma incoerência que vejo nessa lei dos suíços: se a religião daquele pitoresco país é o turismo, se tratam tão bem os que chegam das Américas, porque diacho maltratam assim o pequenino turista que ingressa num dos quatro cantões pela mais antiga das portas?
Gustavo Corção
(in Dez Anos. Rio de Janeiro, Ed. AGIR, 1957)
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Ora, a minha profissão — assim me parece nesses dias — é ainda mais triste do que as outras. A cozinheira vê seus pratos feitos, substancialmente constituídos; e vê a alegria da casa alimentar-se de seu feijão. O ferreiro vê o ferro curvar-se, conformar-se e obedecer. E a costureira vê a perseverante agulha conquistar o pano de ponto em ponto, obrigando-o a seguir os contornos de um corpo e os movimentos de uma alma. Nesses ofícios tudo é concreto, tudo é palpável.
Considerem agora o meu. Que fabrico eu? Palavras. Escritas ou faladas, da manhã à noite, no papel, na sala de aula, ou diante de um microfone que esconde não sei quantos ouvintes — talvez nenhum — eu cozinho palavras, eu forjo palavras, eu costuro palavras. "Words, words, words..." Meu ofício é um ronronar que já dura trinta anos. Triste ofício. E não sou eu que só dele descreio. Tu também, amigo leitor, tu também não crês no meu ofício. Gostas de ler. Aprovas-me quando logro alinhavar com alguma felicidade os meus adjetivos ou quando prego com boa linha as minhas conjunções. Mas confessa: na verdade, não acreditas muito no valor dessa procissão de sinais escritos, e muito menos crês no fugaz valor do som articulado que sai duma velha garganta cansada de ronronar. Palavras hoje, palavras amanhã. Em tempo e contra tempo...
Ora, estando eu num desses dias de preamar da melancolia, um outro oficial do mesmo ofício contou-me uma linda história. Ele pronunciava, diante de seleto auditório (como se costuma dizer) uma conferência sobre casamento, limitação de natalidade e aborto. Acabada a conferência e ouvidas as palmas que, como todos os sons, também se perdem no ar, o nosso conferencista voltou para casa. Ia triste. Revolvia na memória as ressonâncias do que dissera. O seleto auditório estava, evidentemente, de acordo com o que ele dissera. O universo continuava o mesmo depois da conferência; ou se não, se mudara, se o trajeto de algum átomo sofrera algum desvio milimétrico, as vidas, os corações, os seletos corações, ao contrário, seguiriam seus itinerários sem que o sopro das palavras conseguisse desviá-los. O que é uma conferência? Um sopro. Um vento. Falar é modo requintado de abanar... No caderninho de notas do conferencista, estão as outras conferências aprazadas: depois de amanhã, dia 15, dia 24, etc., etc., etc.
Quatro meses mais tarde, estando o nosso orador à porta de uma livraria a ver passar o mundo, é abordado por uma moça risonha com sete meses bem contados de gravidez, E sem mais preâmbulos, apresentou-se:
— Naquela conferência eu estava de três meses. E não ia ficar. Tinha resolvido não ficar. Mas o senhor disse aquela frase...
A moça despediu-se. Dobrou a esquina. O conferencista viu ainda uma vez o majestoso perfil da gravidez, e quedou-se a pensar. Que frase? Não se lembrava. Lembrou-se de uma página de Edgar Allan Poe, onde o poeta diz que as estrelas do céu nasceram de palavras de amor. A sua frase — que frase? — lá com suas conjunções, advérbios e proposições fizera alguma coisa maior, infinitamente maior do que as estrelas do céu: salvara uma criança. Será menino ou menina?
* * *
Ouvi hoje contar o caso de um acrobata americano que teve uma idéia. "Brain wave". Uma idéia nova para seu programa de televisão. É assim: em pé no rebordo do telhado de um arranha-céu ele faz cabriolas, não com seu próprio corpo, mas com o corpo de uma criancinha de meses que ele atira para o ar, apanha, equilibra, muda de mão e passa entre as pernas. Como se vê, o espetáculo deve ter sido excitante e gostoso para os pupilas cansadas de outros espetáculos mais rotineiros.
Essa história lembrou-me outra. Estavam duas ou três senhoras de nossa melhor sociedade, dessas que tomam chá de chapéu, a discutir o caso de um desabusado cirurgião (também da melhor sociedade) que provocara um aborto sem consultar ninguém. Dizia, então, uma das senhoras, a do chapéu de lilás: "Eu acho que a família deve ser consultada..." A dama de chapéu cor-de-amora foi mais precisa: "Eu acho que compete à mãe, exclusivamente, resolver o caso". E estava a conversa neste ponto quando um amigo meu, tímido e gago, que nunca consegue ser ouvido por ninguém, sugeriu que quem devia ser consultada era a criança. E é a ausência dessa consulta que me horrorizou na história do acrobata. Por muito menos zangou-se um dia Jack London, numa tourada, porque os touros e cavalos não eram ouvidos.
Mas ninguém ouviu a reflexão de meu amigo. Como ninguém ouve a misteriosa linguagem com que os embriões de dois a três meses declaram categoricamente que querem viver. Como também cada dia menos se ouve a linguagem, já menos mistificada, das crianças de dois ou três anos que são energicamente contrárias ao divórcio. O fato é esse: na ginástica, no aborto e no divórcio, há pessoas, personagens, pessoas humanas, vivas, que estão envolvidas e que não são ouvidas.
"Ora, direis, ouvir crianças... certo perdeste o siso!", dirá algum leitor que ainda se lembre dos esplendores do nosso parnaso. Como é possível ouvir um embrião? Como se pode ponderar o que diz uma criança de dois anos?
Digo-te eu, leitor, que foste tu que perdeste o siso. E acrescento: o mundo está como está, e o nosso Brasil chegou onde sabemos que chegou, porque as pessoas (a começar pelas da melhor sociedade) não têm mais ouvidos para ouvir e entender a linguagem dos fetos. Fuzilam-se inocentes, aos milhões, sem remorsos, dada a circunstância supersônica de seus protestos. Vou explicar-te, amigo, mais uma vez, como se pode ouvir o que não fala, e consultar o que não tem a idade da razão. É muito simples: ouvindo e consultando a lei que está gravada na natureza das coisas, a lei que qualquer consciência desobstruída de chás e chapéus pode ouvir e consultar. Uma boa lavadeira, uma honesta cozinheira, sem procurar psicólogos e sociólogos, têm ouvidos para a voz da Inocência perfeita, para a voz que condena o aborto, o divórcio, e outras acrobacias feitas com carne de gente.
* * *
Por falar em aborto, ouvi dizer que na Suíça tornou-se legal. Não sei detalhes. Não sei em circunstâncias, pelos quatro cantões da Suíça, tornou-se admissível matar a criança que teve a impertinência de brotar num ventre de moça. Imagino que os suíços, que são reconhecidamente um povo ordeiro e asseado, e sobretudo muito deferente com os turistas, tenham descoberto excelentes razões para assassinar pequeninos suíços. Uma das razões que imagino seria a seguinte: mata-se a criança excedente pelo bem da pátria e da família. Um pouco como se queima o café, para valorizá-lo. De uma senhora, que tem um Pontiac verde-claro, já ouvi dizer que se justifica "não guardar" para manter o "padrão de vida". Não se guarda a criança para guardar-se o Pontiac. Outra senhora, um pouco menos desvairada, alega que fuzila a criança não nascida em benefício das outras já nascidas.
Esses argumentos chegaram aos ouvidos de meu amigo Álvaro Tavares que sugere uma emenda para a teoria dessa senhora que mata um filho em benefício dos outros: admitido que se deva matar um para benefício da família e da sociedade, devemos deixar a criança nascer, e, mais tarde, num conselho de família, escolher a criança mais feia, ou mais bronca na tabuada, ou mais birrenta na mesa, e então executá-la para o maior bem da família e da pátria.
Concordo inteiramente com essa emenda apresentada pelo meu amigo Álvaro Tavares. Em nome da psicologia, da sociologia e da eugenia, acho precipitada a pena de morte que recai sobre a "criança desconhecida". O mundo, entre seus momentos de prolongado desvario, já teve a idéia de honrar o soldado desconhecido; mas nos seus piores momentos ainda não teve a idéia de fuzilar um criminoso desconhecido. E muito menos um desconhecido inocente. Aprovo pois a emenda e aqui acrescento o meu pesponto. Em lugar do conselho de família, eu sugiro que consultem um psicotécnico.
Voltando aos suíços, confesso que não me espantei demais com a notícia. Tenho desconfiança desses países muito ordeiros, muito arrumados. Tenho horror a hotéis. Só me espanto com uma incoerência que vejo nessa lei dos suíços: se a religião daquele pitoresco país é o turismo, se tratam tão bem os que chegam das Américas, porque diacho maltratam assim o pequenino turista que ingressa num dos quatro cantões pela mais antiga das portas?
Gustavo Corção
(in Dez Anos. Rio de Janeiro, Ed. AGIR, 1957)
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A PÁTRIA
A idéia de pátria e a correlata de patriotismo vêm sendo sabotadas, há séculos, pelas correntes históricas que nas últimas décadas formam o enorme estuário de equívocos que constituem o néctar, o uísque escocês dos “intelectuais” das chamadas esquerdas. A corrente anarco-socialista, bem como a marxista, sempre anunciaram em canto e prosa a Internacional, sem nunca suspeitarem que deste modo pretendiam combater uma exigência da alma humana tão profunda como a de querer constituir família.
À primeira vista, e numa análise sem vigor, parece que o amor da pátria exclui o resto da humanidade e assim se opõe ao mandamento de Deus. Na verdade, todo amor exclusivo será egoísta e defeituoso, já que o próprio do amor, ainda que inclua as mais densas dileções, é ser difusivo. E se não for difusivo não é amor; será quando muito egoísmo ou amor próprio.
Vejamos como se entende, dentro do imperativo de universalidade, o bom fundamento do amor da Pátria. É sabido que nenhum homem esgota em sua vida e com suas aptidões todas as virtualidades da alma humana. Para bem manifestar toda a grandeza e toda a beleza da alma humana, em todas as suas possibilidades, foi preciso que os homens se multiplicassem e se diversificassem. A perfeição do homem se vê na humanidade desdobrada. Mas não basta essa multiplicação. Para bem exibir diante do universo e das galerias angélicas toda a riqueza do animal-racional, ou da alma feita à imagem e semelhança de Deus, foi preciso ainda recorrer ao curso da história e ao contraponto das civilizações. E além dos desdobramentos e dos alongamentos individuais, foi preciso diferenciar os agrupamentos humanos em tipo, com línguas, costumes e cultura diversificados.
E este é o fundamento natural da pátria.
Faz parte da grande e inebriante aventura humana esse tipo de experiência que consiste em viver, num dado território e ao longo de uma história, uma vocação comum, uma cultura comum, que se exprime não apenas pela língua comum mas por todo o jogo de símbolos, de significações multiplicadas que resultam das alegrias comuns e dos sofrimentos comuns expressos na profundidade das almas por sinais comuns.
Quando eu penso com simplicidade no objeto do amor pátrio, eu penso numa grande comunidade que acabou de chegar na ponta de uma grande história e que acampou, se instalou numa imensa geografia. Tudo isso me envolve numa cercadura enorme, e tudo isso nos diz que somos portadores duma vocação, de uma parte, de uma tarefa na grande aventura humana. Toda essa cercadura, esse envoltório humano, cultural, sociológico, histórico, geográfico é um campo de forças que nos penetra, e que se cruza dentro de nós, e nos faz o que somos, o que sentimos e amamos. Curioso processo psicológico que sempre se repete para as coisas mais amplas e mais próximas. Nossos envoltórios, a família, o bairro, a pátria, são obras emanadas de nossas almas, e são elas que refluem e modelam nossas almas. Há por fora de nós um enorme Brasil exterior; há dentro de nós um Brasil interior de sentimentos e de virtudes que devem ser cultivadas e apuradas para que o Brasil exterior seja melhor e mais Brasil, e mais e melhor para formar as almas de seus filhos.
Precisamos cultivar essa piedade, esse respeito pelo grande quinhão que nos coube na prodigiosa aventura do gênero humano, não para nos excluirmos e nos fecharmos, mas para que nosso amor pátrio seja difusivo e se transforme em amor universal. Precisamos sentir e agir como se o mapa-mundi a cosmografia e a história fossem inconcebíveis sem a nossa presença.
Não há nenhum espasmo de eloqüência convencional nem sombra de orgulho nesse reconhecimento de nosso valor: haverá até um ato de humildade acompanhado de um sentimento de responsabilidade. Aprendi essa lição do valor de cada ser dentro da Criação com um pobre cego, a quem uma senhora bondosa queria confortar e de quem lamentava a triste sorte. Agradecendo a bondade, o ceguinho confortou-a com estas palavras:
— Sem eu o mundo não estaria completo. Faltaria minha cegueira...
Tudo tem valor. Que valor tremendo, terrível, não terá essa comunidade pátria? Que aleijão enorme faria no mundo a falta desse jeitão coletivo, nosso, meu, seu, vosso, que chamamos Brasil! Esse modo de sermos, de falarmos, de sentirmos, essa esparsa alma comum: Brasil.
E para não desmerecermos em tal tarefa (a de completar o universo!) precisamos friccionar nossos sentimentos e nossas virtudes, e para isto precisamos de comemorações, de sinais e símbolos já que nesta vida terrena, como disse o apóstolo Paulo, vivemos entre sinais e enigmas. Daí a utilidade das bandeiras, dos hinos e das festividades cívicas que todos os povos normais sempre amaram. Mas a necessidade mais imperiosa e contínua que decorre da consciência patriótica é a do serviço prestado no dia a dia da vida profissional. Festejemos os dias da pátria, mas essas festividades seriam vazias e até falsas se não fossem sinais do desejo de servi-la.
*
E peçamos a Nossa Senhora da Aparecida, à omnipotência suplicante da Mãe de Deus, que nos proteja sempre como recentemente nos protegeu.
Gustavo Corção
(“O Globo”, de 05/09/1970)
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À primeira vista, e numa análise sem vigor, parece que o amor da pátria exclui o resto da humanidade e assim se opõe ao mandamento de Deus. Na verdade, todo amor exclusivo será egoísta e defeituoso, já que o próprio do amor, ainda que inclua as mais densas dileções, é ser difusivo. E se não for difusivo não é amor; será quando muito egoísmo ou amor próprio.
Vejamos como se entende, dentro do imperativo de universalidade, o bom fundamento do amor da Pátria. É sabido que nenhum homem esgota em sua vida e com suas aptidões todas as virtualidades da alma humana. Para bem manifestar toda a grandeza e toda a beleza da alma humana, em todas as suas possibilidades, foi preciso que os homens se multiplicassem e se diversificassem. A perfeição do homem se vê na humanidade desdobrada. Mas não basta essa multiplicação. Para bem exibir diante do universo e das galerias angélicas toda a riqueza do animal-racional, ou da alma feita à imagem e semelhança de Deus, foi preciso ainda recorrer ao curso da história e ao contraponto das civilizações. E além dos desdobramentos e dos alongamentos individuais, foi preciso diferenciar os agrupamentos humanos em tipo, com línguas, costumes e cultura diversificados.
E este é o fundamento natural da pátria.
Faz parte da grande e inebriante aventura humana esse tipo de experiência que consiste em viver, num dado território e ao longo de uma história, uma vocação comum, uma cultura comum, que se exprime não apenas pela língua comum mas por todo o jogo de símbolos, de significações multiplicadas que resultam das alegrias comuns e dos sofrimentos comuns expressos na profundidade das almas por sinais comuns.
Quando eu penso com simplicidade no objeto do amor pátrio, eu penso numa grande comunidade que acabou de chegar na ponta de uma grande história e que acampou, se instalou numa imensa geografia. Tudo isso me envolve numa cercadura enorme, e tudo isso nos diz que somos portadores duma vocação, de uma parte, de uma tarefa na grande aventura humana. Toda essa cercadura, esse envoltório humano, cultural, sociológico, histórico, geográfico é um campo de forças que nos penetra, e que se cruza dentro de nós, e nos faz o que somos, o que sentimos e amamos. Curioso processo psicológico que sempre se repete para as coisas mais amplas e mais próximas. Nossos envoltórios, a família, o bairro, a pátria, são obras emanadas de nossas almas, e são elas que refluem e modelam nossas almas. Há por fora de nós um enorme Brasil exterior; há dentro de nós um Brasil interior de sentimentos e de virtudes que devem ser cultivadas e apuradas para que o Brasil exterior seja melhor e mais Brasil, e mais e melhor para formar as almas de seus filhos.
Precisamos cultivar essa piedade, esse respeito pelo grande quinhão que nos coube na prodigiosa aventura do gênero humano, não para nos excluirmos e nos fecharmos, mas para que nosso amor pátrio seja difusivo e se transforme em amor universal. Precisamos sentir e agir como se o mapa-mundi a cosmografia e a história fossem inconcebíveis sem a nossa presença.
Não há nenhum espasmo de eloqüência convencional nem sombra de orgulho nesse reconhecimento de nosso valor: haverá até um ato de humildade acompanhado de um sentimento de responsabilidade. Aprendi essa lição do valor de cada ser dentro da Criação com um pobre cego, a quem uma senhora bondosa queria confortar e de quem lamentava a triste sorte. Agradecendo a bondade, o ceguinho confortou-a com estas palavras:
— Sem eu o mundo não estaria completo. Faltaria minha cegueira...
Tudo tem valor. Que valor tremendo, terrível, não terá essa comunidade pátria? Que aleijão enorme faria no mundo a falta desse jeitão coletivo, nosso, meu, seu, vosso, que chamamos Brasil! Esse modo de sermos, de falarmos, de sentirmos, essa esparsa alma comum: Brasil.
E para não desmerecermos em tal tarefa (a de completar o universo!) precisamos friccionar nossos sentimentos e nossas virtudes, e para isto precisamos de comemorações, de sinais e símbolos já que nesta vida terrena, como disse o apóstolo Paulo, vivemos entre sinais e enigmas. Daí a utilidade das bandeiras, dos hinos e das festividades cívicas que todos os povos normais sempre amaram. Mas a necessidade mais imperiosa e contínua que decorre da consciência patriótica é a do serviço prestado no dia a dia da vida profissional. Festejemos os dias da pátria, mas essas festividades seriam vazias e até falsas se não fossem sinais do desejo de servi-la.
*
E peçamos a Nossa Senhora da Aparecida, à omnipotência suplicante da Mãe de Deus, que nos proteja sempre como recentemente nos protegeu.
Gustavo Corção
(“O Globo”, de 05/09/1970)
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domingo, outubro 23, 2005
PORTUGAL E A GUERRA
A proclamação do Governo, de 2 do corrente, definindo a posição do País perante o desgraçado conflito que a incompetência e as paixões diabólicas alimentadas pelo Judeu e pela Maçonaria desencadearam neste momento no oriente da Europa, a proclamação do Governo é, na sua sobriedade, singeleza e clareza, um documento digno da mais cuidadosa atenção.
A doutrina é impecável. Ela resume-se com poucas palavras: a neutralidade até ao último extremo; quando não puder sustentar-se, cumpram-se as obrigações que a Aliança impõe.
Em vez de termos no Poder os bonifrates de 1915 e 1916 que não hesitaram em fazer tudo quanto estivesse ao seu alcance para atirarem estupidamente com o País para a fornalha, temos a governar-nos um homem de espírito culto e de notável capacidade de compreensão do Interesse nacional.
Este implicita manifestamente a neutralidade — num conflito com que nada temos, para o qual não concorremos, e que, por todos os motivos, quando menos nações envolver, melhor.
De que natureza é este conflito? De natureza ideológica ou de natureza material?
Se de natureza material, da mesma forma temos que analisar os interesses que se chocam, para vermos se, de longe ou de perto, eles afectam os nossos — contrariando-os ou servindo-os.
O Governo da Nação viu o problema à luz deste critério, e concluiu que não havia motivos para nos colocar num dos campos beligerantes, até àquele momento em que, por força da nossa Aliança, nós tenhamos de colaborar — não por opção, por capricho, por gosto, mas unicamente por dever — o dever de tornar efectivo um compromisso.
A comédia acabou pela tragédia. A comédia consistiu em se dizer, gritar, proclamar que se não queria a guerra, quando, afinal de contas, os que mais fortemente o diziam, e mais alto o gritavam, e mais estentoriamente o proclamavam eram os que mais desejavam quebrar a Paz.
Isto de se pôr o ramo num sítio e se vender o vinho no outro é velho e relho na História do Mundo.
Quem decididadmente não quer a guerra, desarma. Chama os outros e diz-lhes: desarmemos.
Desde que me conheço que oiço cantar a ária do desarmamento — mas sempre à volta do tema: desarme você. Se ninguém quer ser o primeiro, por desconfiança do vizinho, porque não se reunem e não decidem isto: desarmar todos ao mesmo tempo?
Em vez do: desarme você, em vez do: desarmo eu — porque não dizem todos: desarmemos?
As várias tentativas de desarmamento deram origem às cenas mais divertidas, com paridades, tonelagens para a direita, tonelagens para a esquerda — a mais escandalosa das mistificações.
Só se compreende o desarmamento total. É possível? Estou convencido de que não. Então — parate bellum.
Mas confesse-se, francamente.
No actual momento, dentre a imprensa do mundo que conheço, um só jornalista pôs o problema como deve pôr-se: Charles Maurras.
Escreveu ele, há dias, estas palavras: — «E ninguém fará jamais a paz, a dizer, a repetir e sobretudo a repetir a si próprio que a guerra é inevitável».
Quem quer a paz, fala na paz, diz palavras, pratica actos de paz. Se o mundo não se adapta a tal procedimento, estamos caídos na paz armada que não é mais do que uma espécie de... armistício.
Desde o Tratado de Versalhes que só oiço palavras de ódio, palavras de guerra — porque todas as palavras de paz que se escreveram, todos os discursos de paz que se pronunciaram, todos os passos de paz que se deram implicavam o propósito de dar e de ter como definitivas as disposições desse Tratado.
Mas o que se vinha a preparar desde 1919 deu-se. E aí temos a Europa oriental e central sob a catástrofe da guerra.
Perante ela nos encontramos. E o Governo definiu, na sua Proclamação, a nossa posição de neutrais.
Não é suficiente, porém, a declaração do Governo. É indispensável que todos nós os que escrevemos, os que, por qualquer forma, influímos na criação ou nas flutuações da divisão, nos integremos na doutrina fixada pelo Governo, e actuemos em subordinação dela.
Não é esse o espectáculo que me oferecem infelizmente os jornais. A despeito da neutralidade proclamada pelo Governo — o que eu vejo é que os chamados órgãos jornalísticos tomaram posição ao lado de um dos combatentes, e exibem a mais franca beligerância.
Quaisquer que sejam as razões desta determinação, o que é certo é que não está certo que assim se faça, porque o Governo responsável indicou a tempo e horas o caminho a seguir à Nação. Ora a Nação não é uma palavra abstracta: é uma realidade concreta.
E se o Governo formula uma directriz, e nós, por nossa conta e risco, seguimos por outra, as consequências imediatas são fáceis de ver: ou o descrédito do Governo, ou o descrédito da Nação.
O Governo proclamou a neutralidade. Felicito-o e aplaudo-o por esta decisão. De acordo com esse aplauso, não me manifesto por A nem por B. Sou português, vejo Portugal, e só me interessa a conveniência de Portugal.
Maurras escreveu, e bem insuspeito é ele, porque é francês, e porque foi sempre partidário da Entente Cordiale anglo-francesa:
«O sr. Chamberlain parece querer fazer a guerra por princípios, que diz serem os seus, o que, de resto, deveria examinar-se. Nós não temos que fazer a guerra por princípios, fossem eles os do nosso excelente amigo e aliado de Londres».
Repito: só vejo Portugal, só me interessa a conveniência de Portugal.
Não faz sentido que nos meus artigos, nas minhas notícias, nas minhas informações eu seja beligerante, criando no espírito público uma opinião de beligerância, levando-o a uma apreciação unilateral, a um juízo parcial, a uma posição de guerra.
A neutralidade impõe deveres — o primeiro dos quais, consiste em se fornecer à opinião incapaz de se formar por si própria, a exposição objectiva dos acontecimentos.
Nós, por enquanto, somos simplesmente portugueses, e, consequentemente, devemos evitar aos que nos lêem e pensam por nós, os erros, as mentiras, os exageros, as deformações das Agências telegráficas estrangeiras.
Tão nacionalistas queremos ser, e tão estrangeiros nos afirmamos!
Alfredo Pimenta
(In A Voz, n.º 4519, págs. 1/2, 25.09.1939)
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A doutrina é impecável. Ela resume-se com poucas palavras: a neutralidade até ao último extremo; quando não puder sustentar-se, cumpram-se as obrigações que a Aliança impõe.
Em vez de termos no Poder os bonifrates de 1915 e 1916 que não hesitaram em fazer tudo quanto estivesse ao seu alcance para atirarem estupidamente com o País para a fornalha, temos a governar-nos um homem de espírito culto e de notável capacidade de compreensão do Interesse nacional.
Este implicita manifestamente a neutralidade — num conflito com que nada temos, para o qual não concorremos, e que, por todos os motivos, quando menos nações envolver, melhor.
De que natureza é este conflito? De natureza ideológica ou de natureza material?
Se de natureza material, da mesma forma temos que analisar os interesses que se chocam, para vermos se, de longe ou de perto, eles afectam os nossos — contrariando-os ou servindo-os.
O Governo da Nação viu o problema à luz deste critério, e concluiu que não havia motivos para nos colocar num dos campos beligerantes, até àquele momento em que, por força da nossa Aliança, nós tenhamos de colaborar — não por opção, por capricho, por gosto, mas unicamente por dever — o dever de tornar efectivo um compromisso.
A comédia acabou pela tragédia. A comédia consistiu em se dizer, gritar, proclamar que se não queria a guerra, quando, afinal de contas, os que mais fortemente o diziam, e mais alto o gritavam, e mais estentoriamente o proclamavam eram os que mais desejavam quebrar a Paz.
Isto de se pôr o ramo num sítio e se vender o vinho no outro é velho e relho na História do Mundo.
Quem decididadmente não quer a guerra, desarma. Chama os outros e diz-lhes: desarmemos.
Desde que me conheço que oiço cantar a ária do desarmamento — mas sempre à volta do tema: desarme você. Se ninguém quer ser o primeiro, por desconfiança do vizinho, porque não se reunem e não decidem isto: desarmar todos ao mesmo tempo?
Em vez do: desarme você, em vez do: desarmo eu — porque não dizem todos: desarmemos?
As várias tentativas de desarmamento deram origem às cenas mais divertidas, com paridades, tonelagens para a direita, tonelagens para a esquerda — a mais escandalosa das mistificações.
Só se compreende o desarmamento total. É possível? Estou convencido de que não. Então — parate bellum.
Mas confesse-se, francamente.
No actual momento, dentre a imprensa do mundo que conheço, um só jornalista pôs o problema como deve pôr-se: Charles Maurras.
Escreveu ele, há dias, estas palavras: — «E ninguém fará jamais a paz, a dizer, a repetir e sobretudo a repetir a si próprio que a guerra é inevitável».
Quem quer a paz, fala na paz, diz palavras, pratica actos de paz. Se o mundo não se adapta a tal procedimento, estamos caídos na paz armada que não é mais do que uma espécie de... armistício.
Desde o Tratado de Versalhes que só oiço palavras de ódio, palavras de guerra — porque todas as palavras de paz que se escreveram, todos os discursos de paz que se pronunciaram, todos os passos de paz que se deram implicavam o propósito de dar e de ter como definitivas as disposições desse Tratado.
Mas o que se vinha a preparar desde 1919 deu-se. E aí temos a Europa oriental e central sob a catástrofe da guerra.
Perante ela nos encontramos. E o Governo definiu, na sua Proclamação, a nossa posição de neutrais.
Não é suficiente, porém, a declaração do Governo. É indispensável que todos nós os que escrevemos, os que, por qualquer forma, influímos na criação ou nas flutuações da divisão, nos integremos na doutrina fixada pelo Governo, e actuemos em subordinação dela.
Não é esse o espectáculo que me oferecem infelizmente os jornais. A despeito da neutralidade proclamada pelo Governo — o que eu vejo é que os chamados órgãos jornalísticos tomaram posição ao lado de um dos combatentes, e exibem a mais franca beligerância.
Quaisquer que sejam as razões desta determinação, o que é certo é que não está certo que assim se faça, porque o Governo responsável indicou a tempo e horas o caminho a seguir à Nação. Ora a Nação não é uma palavra abstracta: é uma realidade concreta.
E se o Governo formula uma directriz, e nós, por nossa conta e risco, seguimos por outra, as consequências imediatas são fáceis de ver: ou o descrédito do Governo, ou o descrédito da Nação.
O Governo proclamou a neutralidade. Felicito-o e aplaudo-o por esta decisão. De acordo com esse aplauso, não me manifesto por A nem por B. Sou português, vejo Portugal, e só me interessa a conveniência de Portugal.
Maurras escreveu, e bem insuspeito é ele, porque é francês, e porque foi sempre partidário da Entente Cordiale anglo-francesa:
«O sr. Chamberlain parece querer fazer a guerra por princípios, que diz serem os seus, o que, de resto, deveria examinar-se. Nós não temos que fazer a guerra por princípios, fossem eles os do nosso excelente amigo e aliado de Londres».
Repito: só vejo Portugal, só me interessa a conveniência de Portugal.
Não faz sentido que nos meus artigos, nas minhas notícias, nas minhas informações eu seja beligerante, criando no espírito público uma opinião de beligerância, levando-o a uma apreciação unilateral, a um juízo parcial, a uma posição de guerra.
A neutralidade impõe deveres — o primeiro dos quais, consiste em se fornecer à opinião incapaz de se formar por si própria, a exposição objectiva dos acontecimentos.
Nós, por enquanto, somos simplesmente portugueses, e, consequentemente, devemos evitar aos que nos lêem e pensam por nós, os erros, as mentiras, os exageros, as deformações das Agências telegráficas estrangeiras.
Tão nacionalistas queremos ser, e tão estrangeiros nos afirmamos!
Alfredo Pimenta
(In A Voz, n.º 4519, págs. 1/2, 25.09.1939)
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PÁGINAS MINHOTAS
Quando saí de Lisboa, a manhã estava clara e fria — promessa de viagem agradável, em temperatura de gente. Vinha-me o coração envolvido em melancolias, destas que por muito que a gente as afaste sempre se prendem, em farrapos de névoa, ou rastos de perfume.
Pela primeira vez, ao passar em Coimbra, voltei a cara para a não ver, porque pela primeira vez me senti algemado a fortes saudades dos meus vinte e cinco anos — quando dali parti, cheio de saúde, de energia, de audácia para enfrentar a vida que se me abria cheia de lutas, de perigos, traições e calvários...
E hoje, vejo, no horizonte, os mesmos calvários, as mesmas traições, os mesmos perigos, as mesmas lutas, mas eu não sou mais do que o velho gladiador de músculos lassos, olhar quebrado, e fé abalada...
Por alturas de Espinho, começa a chover. Recordo certos versos tristes de Verlaine, e à medida que o rápido avança, mais densa é a chuva.
E ao entrarmos em Campanhã, caía a potes. O trasbordo na Trofa é difícil — debaixo de água. Não sei porque é que ainda não ocorreu a quem tem de olhar por estas coisas, mandar fazer um alpendre no cais que fica entre a linha do Minho e Douro e a linha da Companhia do Norte.
O Manuel do Conde foi-me buscar à Trofa. Tomamos pela estrada de Famalicão.
Os vinhedos estão florescentes. Os milhos estão famosos. Ano de vinho e ano de pão. Ano dos pobres, e é quanto faz minga. Por alturas de Ronfe, vejo a Penha fechada em nuvens. Chove.
Porquê tanta chuva neste dia, santo Deus?
O coração distante, o pensamento distante, todo eu distante, entro, pela primeira vez, no sanatório da minha alma, sem alegria, sem prazer e sem interesse. Oiço as velhas oliveiras que, a agitar-se as suas folhas esguias, me perguntam que tal venho; sinto os choupos amigos que fazem barreira carinhosa para que o Sol me não invada o jardinzinho, saudar-me; noto as boas vindas da hera que me cobre as paredes da casa: faz-me estremecer o gorgolejar da fonte cheia de água a cair no tanque largo cheio de água.
Os livros da Livraria da Mumadona, como os meus amigos chamam à minha livrariazinha da Madre de Deus; as flores que poisam nas mesas; as coisas da casa — tudo me dá boas-vindas afáveis e carinhosas.
Mas o coração está longe, o pensamento está longe, todo eu estou longe, numa distância imprecisa, mergulhada em neblinas — ante-câmara dum destino que não sei definir, feito de pontos de interrogação que não sei decifrar.
Tudo isto está pouco mais ou menos na mesma. A ramada mais coberta promete. O limoeiro novo que há quatro anos foi enxertado tem seis limões, grandes, magníficos, — os primeiros limões que dá, decidido pelo visto a substituir, com vantagem o velho limoeiro de cem anos que junto da casa do caseiro, é o nosso enlevo, como foi o enlevo dos antepassados.
Na parte mais alta da terra, onde a água da rega não chega, o milho está atrevido. Ano molhado — cantam as águas das fontes, deliram as terras secas.
O frio queimou o centeio. Mas deve haver milho em abundância, mesmo com o desconto da acção da bicha que, nas terras fundas, sem possibilidades de escoamento, se fica a devorar as raízes do milho.
E já a Luísa do Carregal a queixar-se: «a bicha comeu muito, mas há-de ser o que o Senhor quiser...».
No pinheiral, os pinheiros novos estão bonitos; altos, a engrossar, as suas coroas de perfil gótico, que lindas estão! Como eu gostaria de trazer luz no pensamento, e sossego no coração, para os contemplar com mais vagar!
Verdadeiramente de novo aqui pelos sítios, a crise do trabalho. As fábricas estão a meia ração. De sorte que este mulherio e este rapazio que trocaram a lavoura e as indústrias domésticas pela fábrica, ou trabalham só meio dia, ou trabalham só meia semana.
Pergunto a um industrial: «que é isto?». Ele responde: «não há quem compre».
Não sei onde isto se dirige. O industrial, em vez de desenvolver a sua indústria, em vez de empregar o seu capital no desenvolvimento da indústria que o enriqueceu, vai procurar a propriedade, e é na propriedade que emprega o capital.
A terra está a passar do lavrador que empobreceu nela, para as mãos do industrial, habituado à vida de escritório e da oficina.
Hoje não são os lavradores quem compra terras: são os industriais.
A par do lavrador que empobreceu na terra, há o proprietário que a herdou e a não ama. Também esse a larga, por se não poder aguentar. Que a terra é arisca. Quer amor, canseira, sacrifício e desvelo.
E eu não sei para onde caminhamos, nesta progressiva industrialização — que rouba braços à Lavoura, continuidade e firmeza à Família, fé às almas, disciplina aos sentimentos, saúde aos corpos.
A máquina é o grande verme destruidor da sociedade tradicional. É incomparável, é incalculável, é assombroso o mal que a máquina trouxe ao mundo.
O seu activo comparado com o seu passivo é zero.
É mais rápida do que o homem; é mais intensiva do que o homem. Mas está muito longe a perfeição da sua obra comparada com a perfeição da obra humana. Não há perfeição mecânica que chegue aos pés da perfeição dos dedos do homem.
A máquina é cega e inconsciente; os dedos do homem vêem e são responsáveis.
Não sei onde vai parar o mundo com esta maquinização progressiva. Não haver travão decisivo que lhe barre o caminho, e nos faça regressar à utilização do homem!
A máquina é o grande verme destruidor da sociedade. Galga distâncias infinitas. Para quê? Ela não existia e nem por isso deixaram de se erguer no mundo as civilizações incomparáveis do Oriente e as do Ocidente, criando o que nunca a civilização da máquina será capaz de criar.
Antes da máquina, o homem era modesto e comedido nas suas aspirações; não ultrapassava o humano.
Hoje, vítima da máquina, quer invadir o divino, e descobrir o segredo do peixe, e descobrir o segredo da ave. E seria ridículo apenas, se não fosse quase sempre trágico.
Eu amo a Terra. Ela foi, através da nossa história, o grande recurso da nossa existência colectiva. Vejo-a sacrificada e abandonada, sangrada e escarnecida...
Guimarães, Casa da Madre de Deus.
Alfredo Pimenta
(In A Voz, n.º 4458, págs. 1/2, 26.07.1939)
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Pela primeira vez, ao passar em Coimbra, voltei a cara para a não ver, porque pela primeira vez me senti algemado a fortes saudades dos meus vinte e cinco anos — quando dali parti, cheio de saúde, de energia, de audácia para enfrentar a vida que se me abria cheia de lutas, de perigos, traições e calvários...
E hoje, vejo, no horizonte, os mesmos calvários, as mesmas traições, os mesmos perigos, as mesmas lutas, mas eu não sou mais do que o velho gladiador de músculos lassos, olhar quebrado, e fé abalada...
Por alturas de Espinho, começa a chover. Recordo certos versos tristes de Verlaine, e à medida que o rápido avança, mais densa é a chuva.
E ao entrarmos em Campanhã, caía a potes. O trasbordo na Trofa é difícil — debaixo de água. Não sei porque é que ainda não ocorreu a quem tem de olhar por estas coisas, mandar fazer um alpendre no cais que fica entre a linha do Minho e Douro e a linha da Companhia do Norte.
O Manuel do Conde foi-me buscar à Trofa. Tomamos pela estrada de Famalicão.
Os vinhedos estão florescentes. Os milhos estão famosos. Ano de vinho e ano de pão. Ano dos pobres, e é quanto faz minga. Por alturas de Ronfe, vejo a Penha fechada em nuvens. Chove.
Porquê tanta chuva neste dia, santo Deus?
O coração distante, o pensamento distante, todo eu distante, entro, pela primeira vez, no sanatório da minha alma, sem alegria, sem prazer e sem interesse. Oiço as velhas oliveiras que, a agitar-se as suas folhas esguias, me perguntam que tal venho; sinto os choupos amigos que fazem barreira carinhosa para que o Sol me não invada o jardinzinho, saudar-me; noto as boas vindas da hera que me cobre as paredes da casa: faz-me estremecer o gorgolejar da fonte cheia de água a cair no tanque largo cheio de água.
Os livros da Livraria da Mumadona, como os meus amigos chamam à minha livrariazinha da Madre de Deus; as flores que poisam nas mesas; as coisas da casa — tudo me dá boas-vindas afáveis e carinhosas.
Mas o coração está longe, o pensamento está longe, todo eu estou longe, numa distância imprecisa, mergulhada em neblinas — ante-câmara dum destino que não sei definir, feito de pontos de interrogação que não sei decifrar.
Tudo isto está pouco mais ou menos na mesma. A ramada mais coberta promete. O limoeiro novo que há quatro anos foi enxertado tem seis limões, grandes, magníficos, — os primeiros limões que dá, decidido pelo visto a substituir, com vantagem o velho limoeiro de cem anos que junto da casa do caseiro, é o nosso enlevo, como foi o enlevo dos antepassados.
Na parte mais alta da terra, onde a água da rega não chega, o milho está atrevido. Ano molhado — cantam as águas das fontes, deliram as terras secas.
O frio queimou o centeio. Mas deve haver milho em abundância, mesmo com o desconto da acção da bicha que, nas terras fundas, sem possibilidades de escoamento, se fica a devorar as raízes do milho.
E já a Luísa do Carregal a queixar-se: «a bicha comeu muito, mas há-de ser o que o Senhor quiser...».
No pinheiral, os pinheiros novos estão bonitos; altos, a engrossar, as suas coroas de perfil gótico, que lindas estão! Como eu gostaria de trazer luz no pensamento, e sossego no coração, para os contemplar com mais vagar!
Verdadeiramente de novo aqui pelos sítios, a crise do trabalho. As fábricas estão a meia ração. De sorte que este mulherio e este rapazio que trocaram a lavoura e as indústrias domésticas pela fábrica, ou trabalham só meio dia, ou trabalham só meia semana.
Pergunto a um industrial: «que é isto?». Ele responde: «não há quem compre».
Não sei onde isto se dirige. O industrial, em vez de desenvolver a sua indústria, em vez de empregar o seu capital no desenvolvimento da indústria que o enriqueceu, vai procurar a propriedade, e é na propriedade que emprega o capital.
A terra está a passar do lavrador que empobreceu nela, para as mãos do industrial, habituado à vida de escritório e da oficina.
Hoje não são os lavradores quem compra terras: são os industriais.
A par do lavrador que empobreceu na terra, há o proprietário que a herdou e a não ama. Também esse a larga, por se não poder aguentar. Que a terra é arisca. Quer amor, canseira, sacrifício e desvelo.
E eu não sei para onde caminhamos, nesta progressiva industrialização — que rouba braços à Lavoura, continuidade e firmeza à Família, fé às almas, disciplina aos sentimentos, saúde aos corpos.
A máquina é o grande verme destruidor da sociedade tradicional. É incomparável, é incalculável, é assombroso o mal que a máquina trouxe ao mundo.
O seu activo comparado com o seu passivo é zero.
É mais rápida do que o homem; é mais intensiva do que o homem. Mas está muito longe a perfeição da sua obra comparada com a perfeição da obra humana. Não há perfeição mecânica que chegue aos pés da perfeição dos dedos do homem.
A máquina é cega e inconsciente; os dedos do homem vêem e são responsáveis.
Não sei onde vai parar o mundo com esta maquinização progressiva. Não haver travão decisivo que lhe barre o caminho, e nos faça regressar à utilização do homem!
A máquina é o grande verme destruidor da sociedade. Galga distâncias infinitas. Para quê? Ela não existia e nem por isso deixaram de se erguer no mundo as civilizações incomparáveis do Oriente e as do Ocidente, criando o que nunca a civilização da máquina será capaz de criar.
Antes da máquina, o homem era modesto e comedido nas suas aspirações; não ultrapassava o humano.
Hoje, vítima da máquina, quer invadir o divino, e descobrir o segredo do peixe, e descobrir o segredo da ave. E seria ridículo apenas, se não fosse quase sempre trágico.
Eu amo a Terra. Ela foi, através da nossa história, o grande recurso da nossa existência colectiva. Vejo-a sacrificada e abandonada, sangrada e escarnecida...
Guimarães, Casa da Madre de Deus.
Alfredo Pimenta
(In A Voz, n.º 4458, págs. 1/2, 26.07.1939)
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sábado, outubro 22, 2005
Núcleos Regionais
Os nacionalistas devem associar-se, onde quer que estejam, de modo a superar o isolamento e a constituirem forças activas na política local: os blogues são um instrumento útil para a divulgação e a comunicação entre esses núcleos, e deles com a população em geral.
Por isso destaco a necessidade de cada um se esforçar por colaborar, auxiliar, divulgar, o blogue que se identifica com a sua terra e a sua região.
Realce para os exemplos da Margem Sul, Aveiro, Viseu, Braga, Portimão, Coimbra, Santarém, Lagoa, Olivais, Odivelas.
Evidentemente que o trabalho já feito é incipiente, é fraco, não representa de modo nenhum a sólida rede que gostaríamos de ver nascer como uma força decisiva na formação da opinião pública contemporânea.
Mas a verdade é que este caminho está no princípio; se nós tivermos o talento e a perseverança para fazer dos nossos blogues verdeiros marcos de referência a nível local, regional ou nacional, teremos nas nossas mãos um instrumento decisivo para o debate político contemporâneo.
Estes é que têm a seu cargo fazer cumprir o imperativo "agir localmente, pensar globalmente".
E para isso é indispensável que os responsáveis monitorizem devidamente as repercussões do seu blogue, entre os destinatários, observando atentamente as reacções destes para ter sempre ideia clara da adesão que o produto está ou não a ter. E encontrar as vias para atingir os alvos.
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Por isso destaco a necessidade de cada um se esforçar por colaborar, auxiliar, divulgar, o blogue que se identifica com a sua terra e a sua região.
Realce para os exemplos da Margem Sul, Aveiro, Viseu, Braga, Portimão, Coimbra, Santarém, Lagoa, Olivais, Odivelas.
Evidentemente que o trabalho já feito é incipiente, é fraco, não representa de modo nenhum a sólida rede que gostaríamos de ver nascer como uma força decisiva na formação da opinião pública contemporânea.
Mas a verdade é que este caminho está no princípio; se nós tivermos o talento e a perseverança para fazer dos nossos blogues verdeiros marcos de referência a nível local, regional ou nacional, teremos nas nossas mãos um instrumento decisivo para o debate político contemporâneo.
Estes é que têm a seu cargo fazer cumprir o imperativo "agir localmente, pensar globalmente".
E para isso é indispensável que os responsáveis monitorizem devidamente as repercussões do seu blogue, entre os destinatários, observando atentamente as reacções destes para ter sempre ideia clara da adesão que o produto está ou não a ter. E encontrar as vias para atingir os alvos.
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sexta-feira, outubro 21, 2005
Pour une stratégie de la séduction
O texto que se segue, sobre uma estratégia para o nosso tempo, é de Fabienne Pichard du Page e Georges Gondinet, e foi publicado em 1981 na revista evoliana "Totalité" ("Pour la Révolution culturelle européenne"). Uma boa leitura, hoje como ontem.
"Seule la lumière, qui jaillit de l'âme noble et loyale du héros, pourra dissiper les ténèbres dont l'infamie a obscurci le monde."»
Corneliu Z. Codreanu.
"C'est une vocation héroïque que d'affronter la vague la plus tourbillonnante et de savoir que deux destins sont à égale distance : le destin de ceux qui finiront avec la dissolution du monde moderne et le destin de ceux qui se retrouveront dans l'axe central et royal du nouveau courant."
Julius Evola.
Avec le présent numéro de Totalité et les difficultés de tous ordres qui l'ont précédé (problèmes financiers, répression politique, etc.), nous arrivons à l'heure de l'autocritique et de la révision de notre ligne générale.
Bien entendu, nous n'avons aucunement l'intention de céder à la mode ou de nous complaire dans une autoanalyse incapacitante. Non. Il s'agit, pour nous, de faire le point: il est temps de jeter un regard critique sur notre entreprise, sans goût suicidaire comme sans vaine satisfaction. Cette brève analyse autocritique ne doit pas nous paralyser dans nos ambitions, bien au contraire. Elle doit exclure tout sentiment de honte, de regret ou de remords : nous appartenons à ceux qui tournent délibérément leurs yeux vers l'avenir et qui voient dans les regrets le signe d'une volonté affaiblie.
Pour ceux qui, comme nous, ont opté pour une solution radicale (les magistrats du système diraient, pour nous criminaliser: «extrémiste») des questions que pose le monde moderne, la sclérose guette. Toute position alternative court le risque d'une sclérose : dans ses références, son passé (le nostalgisme); dans son action, le présent (le dogmatisme sectaire); dans ses ambitions, son avenir (l'utopisme).
Tout d'abord, il y a sclérose dans l'exaltation du passé. Nous confessons avoir un peu cédé à cette tentation : par dégoût pour cette époque de veulerie dans laquelle nous avons le déplaisir de vivre, par fascination peut-être un peu morbide pour les dernières et approximatives tentatives de restauration de l'idéal traditionnel - nous parlons des fascismes - en oubliant par conséquent que nous raisonnons pour notre temps et en commettant l'erreur de croire que tout était pour le mieux dans le meilleur des mondes fascistes. Extirpons de notre esprit cette «fuite en arrière». Procédons à l'historiographie sereine et lucide des mouvements d'avant guerre (nous mettons déjà à la disposition de nos lecteurs la brochure "Pour en finir avec le fascisme" et le livre d'Evola sur "Le fascisme vu de droite"). Les fascismes ont été des esquisses et les esquisses ont besoin de nombreuses retouches avant de devenir des oeuvres dignes de ce nom. Mais il y a aussi sclérose dans le mépris du présent. Attitude crédule, infantile que celle du refus du présent. Nos ennemis ne comptent-ils d'ailleurs pas sur notre retrait de la vie actuelle, sur notre automarginalisation qui confine le plus souvent à l'autodestruction? Dans certains cas, ils n'ont même pas eu à réprimer ou exclure: les individus concernés se sont d'eux-mêmes exclus, ont eux-mêmes réprimé leur volonté révolutionnaire. Or, si, dans son principe, nous refusons catégoriquement le monde moderne, nous n'en acceptons que plus la volonté de le transformer radicalement, de le remodeler, de le faire à notre image. Quelques-uns ont renoncé aux plus hautes ambitions révolutionnaires: cela importe peu; le drapeau compte plus que le porte-drapeau; la Vérité vaut plus que la bouche qui la prononce (en la déformant, le plus souvent). Parce que nous savons que nous ne pouvons plus cultiver en paix, dans ce monde des âmes damnées et des corps repus, notre jardin secret, nous lui déclarons une guerre totale, sur tous les plans. Marco Tarchi l'a bien vu: «On peut vivre contre l'esprit de son temps, en cherchant à le modifier; il n'est pas possible, pour celui qui veut agir dans un sens révolutionnaire en direction de ce changement, de vivre en dehors de son temps ou sans en tenir compte» (1). Il y a enfin sclérose dans l'absolutisation de l'avenir. Bien sûr, l'âge d'or, cycliquement, suit l'âge de fer. Mais il faut aussi le faire naître et ne pas se servir d'alibis «fatalistes» pour reporter à demain ce qu'il convient de réaliser aujourd'hui. On demande des forceps pour accoucher le meilleur monde du pire.
Cette autocritique prend tout son intérêt dans l'ouverture de nouveaux horizons, de perspectives inédites. Nous entendons désormais nous assigner une mission beaucoup plus ambitieuse que celle de publier, plus ou moins irrégulièrement, une revue révolutionnaire. Dans nos ambitions, nous ne voulons en aucune manière céder aux dangers multiples qu'encourent certains de nos voisins idéologiques (la «nouvelle droite», par exemple), mais «rendre bien visibles les valeurs de la vérité, de la réalité et de la Tradition à celui qui, de nos jours, ne veut pas «ceci» et cherche confusément «autre chose», ce qui veut dire «contribuer à ce que la grande tentation ne l'emporte pas chez tous, là où la matière semble être désormais plus forte que l'esprit» (Evola) (2).
Abordons les questions par ordre. La condition sine qua non de la conquête des esprits contemporains repose sur la formation d'une élite traditionnelle guerrière, militante, à la vocation héroïque. Sans ce pôle humain, aucune intervention culturelle ou sociale ne pourra recevoir sa vraie dimension, avoir sa juste portée; sans lui, les territoires conquis (et l'ennemi, de moins en moins confiant en lui-même, bat en retraite) risquent fort de se révéler stériles. II est donc fondamental et essentiel que «se constitue une élite, laquelle, en une intensité recueillie, définisse, selon une rigueur intellectuelle et une intransigeance absolue, l'idée en fonction de laquelle on a le devoir d'être unis» (Evola) (3). La formation de cette élite nous apparaît vraiment comme une nécessité absolue. Elle devrait permettre d'en finir une fois pour toutes avec les individualismes, les égoïsmes et les susceptibilités et autres tares d'un milieu profondément désespéré. Elle devrait aussi détourner ce vent de démission qui souffle dans nos rangs depuis quelques années. Que le chemin à parcourir soit dur, nous ne l'avons jamais caché; que les oasis soient rares dans le désert croissant du monde moderne, c'est une évidence. A chacun de se dépasser, de tuer en lui le médiocre, le conformiste, le craintif, de se dépouiller du vieil homme pour revêtir l'homme nouveau. Chacun doit pouvoir trouver une oasis intérieure par un travail constant sur le désert qui assèche en lui les plus hautes capacités. Le défaitisme, le découragement, le renoncement ne révèlent pas des âmes fortes, bien trempées, mais des caractères faibles, mous. Que ceux qui, peureusement, se replient dans leur tour d'ivoire se rappellent qu'aucune tour n'est imprenable et que la défensive est déjà une demi-défaite.
Insistons maintenant sur un point particulièrement important. Depuis trop longtemps, nous ne nous adressons qu'à nous-mêmes. Ou à des fantômes. Ou encore à de simples survivants. Il serait temps, pour nous qui vivons dans le monde des autres, de nous adresser aux autres. Aux êtres qui nous entourent et que nous côtoyons. Pour nous rajeunir, nous renouveler, revivifier la sève que nous portons. Par mauvaise habitude, nos yeux n'ont cessé de contempler notre nombril: qu'ils contemplent maintenant le monde alentour, en conservant le regard clair et «une sévère et claire adhésion à une idée» (Evola) (4)! Que cela reste bien compris: «En partant de ce qui peut encore subsister parmi les ruines, reconstruire lentement un homme nouveau pour l'animer au moyen d'un esprit déterminé et d'une vue adéquate de la vie, pour le fortifier au moyen d'une adhésion absolue à des principes donnés tel est le vrai problème» (5). Mais, pour constituer l'élite dont nous parlons, il est indispensable de trouver parmi ceux qui sont écrasés à terre par la pesanteur matérialiste quelques individus susceptibles de se relever, de se redresser et de nous emboîter le pas. Les hommes et les femmes du monde moderne dorment profondément. Dans leur majorité, ce sont des victimes qui ont été droguées, intoxiquées, envoûtées. Il faut les réveiller, leur parler, dans leur sommeil, d'une voix persuasive, de leur éveil. Alors, certains franchiront le seuil et reviendront à l'état de conscience. Les autres demeureront dans leur état comateux jusqu'à leur mort. Voilà pour la majorité de nos contemporains, benoîtement endormis. Mais il y a aussi ceux qui ont un sommeil agité et font des cauchemars - nous voulons parler des individus qui vivent dans le désarroi. Ceux-ci vivent dans l'angoisse, sentent que quelque chose ne va pas et posent des questions sans en découvrir les réponses. Contrairement aux autres, qui vivent dans l'inconscience, ceux-ci ressentent profondément le vide du monde moderne. Ces individualités en crise peuvent recevoir notre message. Mais nous ne pourrons les sortir de leur cauchemar que lorsque nous aurons totalement pris conscience de notre rôle, de notre mission. Précisons enfin que ceux qui distribuent sans vergogne des «somnifères» à une population déracinée devront un jour payer leurs crimes.
Nous n'insistons pas plus sur l'idée de la formation d'une élite (et sur son rôle). Ce sera l'objet de prochaines analyses. Nous réfléchissons sérieusement à la création des structures, de l'organisation qui permettraient de constituer cette élite. Pour éviter toute équivoque, soulignons encore qu' «il n'a rien appris des leçons du passé récent, celui qui s'illusionne, aujourd'hui, à propos des possibilités d'une lutte purement politique et à propos du pouvoir de telle ou telle formule, voire de tel ou tel système, auxquels ne feraient point contrepartie une nouvelle qualité humaine» (Evola) (6).
Pour rassembler les hommes de grande volonté et pour nous ouvrir efficacement au monde des autres, il faut que nous adoptions une stratégie de la séduction. Repoussons toute méprise: par «séduction», nous n'entendons pas désigner une prostitution des idées qui nous appartiennent. mais leur donner une efficience, une «consistance». Que seraient les principes s'ils ne s'incarnaient pas? Des principes. Mais nous qui ne sommes pas des principes mais des êtres vivants, nous devons les rendre manifestes. Ceci dit, le mot «séduction» recouvre à la fois notre désir profond de nous adresser aux autres, de les interpeller vivement (et il prend, dans ce cas, le sens d' «attrait», séduire signifiant ainsi plaire) et notre volonté de ne rien céder sur l'essentiel, de rester fidèles aux principes traditionnels qui nous animent (le verbe séduire retrouve alors son sens étymologique, seducere voulant dire, en latin, emmener à part, conduire à l'écart, séparer, diviser, partager). La stratégie de la séduction que nous proposons nous permettrait de déchirer le masque hideux que les marxistes et les libéraux nous imposent et nous serions en mesure de plaire, de gagner à nous des êtres nouveaux, vierges d'empreinte ou récupérables (prioritairement, la jeunesse). En les attirant à nous, en les menant à l'écart, nous les ferons ainsi rompre avec l'ensorcellement moderne, nous les délivrerons de l'emprise qu'exerce sur eux la société de consommation. Plus que jamais nous devons nous présenter comme des séducteurs et des éducateurs. Ne sommes-nous pas les seuls à posséder les clefs de l'avenir? Mais nos mains sont encore malhabiles et les serrures du destin encore trop inaccessibles.
Impérativement, nous devons trouver de nouveaux thèmes, découvrir des champs d'intervention inexplorés, diversifier notre discours. Puisque nous contestons le monde moderne dans son ensemble, nous devons avoir une solution de remplacement pour tout. Analysons les caractéristiques du monde environnant et prenons fermement appui sur elles pour notre action traditionaliste-révolutionnaire. Occupons les «continents» de la pensée moderne en y plantant notre drapeau. Substituons nos couleurs vives et chatoyantes à celles, défraîchies, des intellectuels de gauche. Prêtons attention aux intérêts majeurs de l'homme d'aujourd'hui (non parce qu'ils ont une réelle valeur (le contraire serait plus exact), mais parce qu'en lui tenant un langage différent dans les domaines qui le touchent, nous le choquons et l'inquiétons bien plus qu'en l'interpellant de loin. Faisons l'effort de descendre dans la vallée, nous qui connaissons la beauté de la montagne. Nous vivons dans une société «éclatée»: travaillons, polissons à notre manière chacun de ses «éclats». L'alternative que nous proposons est à ce prix: au prix de la diversification de nos interventions. Nous sommes mieux placés que les sectateurs de tous genres pour diffuser un message spirituel; mieux placés que les sociologues pour faire partager le sens de la communauté; mieux placés que les journalistes pour faire entendre la voix du pays réel; mieux placés que les néo-rousseauistes pour parler d'écologie et de nature; mieux placés que les sexologues pour donner une valeur à la sexualité (7), etc. Tous ceux qui veulent participer à nos projets (lancement de nouvelles revues, édition, etc.) seront bien accueillis. Il leur suffit de contacter Totalité. Nous comptons, ces prochains mois, sur des manifestations de solidarité plus concrètes. Nous espérons aussi voir nos rangs s'étoffer. Encore une fois, le manque d'argent et d'hommes nous freine. Pourtant, l'avenir nous appartient. Nous ne l'avons pas volé.
1 - Marco Tarchi, Destra e modernità - Un dibattito aperto » Dissenso N°7
2 - Julius Evola, Révolte contre le monde moderne, éd. de l'Homme, 1972, p. 495.
3 - J. Evola, Orientations, éd. Arktos, 1980, p. 24. Opuscule diffusé par Totalité (v.
service libraire).
4 - Id., p. 4.
5 - Id., p. 3.
6 - Ibid
7 - La revue Rebis remplit cette fonction. Etant donné l'importance que revêt la sexualité dans le monde moderne, il nous a semblé indispensable d'analyser les comportements érotiques et les moeurs de nos contemporains à la lumière des principes traditionnels. Rebis entend redéfinir les caractéristiques de la virilité et de la féminité, redonner à l'homme et à la femme leur juste rôle et reproposer entre eux une relation complémentaire et non antagonique. Rebis est parvenu à son quatrième numéro et les commentaires sont déjà nombreux (cf. l'article de Marco Tarchi. « Senza falsi pudori », Linea n° 42 et les recensions parues à la suite de la publication du n° 4 dans Elément n° 38, Heliodromos n° 12, Soltitium n° 3-4, année V).
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"Seule la lumière, qui jaillit de l'âme noble et loyale du héros, pourra dissiper les ténèbres dont l'infamie a obscurci le monde."»
Corneliu Z. Codreanu.
"C'est une vocation héroïque que d'affronter la vague la plus tourbillonnante et de savoir que deux destins sont à égale distance : le destin de ceux qui finiront avec la dissolution du monde moderne et le destin de ceux qui se retrouveront dans l'axe central et royal du nouveau courant."
Julius Evola.
Avec le présent numéro de Totalité et les difficultés de tous ordres qui l'ont précédé (problèmes financiers, répression politique, etc.), nous arrivons à l'heure de l'autocritique et de la révision de notre ligne générale.
Bien entendu, nous n'avons aucunement l'intention de céder à la mode ou de nous complaire dans une autoanalyse incapacitante. Non. Il s'agit, pour nous, de faire le point: il est temps de jeter un regard critique sur notre entreprise, sans goût suicidaire comme sans vaine satisfaction. Cette brève analyse autocritique ne doit pas nous paralyser dans nos ambitions, bien au contraire. Elle doit exclure tout sentiment de honte, de regret ou de remords : nous appartenons à ceux qui tournent délibérément leurs yeux vers l'avenir et qui voient dans les regrets le signe d'une volonté affaiblie.
Pour ceux qui, comme nous, ont opté pour une solution radicale (les magistrats du système diraient, pour nous criminaliser: «extrémiste») des questions que pose le monde moderne, la sclérose guette. Toute position alternative court le risque d'une sclérose : dans ses références, son passé (le nostalgisme); dans son action, le présent (le dogmatisme sectaire); dans ses ambitions, son avenir (l'utopisme).
Tout d'abord, il y a sclérose dans l'exaltation du passé. Nous confessons avoir un peu cédé à cette tentation : par dégoût pour cette époque de veulerie dans laquelle nous avons le déplaisir de vivre, par fascination peut-être un peu morbide pour les dernières et approximatives tentatives de restauration de l'idéal traditionnel - nous parlons des fascismes - en oubliant par conséquent que nous raisonnons pour notre temps et en commettant l'erreur de croire que tout était pour le mieux dans le meilleur des mondes fascistes. Extirpons de notre esprit cette «fuite en arrière». Procédons à l'historiographie sereine et lucide des mouvements d'avant guerre (nous mettons déjà à la disposition de nos lecteurs la brochure "Pour en finir avec le fascisme" et le livre d'Evola sur "Le fascisme vu de droite"). Les fascismes ont été des esquisses et les esquisses ont besoin de nombreuses retouches avant de devenir des oeuvres dignes de ce nom. Mais il y a aussi sclérose dans le mépris du présent. Attitude crédule, infantile que celle du refus du présent. Nos ennemis ne comptent-ils d'ailleurs pas sur notre retrait de la vie actuelle, sur notre automarginalisation qui confine le plus souvent à l'autodestruction? Dans certains cas, ils n'ont même pas eu à réprimer ou exclure: les individus concernés se sont d'eux-mêmes exclus, ont eux-mêmes réprimé leur volonté révolutionnaire. Or, si, dans son principe, nous refusons catégoriquement le monde moderne, nous n'en acceptons que plus la volonté de le transformer radicalement, de le remodeler, de le faire à notre image. Quelques-uns ont renoncé aux plus hautes ambitions révolutionnaires: cela importe peu; le drapeau compte plus que le porte-drapeau; la Vérité vaut plus que la bouche qui la prononce (en la déformant, le plus souvent). Parce que nous savons que nous ne pouvons plus cultiver en paix, dans ce monde des âmes damnées et des corps repus, notre jardin secret, nous lui déclarons une guerre totale, sur tous les plans. Marco Tarchi l'a bien vu: «On peut vivre contre l'esprit de son temps, en cherchant à le modifier; il n'est pas possible, pour celui qui veut agir dans un sens révolutionnaire en direction de ce changement, de vivre en dehors de son temps ou sans en tenir compte» (1). Il y a enfin sclérose dans l'absolutisation de l'avenir. Bien sûr, l'âge d'or, cycliquement, suit l'âge de fer. Mais il faut aussi le faire naître et ne pas se servir d'alibis «fatalistes» pour reporter à demain ce qu'il convient de réaliser aujourd'hui. On demande des forceps pour accoucher le meilleur monde du pire.
Cette autocritique prend tout son intérêt dans l'ouverture de nouveaux horizons, de perspectives inédites. Nous entendons désormais nous assigner une mission beaucoup plus ambitieuse que celle de publier, plus ou moins irrégulièrement, une revue révolutionnaire. Dans nos ambitions, nous ne voulons en aucune manière céder aux dangers multiples qu'encourent certains de nos voisins idéologiques (la «nouvelle droite», par exemple), mais «rendre bien visibles les valeurs de la vérité, de la réalité et de la Tradition à celui qui, de nos jours, ne veut pas «ceci» et cherche confusément «autre chose», ce qui veut dire «contribuer à ce que la grande tentation ne l'emporte pas chez tous, là où la matière semble être désormais plus forte que l'esprit» (Evola) (2).
Abordons les questions par ordre. La condition sine qua non de la conquête des esprits contemporains repose sur la formation d'une élite traditionnelle guerrière, militante, à la vocation héroïque. Sans ce pôle humain, aucune intervention culturelle ou sociale ne pourra recevoir sa vraie dimension, avoir sa juste portée; sans lui, les territoires conquis (et l'ennemi, de moins en moins confiant en lui-même, bat en retraite) risquent fort de se révéler stériles. II est donc fondamental et essentiel que «se constitue une élite, laquelle, en une intensité recueillie, définisse, selon une rigueur intellectuelle et une intransigeance absolue, l'idée en fonction de laquelle on a le devoir d'être unis» (Evola) (3). La formation de cette élite nous apparaît vraiment comme une nécessité absolue. Elle devrait permettre d'en finir une fois pour toutes avec les individualismes, les égoïsmes et les susceptibilités et autres tares d'un milieu profondément désespéré. Elle devrait aussi détourner ce vent de démission qui souffle dans nos rangs depuis quelques années. Que le chemin à parcourir soit dur, nous ne l'avons jamais caché; que les oasis soient rares dans le désert croissant du monde moderne, c'est une évidence. A chacun de se dépasser, de tuer en lui le médiocre, le conformiste, le craintif, de se dépouiller du vieil homme pour revêtir l'homme nouveau. Chacun doit pouvoir trouver une oasis intérieure par un travail constant sur le désert qui assèche en lui les plus hautes capacités. Le défaitisme, le découragement, le renoncement ne révèlent pas des âmes fortes, bien trempées, mais des caractères faibles, mous. Que ceux qui, peureusement, se replient dans leur tour d'ivoire se rappellent qu'aucune tour n'est imprenable et que la défensive est déjà une demi-défaite.
Insistons maintenant sur un point particulièrement important. Depuis trop longtemps, nous ne nous adressons qu'à nous-mêmes. Ou à des fantômes. Ou encore à de simples survivants. Il serait temps, pour nous qui vivons dans le monde des autres, de nous adresser aux autres. Aux êtres qui nous entourent et que nous côtoyons. Pour nous rajeunir, nous renouveler, revivifier la sève que nous portons. Par mauvaise habitude, nos yeux n'ont cessé de contempler notre nombril: qu'ils contemplent maintenant le monde alentour, en conservant le regard clair et «une sévère et claire adhésion à une idée» (Evola) (4)! Que cela reste bien compris: «En partant de ce qui peut encore subsister parmi les ruines, reconstruire lentement un homme nouveau pour l'animer au moyen d'un esprit déterminé et d'une vue adéquate de la vie, pour le fortifier au moyen d'une adhésion absolue à des principes donnés tel est le vrai problème» (5). Mais, pour constituer l'élite dont nous parlons, il est indispensable de trouver parmi ceux qui sont écrasés à terre par la pesanteur matérialiste quelques individus susceptibles de se relever, de se redresser et de nous emboîter le pas. Les hommes et les femmes du monde moderne dorment profondément. Dans leur majorité, ce sont des victimes qui ont été droguées, intoxiquées, envoûtées. Il faut les réveiller, leur parler, dans leur sommeil, d'une voix persuasive, de leur éveil. Alors, certains franchiront le seuil et reviendront à l'état de conscience. Les autres demeureront dans leur état comateux jusqu'à leur mort. Voilà pour la majorité de nos contemporains, benoîtement endormis. Mais il y a aussi ceux qui ont un sommeil agité et font des cauchemars - nous voulons parler des individus qui vivent dans le désarroi. Ceux-ci vivent dans l'angoisse, sentent que quelque chose ne va pas et posent des questions sans en découvrir les réponses. Contrairement aux autres, qui vivent dans l'inconscience, ceux-ci ressentent profondément le vide du monde moderne. Ces individualités en crise peuvent recevoir notre message. Mais nous ne pourrons les sortir de leur cauchemar que lorsque nous aurons totalement pris conscience de notre rôle, de notre mission. Précisons enfin que ceux qui distribuent sans vergogne des «somnifères» à une population déracinée devront un jour payer leurs crimes.
Nous n'insistons pas plus sur l'idée de la formation d'une élite (et sur son rôle). Ce sera l'objet de prochaines analyses. Nous réfléchissons sérieusement à la création des structures, de l'organisation qui permettraient de constituer cette élite. Pour éviter toute équivoque, soulignons encore qu' «il n'a rien appris des leçons du passé récent, celui qui s'illusionne, aujourd'hui, à propos des possibilités d'une lutte purement politique et à propos du pouvoir de telle ou telle formule, voire de tel ou tel système, auxquels ne feraient point contrepartie une nouvelle qualité humaine» (Evola) (6).
Pour rassembler les hommes de grande volonté et pour nous ouvrir efficacement au monde des autres, il faut que nous adoptions une stratégie de la séduction. Repoussons toute méprise: par «séduction», nous n'entendons pas désigner une prostitution des idées qui nous appartiennent. mais leur donner une efficience, une «consistance». Que seraient les principes s'ils ne s'incarnaient pas? Des principes. Mais nous qui ne sommes pas des principes mais des êtres vivants, nous devons les rendre manifestes. Ceci dit, le mot «séduction» recouvre à la fois notre désir profond de nous adresser aux autres, de les interpeller vivement (et il prend, dans ce cas, le sens d' «attrait», séduire signifiant ainsi plaire) et notre volonté de ne rien céder sur l'essentiel, de rester fidèles aux principes traditionnels qui nous animent (le verbe séduire retrouve alors son sens étymologique, seducere voulant dire, en latin, emmener à part, conduire à l'écart, séparer, diviser, partager). La stratégie de la séduction que nous proposons nous permettrait de déchirer le masque hideux que les marxistes et les libéraux nous imposent et nous serions en mesure de plaire, de gagner à nous des êtres nouveaux, vierges d'empreinte ou récupérables (prioritairement, la jeunesse). En les attirant à nous, en les menant à l'écart, nous les ferons ainsi rompre avec l'ensorcellement moderne, nous les délivrerons de l'emprise qu'exerce sur eux la société de consommation. Plus que jamais nous devons nous présenter comme des séducteurs et des éducateurs. Ne sommes-nous pas les seuls à posséder les clefs de l'avenir? Mais nos mains sont encore malhabiles et les serrures du destin encore trop inaccessibles.
Impérativement, nous devons trouver de nouveaux thèmes, découvrir des champs d'intervention inexplorés, diversifier notre discours. Puisque nous contestons le monde moderne dans son ensemble, nous devons avoir une solution de remplacement pour tout. Analysons les caractéristiques du monde environnant et prenons fermement appui sur elles pour notre action traditionaliste-révolutionnaire. Occupons les «continents» de la pensée moderne en y plantant notre drapeau. Substituons nos couleurs vives et chatoyantes à celles, défraîchies, des intellectuels de gauche. Prêtons attention aux intérêts majeurs de l'homme d'aujourd'hui (non parce qu'ils ont une réelle valeur (le contraire serait plus exact), mais parce qu'en lui tenant un langage différent dans les domaines qui le touchent, nous le choquons et l'inquiétons bien plus qu'en l'interpellant de loin. Faisons l'effort de descendre dans la vallée, nous qui connaissons la beauté de la montagne. Nous vivons dans une société «éclatée»: travaillons, polissons à notre manière chacun de ses «éclats». L'alternative que nous proposons est à ce prix: au prix de la diversification de nos interventions. Nous sommes mieux placés que les sectateurs de tous genres pour diffuser un message spirituel; mieux placés que les sociologues pour faire partager le sens de la communauté; mieux placés que les journalistes pour faire entendre la voix du pays réel; mieux placés que les néo-rousseauistes pour parler d'écologie et de nature; mieux placés que les sexologues pour donner une valeur à la sexualité (7), etc. Tous ceux qui veulent participer à nos projets (lancement de nouvelles revues, édition, etc.) seront bien accueillis. Il leur suffit de contacter Totalité. Nous comptons, ces prochains mois, sur des manifestations de solidarité plus concrètes. Nous espérons aussi voir nos rangs s'étoffer. Encore une fois, le manque d'argent et d'hommes nous freine. Pourtant, l'avenir nous appartient. Nous ne l'avons pas volé.
1 - Marco Tarchi, Destra e modernità - Un dibattito aperto » Dissenso N°7
2 - Julius Evola, Révolte contre le monde moderne, éd. de l'Homme, 1972, p. 495.
3 - J. Evola, Orientations, éd. Arktos, 1980, p. 24. Opuscule diffusé par Totalité (v.
service libraire).
4 - Id., p. 4.
5 - Id., p. 3.
6 - Ibid
7 - La revue Rebis remplit cette fonction. Etant donné l'importance que revêt la sexualité dans le monde moderne, il nous a semblé indispensable d'analyser les comportements érotiques et les moeurs de nos contemporains à la lumière des principes traditionnels. Rebis entend redéfinir les caractéristiques de la virilité et de la féminité, redonner à l'homme et à la femme leur juste rôle et reproposer entre eux une relation complémentaire et non antagonique. Rebis est parvenu à son quatrième numéro et les commentaires sont déjà nombreux (cf. l'article de Marco Tarchi. « Senza falsi pudori », Linea n° 42 et les recensions parues à la suite de la publication du n° 4 dans Elément n° 38, Heliodromos n° 12, Soltitium n° 3-4, année V).
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Próximos eventos
Para todos os nacionalistas que sentem a necessidade de actuar nas respectivas áreas (pensar globalmente, agir localmente...) informamos que estão programados para os próximos tempos o encontro em Braga (29 de Outubro) e a conferência em Lisboa (19 de Novembro), que já aqui foram anunciados, e também reunião em Coimbra, no dia 12 de Novembro (consultar o Coimbra Nacional).
Portanto, iniciativas importantes nos três sábados referidos.
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Portanto, iniciativas importantes nos três sábados referidos.
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Sobre Cavaco
Sobre o vazio do candidato Cavaco Silva, ler o comentário do Aliança Nacional.
Onde se conclui que o candidato pode ganhar facilmente, mas inutilmente.
Ser presidente, sem que alguém possa dizer para que serviu isso. Nem o próprio.
Suspeito que o homem é realmente pequenino...
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Onde se conclui que o candidato pode ganhar facilmente, mas inutilmente.
Ser presidente, sem que alguém possa dizer para que serviu isso. Nem o próprio.
Suspeito que o homem é realmente pequenino...
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quinta-feira, outubro 20, 2005
Estou a ler
Sucessivamente:
Passos para Deus
Insolência escandalosa
Está muito enganado, Dr. Almeida Santos
Depois pensarei em escrever alguma coisa.
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Passos para Deus
Insolência escandalosa
Está muito enganado, Dr. Almeida Santos
Depois pensarei em escrever alguma coisa.
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quarta-feira, outubro 19, 2005
Para pensar
"Je suis toujours très surpris par la force de conviction des convertis chrétiens à l’islam. Qu’est-ce qu’ils y trouvent? Une virilité et une sécurité qu’il n’y a plus dans le christianisme".
(Malek Chebel, in Le Point, de 22/09/2005)
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(Malek Chebel, in Le Point, de 22/09/2005)
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L’Homme nouveau dans l’Europe fasciste (1922-1945)
A todos os estudiosos, recomenda-se a obra colectiva "L’Homme nouveau dans l’Europe fasciste (1922-1945)", com direcção de Marie-Anne Batard-Bonucci e Pierre Milza (edição Fayard, Novembro 2004, 367 páginas, 22 euros).
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O valor da Nação
Sobre a valorização política da ideia nacional disserta hoje o Manuel Monteiro no "Expresso".
É essencial ler "A Nação".
Grande camarada!
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É essencial ler "A Nação".
Grande camarada!
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segunda-feira, outubro 17, 2005
Pensar globalmente, actual localmente
Ora aqui temos mais um importante texto de reflexão estratégia publicado no blogue INFOKRISIS, de Ernesto Milá.
Utilíssimo para todos os que querem agir em política, procurando os caminhos e evitando os becos sem saída.
Uma oportuna palavra de ordem, para meditar e prosseguir.
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Utilíssimo para todos os que querem agir em política, procurando os caminhos e evitando os becos sem saída.
Uma oportuna palavra de ordem, para meditar e prosseguir.
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domingo, outubro 16, 2005
Agenda nacional
No dia 29 de Outubro realiza-se um encontro de convívio nacionalista em Braga.
Notícias do acontecimento: junto do Braga Nacional, Miúdo de Olhos Abertos, e Forum Nacional.
Na agenda próxima, apontar também a conferência nacionalista a realizar no dia 19 de Novembro em Lisboa.
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Notícias do acontecimento: junto do Braga Nacional, Miúdo de Olhos Abertos, e Forum Nacional.
Na agenda próxima, apontar também a conferência nacionalista a realizar no dia 19 de Novembro em Lisboa.
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sexta-feira, outubro 14, 2005
LANÇAR ÂNCORA NA VIDA REAL
Em complemento ao postal anterior, determinado pelo Batalha Final, aqui fica um excerto de Maurice Bardèche, publicado em tempos no semanário "A Rua", com uma súmula de algumas preocupações permanentes do autor (não sei se já terei publicado aqui anteriormente a mesma passagem, mas ainda que repetição será oportuna).
O revezamento das gerações é inevitável. Conviria que ele fosse não só revezamento dos homens como, também, o do vocabulário e dos pontos de referência. A tradição a que estamos ligados é a da coragem, da lealdade, da fidelidade à palavra dada, da energia, da firmeza de carácter. O que estimamos e desejamos manter é, pois, uma certa imagem do homem. O que detestamos são as preocupações mercantis, a prioridade dada ao dinheiro pela nossa época, a estéril imagem puramente económica com que se nos apresenta a vida social, o anonimato e o tédio dos grandes formigueiros humanos, as nauseantes e vãs ideologias, as reivindicações mesquinhas e a pressão contínua e repugnante desta luta manhosa da existência colectiva. O que nós repudiamos é uma certa imagem da sociedade. A nossa escolha biológica é mais do que a defesa de uma raça; é muito mais vasta, é muito mais dramática. Sentimos profundamente a nossa condição animal, sentimo-nos profundamente mamíferos e obedecemos às leis não propriamente da nossa espécie mas do género a que pertencemos; estamos fundamente ligados a essas leis, queremos conservá-las; não queremos o formigueiro que nos constroem, não queremos a mutação para a colectividade de insectos superiores que o mundo moderno, colectivista ou liberal, nos prepara. Só desejamos regimes fortes pelo facto de eles imporem regras de salvação pública às forças de destruição e de escravização trazidas pelas modas científicas da produção; queremos que, para além da vida mecânica de escravos que nos reservam, por igual, a ideologia marxista e as normas da produção em série e em concorrência, haja um poder salvador, uma força suprema, que arbitre em favor da humanidade.
Estas perspectivas não são o resultado de uma meditação pessimista. Precisamente pelo contrário: é o facto de eu acreditar no futuro das ideias de que somos portadores que me leva a desejar que a sua apresentação se faça em termos de criar condições de diálogo. Saibamos aproveitar as lições do "blocus" eleitoral. E também dos modelos de que se servem os nossos adversários. “Conhecem o nosso programa?” - dizem os comunistas. E acrescentam: “Venham ver-nos. Nós conversaremos”. Procuremos, como eles fazem, as condições e o vocabulário da persuasão. Busquemos encarnar os interesses dos grupos sociais ameaçados ou incompreendidos; desenvolvamos ou criemos a solidariedade com o que existe; não sejamos mais apenas doutrinadores - porque a doutrina aborrece - nem nostálgicos - porque a nostalgia entorpece - mas procuremos lançar a âncora o mais possível na vida real, na vida local, na vida profissional, na vida sindical, para tecer desde já elos múltiplos e eficazes, pelos quais nos possamos tornar um dia a representação real de uma vaga de opinião pública.
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O revezamento das gerações é inevitável. Conviria que ele fosse não só revezamento dos homens como, também, o do vocabulário e dos pontos de referência. A tradição a que estamos ligados é a da coragem, da lealdade, da fidelidade à palavra dada, da energia, da firmeza de carácter. O que estimamos e desejamos manter é, pois, uma certa imagem do homem. O que detestamos são as preocupações mercantis, a prioridade dada ao dinheiro pela nossa época, a estéril imagem puramente económica com que se nos apresenta a vida social, o anonimato e o tédio dos grandes formigueiros humanos, as nauseantes e vãs ideologias, as reivindicações mesquinhas e a pressão contínua e repugnante desta luta manhosa da existência colectiva. O que nós repudiamos é uma certa imagem da sociedade. A nossa escolha biológica é mais do que a defesa de uma raça; é muito mais vasta, é muito mais dramática. Sentimos profundamente a nossa condição animal, sentimo-nos profundamente mamíferos e obedecemos às leis não propriamente da nossa espécie mas do género a que pertencemos; estamos fundamente ligados a essas leis, queremos conservá-las; não queremos o formigueiro que nos constroem, não queremos a mutação para a colectividade de insectos superiores que o mundo moderno, colectivista ou liberal, nos prepara. Só desejamos regimes fortes pelo facto de eles imporem regras de salvação pública às forças de destruição e de escravização trazidas pelas modas científicas da produção; queremos que, para além da vida mecânica de escravos que nos reservam, por igual, a ideologia marxista e as normas da produção em série e em concorrência, haja um poder salvador, uma força suprema, que arbitre em favor da humanidade.
Estas perspectivas não são o resultado de uma meditação pessimista. Precisamente pelo contrário: é o facto de eu acreditar no futuro das ideias de que somos portadores que me leva a desejar que a sua apresentação se faça em termos de criar condições de diálogo. Saibamos aproveitar as lições do "blocus" eleitoral. E também dos modelos de que se servem os nossos adversários. “Conhecem o nosso programa?” - dizem os comunistas. E acrescentam: “Venham ver-nos. Nós conversaremos”. Procuremos, como eles fazem, as condições e o vocabulário da persuasão. Busquemos encarnar os interesses dos grupos sociais ameaçados ou incompreendidos; desenvolvamos ou criemos a solidariedade com o que existe; não sejamos mais apenas doutrinadores - porque a doutrina aborrece - nem nostálgicos - porque a nostalgia entorpece - mas procuremos lançar a âncora o mais possível na vida real, na vida local, na vida profissional, na vida sindical, para tecer desde já elos múltiplos e eficazes, pelos quais nos possamos tornar um dia a representação real de uma vaga de opinião pública.
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A propósito de Maurice Bardèche
Surpreendeu-nos hoje o Batalha Final publicando um texto do grande escritor francês Maurice Bardèche, gentilmente endereçado ao autor deste incompreendido blogue.
Agradece-se muito a lembrança, sobretudo pelo gesto mas também por não conhecermos o artigo em causa, que apreciamos devidamente.
Como sabem os três ou quatro que seguem este blogue desde o seu aparecimento, Maurice Bardèche é um autor e uma personalidade muito estimadas cá na casa, e que se procurou divulgar desde o princípio.
Como exemplo, recorde-se que ficou aqui publicado o famoso "Inquérito sobre o fascismo" (primeira parte, segunda parte, terceira parte).
Para além do prestigiado director da "Défense de l'Occident", revista que fundou em 1952 e manteve até 1982, também aqui tem sido dado destaque ao seu famoso cunhado e companheiro de caminho, Robert Brasillach, e não há muito tempo não passou esquecido o falecimento de Suzanne Bardèche, sua esposa.
Estamos portanto como peixe na água. Acrescentamos hoje, motivados pelo destaque do Batalha Final, que o Camisanegra recolheu directamente as orientações de Bardèche, in illo tempore, em Lisboa, quando ele por cá andou. Não pode por isso deixar de sorrir ao deparar com leituras extravagantes do pensamento do velho mestre; ao lembrar a sua personalidade calma e afectuosa, que juntava a gentileza e o bom humor à firmeza das convicções e à tranquilidade da postura, acorre à memória de imediato a sua estranheza e a sua aversão perante o folclorismo balofo, o exibicionismo vazio de ideias, o fetichismo infantil (quer por fardas, hinos ou bandeiras como por pins, crachats, tatuagens e demais parafernália das tribos urbanas ou suburbanas) que tanto prejudicaram as tentativas políticas da Direita pensante na Europa em todo o período que se segue à Segunda Guerra Mundial e que se prolonga até aos nossos dias.
Não, Bardèche nunca apreciou nem apreciaria reducionismos e primarismos, nem nunca foi complacente com isso.
Vem-nos à memória certa ocasião na Rua Sampaio e Pina, em que o velho Bardèche, após ter ouvido com bonomia e paciência alguma rapaziada cuja actividade cerebral estava ao nível hormonal, perfeitamente identificável com impulsos e reacções dos instintos ou das tripas, observava com ironia e malícia: - "mas estes rapazes não gostam de política?!!"
Quem entendeu riu-se, e os visados não perceberam, como era de esperar.
Alguns dos conselhos de Bardèche ficaram então arquivados em entrevista ao semanário "A Rua", para além dos arquivos da memória de quem teve a possibilidade de com ele discutir pessoalmente as linhas com que se devia coser o nacionalismo, em Portugal e na Europa.
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Agradece-se muito a lembrança, sobretudo pelo gesto mas também por não conhecermos o artigo em causa, que apreciamos devidamente.
Como sabem os três ou quatro que seguem este blogue desde o seu aparecimento, Maurice Bardèche é um autor e uma personalidade muito estimadas cá na casa, e que se procurou divulgar desde o princípio.
Como exemplo, recorde-se que ficou aqui publicado o famoso "Inquérito sobre o fascismo" (primeira parte, segunda parte, terceira parte).
Para além do prestigiado director da "Défense de l'Occident", revista que fundou em 1952 e manteve até 1982, também aqui tem sido dado destaque ao seu famoso cunhado e companheiro de caminho, Robert Brasillach, e não há muito tempo não passou esquecido o falecimento de Suzanne Bardèche, sua esposa.
Estamos portanto como peixe na água. Acrescentamos hoje, motivados pelo destaque do Batalha Final, que o Camisanegra recolheu directamente as orientações de Bardèche, in illo tempore, em Lisboa, quando ele por cá andou. Não pode por isso deixar de sorrir ao deparar com leituras extravagantes do pensamento do velho mestre; ao lembrar a sua personalidade calma e afectuosa, que juntava a gentileza e o bom humor à firmeza das convicções e à tranquilidade da postura, acorre à memória de imediato a sua estranheza e a sua aversão perante o folclorismo balofo, o exibicionismo vazio de ideias, o fetichismo infantil (quer por fardas, hinos ou bandeiras como por pins, crachats, tatuagens e demais parafernália das tribos urbanas ou suburbanas) que tanto prejudicaram as tentativas políticas da Direita pensante na Europa em todo o período que se segue à Segunda Guerra Mundial e que se prolonga até aos nossos dias.
Não, Bardèche nunca apreciou nem apreciaria reducionismos e primarismos, nem nunca foi complacente com isso.
Vem-nos à memória certa ocasião na Rua Sampaio e Pina, em que o velho Bardèche, após ter ouvido com bonomia e paciência alguma rapaziada cuja actividade cerebral estava ao nível hormonal, perfeitamente identificável com impulsos e reacções dos instintos ou das tripas, observava com ironia e malícia: - "mas estes rapazes não gostam de política?!!"
Quem entendeu riu-se, e os visados não perceberam, como era de esperar.
Alguns dos conselhos de Bardèche ficaram então arquivados em entrevista ao semanário "A Rua", para além dos arquivos da memória de quem teve a possibilidade de com ele discutir pessoalmente as linhas com que se devia coser o nacionalismo, em Portugal e na Europa.
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quinta-feira, outubro 13, 2005
UMA CARTA PARA RAFAEL GARCIA SERRANO
(A pensar no Rafael Castela Santos, reproduzo uma interessante carta do Prof. Carlos Eduardo Soveral para Rafael Garcia Serrano, nesta quadra em que se torna a falar de literatura, até que o Nobel se esfume)
Bayona, 8 de Septiembre de 1986
Señor
Don Rafael Garcia Serrano
MADRID
Mi muy admirado Rafael:
Llevo años leyéndote y admirándote. Y meses para decírtelo. Ahora (hará más de una semana), tras leer tu magnífico "Los bisontes y la técnica", me he decidido por fin a ponerte estos renglones.
Me introduzco y me explico sin ambages - entre camaradas -. Soy el n.º 139 de las Mocedades Portuguesas, en las que he, entre muchas cosas, fundado el Centro Universitario de Lisboa, del que fue el primer Comandante, y de las que me cupo la representación junto de vosotros en la concentración de Flechas, el Octubre del 38 (Sevilla), y en la Escuela de Mandos del S.E.U. en La Magdalena (Santander), el Agosto del 40 (1). En ésta, mi amigo, y seguramente tuyo, José Miguel Guitarte me nombró, a título honorífico, Jefe de Falange de la casi en seguida extinta Milícia Universitaria. Guardo de él, con dedicatória, algunas publicaciones suyas y otrosí un tomo de Discursos frente al Parlamento de José António, Ediciones F.E. - Año de la Victoria. Ahí, en el Albergue de Santander, me hice josé-antoniano para toda la vida, con una Fidelidad que nunca se marchitó, no obstante mi pura vinculación monárquica y tradicionalista. Advierte: pura (en Portugués, decimos lídima - por legítima): ya sabes: «Dios! que buen vasallo si...!» Cidiano, en efecto, o sea entre todos los fuegos, concretamente la romba espada marxista y la fria, glacial pared de la indiferencia burguesa. Como tu y, hoy dia,... pocos más. (...) Y allí, en la Magdalena, ha nacido mi inteligencia-amor de España - mi verdadera patria intelectual -, en la que he sido Lector de Portugués a lo largo de casi nueve años, sucesivamente en las Universidades de Salamanca, Barcelona y Santiago.
Habiendo recebido de Salazar, a mediados del 61 (y ello tras años de una por mi asumida publica y notoria inconformidad con una gobernación sin alas, de veras derecha-floja), la Subsecretaria de Estado de la Educación Nacional, con la misión de afrontar, al parecer, los problemas de la juventud portuguesa en el comienzo de nuestra guerra ultramarina, fundé (refundé) la Facultad de Filosofia y Letras de la Universidad de Oporto, en la que, sobre haber dejado la gobernación, fue profesor de diversas asignaturas (todas en el cruce de la Filosofia, la Historia y la Filologia latu sensu), para irme, el 1968, a Mozambique, a echar los cimientos y ser el primer Director de la Facultad de Filosofia y Letras de Lorenzo Marques, con los dos Institutos, de Psicologia y Estudios Humanísticos, que de ella dependian. (...) Tuve mis tres hijos luchando - uno por cada teatro de guerra - en Angola, Guinea y Mozambique: la razón capital de mi marcha a África, puesto que no entendia mantenerme lejos de la Dificultad cruenta máxime cuando en ella se hallaban mis hijos y los hijos de los demás, y era yo uno de los muy contados que intransigentemente sostenian el imperativo del esfuerzo bélico-castrense y, con mis escritos e intervenciones de todo tipo, más empujaba hacia él. Acrece que asaz tenia el corazón en el continente negro, donde - precisamente en Angola - habia vivido dos intensísimos años (1949-50), por los que he pagado con una fuerte tuberculosis pulmonar que (sin llegar a tus paroxismos) me retuvo en el lecho cerca de otros dos (a eso llamaba yo «una beca, bajo la condición de gozármela acostado...»), leyendo, estudiando, cavilando, y sufriendo la honda nostalgia de cuanto queda allende el mar - ese sentimiento del que ha supremamente padecido toda una familia que va diacrónicamente de Cortés a Liautey, pasando por nuestros Mousinho y Couceiro, encarcelados estos en las mezquindades y atonias metropolitanas que a uno impusieron el suicidio y a otro la incesante persecución del hombre ímpar desde todas las seudoposturas políticas -. La nostalgia-dictamen de la existencia como permanente riesgo e itineración. Dentro y fuera. A lo Platón.
Con la entrega del espacio ultramarino portugués por sus mismas Fuerzas Armadas, expresamente respaldadas por una asquerosa, vilísima mayoria sedicente nacional, decidí (...) no volver jamás a mi país y fuíme a cumplir once años de exilio en Sudáfrica, donde forzoso me fue ejercer labores algo duras y humildes - según Dios Señor permitió -. Transcurridos tales años en Pretoria, elegí España y en ella Galicia y en ésta Bayona para acabar mis dias. Motivos principales: mi moral-visceral imposibilidad de respirar la mayoritaria atmósfera de mi país (2), mi acrisolado amor de España, la enfin proximidad de Oporto, donde tengo a mi hija mayor y cuatro de mis nietos, hijos suyos. No fuera esa proximidad y hubiera escogido, sin ninguna duda, lo que más me proporcionara las dos eses del fjord: Silencio y Soledad. - Estoy en Bayona hace exactamente un año.
Te conozco desde siempre, merced a entrañables amigos comunes. Tambien por ello te tuteo y me confieso cual si contigo hubiera comunicado toda la vida. Lo que sí es verdad puesto que te he leído y sigo leyendo a partir del garcilasiano "Eugenio" - el pulcro, el terso, el apolíneo, el heroico y paradigmático proclamador de la primavera - la proclamación él mismo -, el muerto que yo, al igual que tu, «hubiera querido ser». Claro que, con plena conformidad, me he leído tus últimas obras, entre las que destaco "La gran esperanza" y "V Centenario", que ambas, hojeándolas reiteradamente, recomiendo a diestro y a siniestro. Calando en tu motivación más profunda, te celebro a la vez como uno de los máximos escritores de lengua castellana (¡que lejos quedan de ti casi todos los galardonados de las Letras en nuestro ominoso presente!), y te incluyo en la egregia cohorte de aquellos que han tenido este siglo que soportar-agradecer (dime quién te no ama...) la monstruosa campaña de silencio por la que te codeas con Ernest Von Salomon, Ezra Pound, Papini, La Varende (el mayor escritor galo de siempre), Marc Chadourne, el mismo Carrel, el mismo Gilson, los portugueses Sardinha e Hipólito Raposo, amén de Maeztu, Pradera, Muñoz Seca, Vegas Latapié y multitud de otros que conocemos, olvidados o sepultados vivos en todos cuadrantes nacionales. Hoy por hoy, que poco se habla de Ortega y que, menos todavia, se le lee... Me asombra el indefectible frescor de tu pluma (o tu espiritú), la fluidez, la amenidad y los giros de ella, tus prontitud y poder de sintesis, la hermosura, a la postre, de lo que escribes, sea lo que sea (3). Y tal sin escamoteo de una hispánica crudeza que expresa al hombre de guerra, al emparejador de las Armas y las Letras que eres, y de una sarcástica fibra picaresca, asumida por razones de hierro y diamante (4). Páginas tienes - perfectas - a las que lo mejor de Quevedo no rebasa.
Remataré con decirte que me asombra-entusiasma (Dios en nosotros) tu Fidelidad. (No se me van de la memoria tus tres Hernando Hernandorena - quince, cuarenta y cinco, setenta años - del Tercio de Montejura...) - Caigo en la cuenta, en el momento este, de que me estoy repitiendo a mucho de lo que han producido un Waldo de Mier y un Vizcaíno Casas - dos casos admirables -, que ambos recalcan las grandezas éticas y estéticas que esplenden en tu obra, no omitiendo Vizcaíno Casas la detenida alusión a tu condición cidiana y al telón de olvido y silencio que «echan la izquierda marxista y la derecha necia», en procurado detrimento tuyo. Y hago mias las palabras de tu amigo: «nuestro entrañable Rafael».
Pués aqui me tienes en calidad de lector, admirador, camarada, afín. Guardando contigo algunas profundas similitudes - aquellas por las que a Federico Nietzsche le gustaba decir que se sonrien los dioses -. Un atisbo de eso en lo más periférico: también yo, además de haber visto y recordar a las películas que has visto y recuerdas a lo largo de tus libros (hitos o mojones de una dichosa y despierta juventud en la que lo americano y lo alemán, tan entre si contradictorios, se sumaban a nuestra medula ibérica y nuestro afán de servicio renovador de la Pátria), también yo cuento larguísimo tiempo añorando a Emilio Salgari - mi obligada, insistente lectura de los once a los catorce años - y deseando la presencia de su obra completa (5) (ahora en Italiano) en mis anaqueles, al lado de las de Fenimore Cooper, Conan Doyle (mayormente en lo que éste preferia: sus novelas históricas), Maurice Leblanc, Jack London y otrosí Julio Verne que, tal como a ti, siempre me ha hecho poca gracia - cientificista, soso, resentido y burgués, cuyos íntimos y menos confesables complejos se hallan, cuatro décadas ha, sometidos a la lupa psicoanalítica -. A Verne tan sólo hoy, calmado muy relativamente mi ritmo interior y mi interno-externa necesidad de lucha y peripecia, puedo leer y en cierto grado apreciar. Ya ves que nuestra afinidad electiva, cuál diria el nunca viejo Goethe, asimismo en este punto se confirma. Como no habria de gustarme imensamente tu artículo? (Que por cierto enseña un soberbio vigor conglutinante, señaladamente en aquel trozo donde aunas estupendamente a Proust, Villon y Jorge Manrique, con un procedimiento mental que me hace evocar a Gracián.)
Te pondré dentro de un par de dias, Dios mediante, una nota - la 83 - algo añadida, de mis "Tensiones antropológicas en la cultura europea" - conferencia con la que he contribuido para el ciclo Presencia de Juristas Portugueses en Madrid, organizado por la Real Academia de Jurisprudencia y Legislación el 1969 -. He sido invitado por Jordana de Pozas y Luís Legaz, a título de filósofo de la cultura y sociólogo del derecho. La nota, como luego verrás, tiene por objecto «los autores» (presuntos, se dice hoy con harto abuso...) «de una literatura para jóvenes».
Con cordialísimo abrazo, siempre arriba, tu
Carlos Eduardo de Soveral
Notas:
1 - A mis 66 años me gusta deveras recordar estas cosas.
2 - En la que no se siente en lo más mínimo la conciencia o una tan siquiera esfumada reminiscencia de que algo de maximamente trágico, negativo, destructor, acaeció a toda la Nación y su historia el 74...
3 – Es leer, pongamos por caso, las extraordinarias primeras páginas de tu tan amplio, fluyente y vivo, al nivel del título, "Cuando los dioses nacían en Extremadura". (Nota esta que añadimos en Junio de 2001.)
4 - Lo que dijo, cual seguramente recordarás, José Miguel Guitarte, con motivo de las muertes de Matias Montero y Alejandro Salazar - asesinado el primero por la espalda, cuando una tarde volvia a su casa, paseado el otro y hecho desaparecer sabe Dios como - .
5 - Sabrás que está ahora mismo saliendo en España uno que otro Sandokan, aunque rehecho y recortado o desfigurado cual pasa sin mudanza con Moby Dick - puede que la más ensayística novela de la literatura universal -. Y eso en colecciones para crios, demasiado crios.
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Bayona, 8 de Septiembre de 1986
Señor
Don Rafael Garcia Serrano
MADRID
Mi muy admirado Rafael:
Llevo años leyéndote y admirándote. Y meses para decírtelo. Ahora (hará más de una semana), tras leer tu magnífico "Los bisontes y la técnica", me he decidido por fin a ponerte estos renglones.
Me introduzco y me explico sin ambages - entre camaradas -. Soy el n.º 139 de las Mocedades Portuguesas, en las que he, entre muchas cosas, fundado el Centro Universitario de Lisboa, del que fue el primer Comandante, y de las que me cupo la representación junto de vosotros en la concentración de Flechas, el Octubre del 38 (Sevilla), y en la Escuela de Mandos del S.E.U. en La Magdalena (Santander), el Agosto del 40 (1). En ésta, mi amigo, y seguramente tuyo, José Miguel Guitarte me nombró, a título honorífico, Jefe de Falange de la casi en seguida extinta Milícia Universitaria. Guardo de él, con dedicatória, algunas publicaciones suyas y otrosí un tomo de Discursos frente al Parlamento de José António, Ediciones F.E. - Año de la Victoria. Ahí, en el Albergue de Santander, me hice josé-antoniano para toda la vida, con una Fidelidad que nunca se marchitó, no obstante mi pura vinculación monárquica y tradicionalista. Advierte: pura (en Portugués, decimos lídima - por legítima): ya sabes: «Dios! que buen vasallo si...!» Cidiano, en efecto, o sea entre todos los fuegos, concretamente la romba espada marxista y la fria, glacial pared de la indiferencia burguesa. Como tu y, hoy dia,... pocos más. (...) Y allí, en la Magdalena, ha nacido mi inteligencia-amor de España - mi verdadera patria intelectual -, en la que he sido Lector de Portugués a lo largo de casi nueve años, sucesivamente en las Universidades de Salamanca, Barcelona y Santiago.
Habiendo recebido de Salazar, a mediados del 61 (y ello tras años de una por mi asumida publica y notoria inconformidad con una gobernación sin alas, de veras derecha-floja), la Subsecretaria de Estado de la Educación Nacional, con la misión de afrontar, al parecer, los problemas de la juventud portuguesa en el comienzo de nuestra guerra ultramarina, fundé (refundé) la Facultad de Filosofia y Letras de la Universidad de Oporto, en la que, sobre haber dejado la gobernación, fue profesor de diversas asignaturas (todas en el cruce de la Filosofia, la Historia y la Filologia latu sensu), para irme, el 1968, a Mozambique, a echar los cimientos y ser el primer Director de la Facultad de Filosofia y Letras de Lorenzo Marques, con los dos Institutos, de Psicologia y Estudios Humanísticos, que de ella dependian. (...) Tuve mis tres hijos luchando - uno por cada teatro de guerra - en Angola, Guinea y Mozambique: la razón capital de mi marcha a África, puesto que no entendia mantenerme lejos de la Dificultad cruenta máxime cuando en ella se hallaban mis hijos y los hijos de los demás, y era yo uno de los muy contados que intransigentemente sostenian el imperativo del esfuerzo bélico-castrense y, con mis escritos e intervenciones de todo tipo, más empujaba hacia él. Acrece que asaz tenia el corazón en el continente negro, donde - precisamente en Angola - habia vivido dos intensísimos años (1949-50), por los que he pagado con una fuerte tuberculosis pulmonar que (sin llegar a tus paroxismos) me retuvo en el lecho cerca de otros dos (a eso llamaba yo «una beca, bajo la condición de gozármela acostado...»), leyendo, estudiando, cavilando, y sufriendo la honda nostalgia de cuanto queda allende el mar - ese sentimiento del que ha supremamente padecido toda una familia que va diacrónicamente de Cortés a Liautey, pasando por nuestros Mousinho y Couceiro, encarcelados estos en las mezquindades y atonias metropolitanas que a uno impusieron el suicidio y a otro la incesante persecución del hombre ímpar desde todas las seudoposturas políticas -. La nostalgia-dictamen de la existencia como permanente riesgo e itineración. Dentro y fuera. A lo Platón.
Con la entrega del espacio ultramarino portugués por sus mismas Fuerzas Armadas, expresamente respaldadas por una asquerosa, vilísima mayoria sedicente nacional, decidí (...) no volver jamás a mi país y fuíme a cumplir once años de exilio en Sudáfrica, donde forzoso me fue ejercer labores algo duras y humildes - según Dios Señor permitió -. Transcurridos tales años en Pretoria, elegí España y en ella Galicia y en ésta Bayona para acabar mis dias. Motivos principales: mi moral-visceral imposibilidad de respirar la mayoritaria atmósfera de mi país (2), mi acrisolado amor de España, la enfin proximidad de Oporto, donde tengo a mi hija mayor y cuatro de mis nietos, hijos suyos. No fuera esa proximidad y hubiera escogido, sin ninguna duda, lo que más me proporcionara las dos eses del fjord: Silencio y Soledad. - Estoy en Bayona hace exactamente un año.
Te conozco desde siempre, merced a entrañables amigos comunes. Tambien por ello te tuteo y me confieso cual si contigo hubiera comunicado toda la vida. Lo que sí es verdad puesto que te he leído y sigo leyendo a partir del garcilasiano "Eugenio" - el pulcro, el terso, el apolíneo, el heroico y paradigmático proclamador de la primavera - la proclamación él mismo -, el muerto que yo, al igual que tu, «hubiera querido ser». Claro que, con plena conformidad, me he leído tus últimas obras, entre las que destaco "La gran esperanza" y "V Centenario", que ambas, hojeándolas reiteradamente, recomiendo a diestro y a siniestro. Calando en tu motivación más profunda, te celebro a la vez como uno de los máximos escritores de lengua castellana (¡que lejos quedan de ti casi todos los galardonados de las Letras en nuestro ominoso presente!), y te incluyo en la egregia cohorte de aquellos que han tenido este siglo que soportar-agradecer (dime quién te no ama...) la monstruosa campaña de silencio por la que te codeas con Ernest Von Salomon, Ezra Pound, Papini, La Varende (el mayor escritor galo de siempre), Marc Chadourne, el mismo Carrel, el mismo Gilson, los portugueses Sardinha e Hipólito Raposo, amén de Maeztu, Pradera, Muñoz Seca, Vegas Latapié y multitud de otros que conocemos, olvidados o sepultados vivos en todos cuadrantes nacionales. Hoy por hoy, que poco se habla de Ortega y que, menos todavia, se le lee... Me asombra el indefectible frescor de tu pluma (o tu espiritú), la fluidez, la amenidad y los giros de ella, tus prontitud y poder de sintesis, la hermosura, a la postre, de lo que escribes, sea lo que sea (3). Y tal sin escamoteo de una hispánica crudeza que expresa al hombre de guerra, al emparejador de las Armas y las Letras que eres, y de una sarcástica fibra picaresca, asumida por razones de hierro y diamante (4). Páginas tienes - perfectas - a las que lo mejor de Quevedo no rebasa.
Remataré con decirte que me asombra-entusiasma (Dios en nosotros) tu Fidelidad. (No se me van de la memoria tus tres Hernando Hernandorena - quince, cuarenta y cinco, setenta años - del Tercio de Montejura...) - Caigo en la cuenta, en el momento este, de que me estoy repitiendo a mucho de lo que han producido un Waldo de Mier y un Vizcaíno Casas - dos casos admirables -, que ambos recalcan las grandezas éticas y estéticas que esplenden en tu obra, no omitiendo Vizcaíno Casas la detenida alusión a tu condición cidiana y al telón de olvido y silencio que «echan la izquierda marxista y la derecha necia», en procurado detrimento tuyo. Y hago mias las palabras de tu amigo: «nuestro entrañable Rafael».
Pués aqui me tienes en calidad de lector, admirador, camarada, afín. Guardando contigo algunas profundas similitudes - aquellas por las que a Federico Nietzsche le gustaba decir que se sonrien los dioses -. Un atisbo de eso en lo más periférico: también yo, además de haber visto y recordar a las películas que has visto y recuerdas a lo largo de tus libros (hitos o mojones de una dichosa y despierta juventud en la que lo americano y lo alemán, tan entre si contradictorios, se sumaban a nuestra medula ibérica y nuestro afán de servicio renovador de la Pátria), también yo cuento larguísimo tiempo añorando a Emilio Salgari - mi obligada, insistente lectura de los once a los catorce años - y deseando la presencia de su obra completa (5) (ahora en Italiano) en mis anaqueles, al lado de las de Fenimore Cooper, Conan Doyle (mayormente en lo que éste preferia: sus novelas históricas), Maurice Leblanc, Jack London y otrosí Julio Verne que, tal como a ti, siempre me ha hecho poca gracia - cientificista, soso, resentido y burgués, cuyos íntimos y menos confesables complejos se hallan, cuatro décadas ha, sometidos a la lupa psicoanalítica -. A Verne tan sólo hoy, calmado muy relativamente mi ritmo interior y mi interno-externa necesidad de lucha y peripecia, puedo leer y en cierto grado apreciar. Ya ves que nuestra afinidad electiva, cuál diria el nunca viejo Goethe, asimismo en este punto se confirma. Como no habria de gustarme imensamente tu artículo? (Que por cierto enseña un soberbio vigor conglutinante, señaladamente en aquel trozo donde aunas estupendamente a Proust, Villon y Jorge Manrique, con un procedimiento mental que me hace evocar a Gracián.)
Te pondré dentro de un par de dias, Dios mediante, una nota - la 83 - algo añadida, de mis "Tensiones antropológicas en la cultura europea" - conferencia con la que he contribuido para el ciclo Presencia de Juristas Portugueses en Madrid, organizado por la Real Academia de Jurisprudencia y Legislación el 1969 -. He sido invitado por Jordana de Pozas y Luís Legaz, a título de filósofo de la cultura y sociólogo del derecho. La nota, como luego verrás, tiene por objecto «los autores» (presuntos, se dice hoy con harto abuso...) «de una literatura para jóvenes».
Con cordialísimo abrazo, siempre arriba, tu
Carlos Eduardo de Soveral
Notas:
1 - A mis 66 años me gusta deveras recordar estas cosas.
2 - En la que no se siente en lo más mínimo la conciencia o una tan siquiera esfumada reminiscencia de que algo de maximamente trágico, negativo, destructor, acaeció a toda la Nación y su historia el 74...
3 – Es leer, pongamos por caso, las extraordinarias primeras páginas de tu tan amplio, fluyente y vivo, al nivel del título, "Cuando los dioses nacían en Extremadura". (Nota esta que añadimos en Junio de 2001.)
4 - Lo que dijo, cual seguramente recordarás, José Miguel Guitarte, con motivo de las muertes de Matias Montero y Alejandro Salazar - asesinado el primero por la espalda, cuando una tarde volvia a su casa, paseado el otro y hecho desaparecer sabe Dios como - .
5 - Sabrás que está ahora mismo saliendo en España uno que otro Sandokan, aunque rehecho y recortado o desfigurado cual pasa sin mudanza con Moby Dick - puede que la más ensayística novela de la literatura universal -. Y eso en colecciones para crios, demasiado crios.
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quarta-feira, outubro 12, 2005
ALFREDO PIMENTA DOUTRINADOR DE PORTUGALIDADE
(Soube do recente falecimento, na sua querida terra do Minho, do Dr. Júlio Evangelista. Por acaso do destino, pelos mesmos dias morreu Antunes Varela, com quem ele trabalhou em Lisboa partilhando muitos anos escritório de advogado e jurisconsulto. Para quem não conhecia as alturas do Verbo e o Pensamento do antigo Deputado da Nação, oferece-se hoje aqui um discurso por ele proferido numa famosa sessão portuense para homenagear Alfredo Pimenta, então falecido pouco tempo antes. Sirvam-se, se fazem favor).
I
Há escritores que nascem com um destino singular. Toda a gente fala deles, toda a gente se acha à altura de os discutir, toda a gente os critica, — nos mais pequenos pormenores, nas mais pequenas atitudes. São homens acerca dos quais há sempre uma opinião definida — boa ou má —, acerca dos quais ouvimos dizer coisas, desde o homem da rua ao estudioso, desde o ignorante ao erudito. Ouve-se deles o que há de mais díspar e contraditório, porque, em todas as bocas, o seu nome suscita sempre uma reacção. O certo, porém, é que, se formos a averiguar a fundo, se tentarmos saber os fundamentos de tais opiniões, se quisermos investigar honestamente, ficamos com a desoladora certeza de que muito poucos os leram, muito pouca gente conhece a sua obra. Raros se debruçaram sobre os seus livros e os meditaram. Raros tentaram penetrar no seu pensamento. Raros procuraram compreendê-los. E mais raros, ainda, quiseram saber das razões de muitas das suas atitudes, quantas vezes incompreensíveis à primeira vista!
Há, de facto, escritores e artistas com um destino singular. Possuem uma personalidade tão forte, uma obra tão rica, que se impõem ao espírito e à inteligência dos que sabem ler, e aí são acolhidos, respeitados, discutidos. Mas os que sabem ler são muito poucos. E vem depois a hoste enorme dos que fingem que sabem ler. Estes não se dão, sequer, ao trabalho de consultar os seus livros. Mas têm opiniões: as que escutaram nalguma conversa de café; as que leram em qualquer almanaque ou borda-d`água; as que viram escritas em qualquer história resumida da arte ou da literatura; mas, enfim, opiniões!
Assim nascem os lugares comuns, as ideias generalizadas, que muita gente aceita e de que faz dogmas, certezas, a maior parte das vezes sem qualquer fundamento real, sem nenhuma razão de ser.
Muito disto se passa com Alfredo Pimenta. Quase toda a gente, neste País, se acha no direito de ter opiniões acerca da sua obra e da sua pessoa. E no entanto, quase toda essa gente fala de cor.
Uns conhecem dele alguns artigos de jornal — pouco mais. E isso lhes basta... Outros vêem nele o polemista contundente, o caceteiro que esmagava o adversário com o poder de uma argumentação inabalável. E isso lhes basta. Outros, ainda, porque o escutaram nalguma conferência, sentem-se intimamente satisfeitos e dizem para consigo próprios que estão à altura de poderem discutir a personalidade de Alfredo Pimenta.
Poucos, porém, conhecem, ou tentaram conhecer, a sua vastíssima obra de esclarecimento político; muito poucos leram os seus trabalhos de historiografia; e quase nenhuns sentiram o admirável poeta de "O Livro da Minha Saudade" e de "O Livro das Quimeras".
É por isso que, numa sessão, como esta, de homenagem póstuma a Alfredo Pimenta, eu me sinto no dever de dizer aqui, diante de todos e antes de mais, que a melhor homenagem a prestar à sua memória, a que ele mais estimaria, a mais real e mais profícua, será precisamente a que, por um dever de consciência e por um imperativo da inteligência, cada um de nós fizer por si mesmo, — lendo a sua obra, meditando-a, compreendendo-a.
II
«Tu m`en demandes trop long. J`évolue, comme on dit. Par conséquent, je ne sais pas exactement ou j`en suis. Je sais très bien ce que je ne crois plus, je ne suis pas encore fixé sur ce que je dois croire.» Esta resposta de Jules Lemaître, quando lhe perguntaram o que era, afinal, em política, — se era realista ou se era bonapartista —, vem na "Enquête sur la Monarchie" de Charles Maurras. Um dia, um amigo, de visita a Alfredo Pimenta, abriu o exemplar da "Enquête" que estava sobre a secretária, e encontrou esta passagem sublinhada a lápis. Era em 1915. E, com a queda do Governo de Pimenta de Castro, frustraram-se as derradeiras esperanças dos que ainda poderiam acreditar na viabilidade da República.
Deu-se, durante o século passado e no começo deste, um equívoco de graves consequências. Tinha-se feito do Estado, na expressão de Oliveira Martins, uma agência de caminhos de ferro. Vivia-se de Saldanhadas e de Janeirinhas. Fazia-se política como quem faz ski, por uma encosta demasiado íngreme. Foi-se a moeda, foi-se a noção do respeito, foi-se o prestígio. E quando um hábil Ministro, que se chamou Barros Gomes, caiu, mas firme na defesa dos nossos direitos e dos nossos interesses de País colonial, cedendo apenas diante da força irresistível, em vez do respeito que lhe era devido, em vez das palavras de gratidão e apreço, a que tinha direito, que vemos nós? Vemos a populaça, debaixo das suas janelas, gritando vivas à Pátria, na intenção de, assim, o insultar, e vemos, ainda, preparar-se essa coisa incrível que dá pelo nome de 31 de Janeiro. Vemos a política degradada, perdida a noção das conveniências, e até da decência. Partidos que se degladiam, monárquicos que se insultam e difamam mutuamente. Nem o próprio Rei escapa. «Desde que me conheci» — escreve Alfredo Pimenta — «o menos que ouvi aos monárquicos chamarem-se uns aos outros, a começar no Rei e a terminar no mais sertanejo regedor, foi ladrões.» Isto é mais que sabido, mas é bom recordá-lo. De que servem estadistas de valor, se as instituições lhes tolhem os movimentos? Que poderia fazer um Rei extraordinário, como D. Carlos, se, por força do sistema, ele era apenas o quarto poder do Estado — um vago, teórico poder a que chamavam moderador? De que serviam, além do exemplo e demonstração de vitalidade, feitos gloriosos e heróicos, como os de Mouzinho e Paiva de Andrade, se a política os poderia desperdiçar em qualquer altura, e até por questiúnculas entre Braga e Guimarães — como quando, em Paris, discutíamos importantes problemas de limites e de esferas de influência na África?
Era assim o sistema que felizmente já não nos rege, de que Ramalho zombava, denunciando-lhe a nudez.
Tornara-se evidente que isto não servia. E diante deste espectáculo tristíssimo, temos de admitir que, a muitos espíritos, a República se apresentasse como uma solução desejável. A propaganda era intensa, servia-se de tudo — de discursos, de promessas, de calúnias. O regime caíra no descrédito. Muitos espíritos honestos — sobretudo entre os novos — aderiram ao movimento republicano, fundamentalmente por oposição à Monarquia e ao sistema que não tinha possibilidades de satisfazer aos mais instantes interesses do País. E eis o grande equívoco de que há pouco falei: é que se tomou por Monarquia uma coisa que o não era na realidade. É que se não soube olhar para trás, penetrar no espírito do passado, e tirar daí as lições necessárias. É que se tomou por Monarquia, a Monarquia liberal, embrião e prefácio de todas as repúblicas. Chega a ser paradoxal: eles eram anti-monárquicos — e é o caso de Alfredo Pimenta — porque eram anti-democráticos; eles eram anti-monárquicos, — muitos homens sérios desse tempo —, porque eram anti-liberais; eram contra a Monarquia, porque eram contra o parlamentarismo.
Onde estava o equívoco? No nome de Monarquia, dado a um regime que o não merecia verdadeiramente. Porque uma Monarquia de partidos e discursos da Coroa, uma Monarquia liberal, democrática e parlamentar, pode ser tudo o que quiserem, menos Monarquia. Eis o grave equívoco de que falei. Eles eram contra aquela Monarquia. Não viram, nesse momento, que a solução estava no Passado e no espírito das suas instituições. Não viram — muitos deles — que a satisfação dos seus anseios e dos seus ideais estava precisamente na Monarquia, mas na Monarquia verdadeira, na Monarquia Tradicional, — anti-democrática, porque o Poder vem de Deus; anti-liberal, porque orgânica; anti-parlamentar, porque anti-democrática. Não viram. E sinceramente, convictos, com o idealismo e o entusiasmo dos vinte anos, foram atrás da República, e serviram-na com lealdade, sempre de cara descoberta.
Em breve viria a desilusão. Se a Monarquia liberal era a desordem, a República era a anarquia. Se aquela era um equívoco, esta era uma mentira. E um espírito sério, honesto, não pode servir uma mentira. Foi este o caso de Alfredo Pimenta.
Je sais très bien ce que je ne crois plus. É a desilusão de um honrado lutador que, ao fim de batalhas e batalhas, ingratas e cruéis, vê a inutilidade de tanto esforço dispendido. É mais. É a amargura do soldado que, depois de inúmeros combates, vê tudo de repente iluminado por uma luz mais forte e verdadeira, e conclui, em plena luta, desesperadamente, que a causa porque tanto se bateu, com heroísmo e com fervor, não merecia o seu fervor, nem merecia o seu heroísmo.
Je sais très bien ce que je ne crois plus. Esta confissão é de um extraordinário dramatismo. É o desmoronar de ilusões e de ideais. É ter de concluir que era mentira aquilo que, durante muito tempo, tomamos por verdade e, por isso mesmo, amamos e servimos. É verificar, desoladamente, que era de barro cru o Deus que defendíamos. É o desespero de ver que servimos o mal e julgávamos servir o bem.
Mas é também o começo de um profundo exame de consciência e um sinal de redenção - je ne suis pas encore fixé sur ce que je dois croire. Em Alfredo Pimenta, foram alguns meses de meditação, a sós com os seus livros e com as suas ideias, com os sonhos do passado e os desgostos do presente.
Je ne suis pas encore fixé sur ce que je dois croire. Foram alguns meses de meditação. As suas ideias nunca poderiam concretizar-se em regime republicano. Eram verdadeiramente incompatíveis — umas e outro. Afinal, aquela quimérica República, com as funções do Presidente elevadas ao mais alto grau e as atribuições parlamentares reduzidas à matéria de imposto e pouco mais; afinal, aquela espécie de ditadura presidencialista, que não era parlamentar, que não era democrática, nem era liberal, com um Presidente vitalício, estava próxima da Monarquia tradicional.
Foram alguns meses de reflexão sincera. E, como não podia deixar de acontecer, pôs no vértice da sua doutrina aquilo que lhe faltava para que fosse coerente, lógica e viável: o Rei.
III
Alfredo Pimenta pertencia a uma espécie de espíritos que ele próprio definiu, chamando-lhes expansivos e dizendo que são «tipicamente transformadores», isto é, «caracterizam-se pela actividade; sofrem e reagem; absorvem e exportam». Toda a gente pode acompanhar a evolução das suas ideias, pois ele, precisamente porque era um expansivo, intelectualmente honesto e corajoso, punha-as sempre em letra de forma e proclamava-as onde quer que fosse. Não era homem de arcas encoiradas nem homem que se calasse facilmente, nem homem que dissesse preto onde era branco, verdade onde era mentira, se a sua consciência lhe ensinasse que, de facto, era branco ou era mentira.
Foi monárquico, quando a sua inteligência, iluminada pela cultura e esclarecida pela lição dos factos, verificou a superioridade do princípio monárquico na aplicação ao caso português. E, a partir daí, foi-o com inteireza, com superioridade, e lutou desassombradamente pelas suas ideias.
Foi católico, quando a sua consciência, tocada pela divina claridade da Fé, encontrou e recebeu a Verdade Suprema. E desde então, foi um crente sincero e convicto.
O 14 de Maio tinha posto fim à derradeira esperança de um Governo honrado. Era em 1915. Homens como Alfredo Pimenta, não se afastam, quando isso seria mais cómodo, nem se calam, quando isso fosse, porventura, mais proveitoso. Após meio ano de bem madura reflexão, chegou à Monarquia. Surgiu, assim, "A Solução Monárquica" — opúsculo que não é apenas o depoimento de uma inteligência esclarecida, mas ainda o documento onde se reflecte toda a grandeza moral de uma alma. É com esse depoimento que Alfredo Pimenta inicia a sua notável carreira de doutrinador e apóstolo das ideias monárquicas.
«Na plena posse da minha serenidade, — escrevia ele precisamente nessa altura —, livre de qualquer sugestão, tão profundamente concentrado como se estivesse confiando, na hora última da minha existência, à inteligência de Deus ou ao juízo da História, os meus mais íntimos pensamentos; evocando tudo quanto de belo tive nos sacrifícios do Passado e pensando no destino sagrado dos meus filhos; não esquecendo o que devo ao meu nome que é puro de mácula, e o que devo ao respeito dos homens que em mim confiam — neste estado de espírito e de alma, a minha mão, serena e firme, escreve que a única solução nacional da crise portuguesa, compatível com o orgulho próprio de quem tem uma existência de sete séculos e levou, através os mares e regiões desconhecidas, a Civilização e a Beleza — é a solução monárquica, a restauração da monarquia.» Homens como Alfredo Pimenta não se calam, nem se acomodam. Ele procurava a Verdade, ansiosamente, desesperadamente. Mas uma vez que a encontrou, não a guardava para uso pessoal e recreio egoísta do seu espírito. Procurava-a, para a servir. E um dos meios de servir a Verdade, é dá-la a conhecer aos outros. Eis a razão de ser de toda a sua actividade de escritor — de crítico, de polemista, de historiador, de doutrinador — servir a Verdade!
De doutrinador... De facto, o que é doutrinar, no sentido de missão, que o termo encerra, senão ensinar aos outros a Verdade que se alcançou pela experiência, pela inteligência, pela cultura, ou pela Fé? O que foi a acção doutrinária de Alfredo Pimenta, senão um admirável apostolado, — junto da juventude, para a ensinar e lhe evitar os enganos por que ele passou, o calvário que tanta amargura lhe custou; junto dos mais velhos, a levar-lhes os esclarecimentos de uma sólida erudição, conseguida através de uma vida inteira dedicada ao estudo.
Mas há, ainda, uma faceta curiosa, na sua actividade de doutrinador, que não é inútil referir. Ele foi sempre anti-democrático e, talvez por isso mesmo, nunca falou ou escreveu para as massas, para a multidão, para o grande público. Nem isso compete a um doutrinador. As suas palavras eram dirigidas a um número limitado de pessoas e, muitas vezes, falava ou escrevia para uma pessoa, apenas, uma pessoa, em particular, pouco lhe interessando que os outros o lessem ou o escutassem. Essa pessoa, a quem, na sua finalidade oculta, se dirigiam as suas palavras, sem, muitas vezes, o dar a entender a ninguém, nem mesmo ao próprio, essa pessoa tanto pode ter sido António José de Almeida, como o foi, depois, o Senhor D. Manuel II, como o foi, por último, Salazar.
António José de Almeida era director do jornal "República". O regime republicano entrou a dar imediatamente os seus frutos lastimosos e funestos. Alfredo Pimenta era, como se sabe, um republicano sui generis, pois, entre as constantes do seu pensamento, está o desprezo absoluto pelo mito democrático, pela mistificação da Urna.
Era colaborador do jornal "República". E então, começou aí a desenvolver uma campanha, no sentido de travar o inevitável afundamento na anarquia, para que tudo indicava se iria caminhar. Mas essa campanha, no fundo, era dirigida apenas a António José de Almeida, que foi Chefe do Governo e era um homem com altas responsabilidades na política republicana. O próprio Alfredo Pimenta conta. António José de Almeida, que, como director do jornal, lia os artigos, antecipadamente, dizia-lhe muitas vezes, a propósito de qualquer deles, que não poderia ser publicado — ou porque era muito conservador ou porque criticava asperamente o parlamentarismo. E Pimenta não dizia nada, mas retirava-se intimamente satisfeito. Não lhe interessava a publicação do artigo. O que lhe interessava é que António José de Almeida o tivesse lido. O resto era o menos.
Depois que entrou para o campo monárquico, vemo-lo a exercer a sua acção doutrinária a favor da Monarquia tradicional. E, por outro lado, com o sentido exacto de que mais vale um dos bons do que um milhão dos maus, também, então, a sua acção se exerce, silenciosamente, junto do Senhor D. Manuel II, com quem manteve correspondência, no sentido de provar a El-Rei que tinha caducado o seu juramento aos princípios constitucionais e que era necessário levar a efeito a unidade doutrinaria da Causa Monárquica.
Vem Salazar. Alfredo Pimenta continua a ensinar a doutrina monárquica. Mas quem não vê, em muitas das suas páginas, que elas são especialmente dirigidas ao Sr. Presidente do Conselho? Quem não vê que, quando isso vinha a propósito, Alfredo Pimenta lembrava a Salazar a fragilidade de tudo isto a que já se chamou Estado Novo? Quem não tem ideia de que Alfredo Pimenta lembrava constantemente ao Sr. Presidente do Conselho, o desastrado fim a que estaria condenada toda a sua obra admirável, de mais de duas décadas, se não lhe assegurasse o futuro — preparando o regresso do Rei?
«Pretender que o regime salazariano sobreviva a Salazar — dizia ele — é uma ilusão que pode sair caríssima ao Povo português — em dinheiro, em vidas, em sangue e em honra.» Dizia mais: que o Povo português «não vê em Salazar o primeiro ministro de uma República mas sim o Chefe de uma Nação, o precursor do Rei».
Ele escreveu isto — e muito mais — em artigos de jornal ou em livros que muita gente leu. Mas é flagrante que, na sua intenção profunda, estas palavras foram escritas para serem meditadas por um Homem. O resto era o menos.
IV
Qual era a doutrina ?
A doutrina foram os séculos que a fizeram, moldando as instituições ao carácter do Povo, fazendo a Nação e dando-lhe possibilidade de vida. A doutrina não é o produto da imaginação de um homem — como a que a Revolução Francesa consagrou e exportou. Assenta nas bases firmes de uma História de muitos séculos, acompanhou um Povo inteiro no seu longo evoluir, em horas de grandeza como em momentos de luto e desespero. Deu à Nação consciência da sua unidade, fez dela um corpo inteiro, obedecendo a um pensamento superior e cumprindo admiravelmente o seu destino. A sua lógica é a experiência, o seu fundamento a Tradição e a sua razão de ser é a razão de ser da própria História do Povo que serviu.
Ao doutrinador, em matéria como esta, cumpre ir à História e tirar dela os princípios que informaram a organização social do País. Cumpre-lhe analisar as instituições, acompanhá-las na sua evolução histórica — expondo os resultados dessa análise. Mas doutrinar não é expor friamente, secamente, as ideias e os princípios. É alguma coisa mais. É mostrar as vantagens e virtudes das instituições e as suas possibilidades de adaptação. É fazer a defesa dessas ideias e desses princípios. É dar à exposição um sopro de vida e de alma! E aqui, já o homem que doutrina é, em certa medida, um criador.
Qual o fim de toda a acção doutrinária, entendida como apostolado e missão? É chamar os outros para a nossa verdade. É mostrar-lhes o erro em que se encontram e procurar desviá-los dele. É dizer-lhes as nossas razões e a superioridade dos nossos princípios.
Este é um dos aspectos.
Porque não se doutrina apenas para os que estão no erro. É preciso, também, ensinar os que estão na verdade — mas ignoram porquê. É preciso fazer, de elementos amorfos, elementos conscientes. E então, a actividade consiste, neste caso, em explicar-lhes que a verdade é aquela, aquele o caminho verdadeiro, por tais e tais razões, por estes e estes fundamentos. E aqui, entra, ainda, uma parte de criação. Porque o doutrinador político e social, ao justificar as suas ideias, mesmo que sejam obra da História e de um Povo inteiro, desenvolvidas através dos séculos e da experiência, ao explicar os seus fundamentos, como ao fazer a sua exposição apaixonada, deixa sempre inevitavelmente, nessas operações, qualquer coisa de seu, da sua própria alma, da sua própria inteligência. E nessa medida, ele é um criador.
Alfredo Pimenta foi um doutrinador de Portugalidade, conceito que abrange tudo o que é típica e especificamente nosso, isto é, as instituições e as ideias que são fruto do génio português, a civilização que nós criamos e espalhamos pelo mundo. Portugalidade, em oposição à Latinidade, à Hispanidade, e até, à Lusitanidade. Em oposição às duas primeiras porque, dentro delas, ou nada significamos ou somos confundidos. E em oposição à Lusitanidade, porque Portugal não é precisamente o mesmo que Lusitânia, visto esta não ser toda nossa.
Em matéria político-social, a Portugalidade compõe-se de vários elementos: uns que a criaram e estão, portanto, na sua origem e lhe são, até, anteriores, como a Monarquia; outros que a integraram, completaram e desenvolveram, como o Nacionalismo e a Tradição.
Antes de sermos uma nacionalidade, já éramos um Estado, já éramos uma Monarquia. A Nação, isto é, a consciência de um passado comum, de interesses e de aspirações comuns, surgiu mais tarde e foi obra dos seus Reis e da Igreja Católica. Eis porque um doutrinador de Portugalidade, como o foi Alfredo Pimenta, tem de, fatalmente, defender a Igreja e defender a Realeza. Defender a Igreja, primeiro, porque esta representa Deus na terra, e as sociedades humanas nascem, desenvolvem-se e existem, para servir um fim espiritual, ou seja, para servir a Deus. Depois, porque é em Deus que reside a origem do Poder, para a Monarquia hereditária. E, finalmente, porque, como Alfredo Pimenta escreveu, se «foi a espada dum Rei que fez Portugal», fê-lo «por amor da Cruz e para servir a Cruz». E acrescentava: «Português que não seja fiel a esta dupla tradição religiosa e política, é português transviado por influências estrangeiras ao espírito, aos sentimentos e ao sangue de Portugal, seja qual for o seu valor particular».
Defender a Realeza, porque uma Nação não é o dia de hoje, é o que passou e é o que virá, os seus mortos e os seus heróis, a sua saudade e as suas esperanças. E se «o Rei é anterior à Nação», é, também, o representante visível de uma Dinastia, isto é, e ainda empregando uma expressão de Alfredo Pimenta, «o elo vivo e activo que liga o Passado ao Futuro».
Na actividade doutrinária de Alfredo Pimenta, se há, como não podia deixar de ser, um aspecto positivo, há também um aspecto negativo.
As ideias da Revolução penetraram profundamente nos espíritos, dementaram a Nação, foram consagradas nas constituições, o Estado aceitou-as e obedeceu-lhes. Era preciso, pois, antes de mais, destruir todas as suas influências perniciosas e funestas, pôr a nu os seus sofismas e as suas mentiras. Eis o aspecto negativo, importantíssimo como pressuposto de toda a acção positiva.
Era preciso combater o espírito democrático, provar que a Democracia não passa de uma mistificação — aspecto negativo — e opor-lhe a Monarquia Tradicional e o Nacionalismo Integral — aspecto positivo. Era preciso condenar o liberalismo político, estrangulador das nossas regalias municipais e das nossas liberdades profissionais e corporativas, denunciando a burla do Poder que emana da Urna e do Voto, para se lhe opor o Autoritarismo contra-revolucionário. «O homem, munido do papelinho branco, é omnipotente, é omnisciente»? Oiçam, ainda, Alfredo Pimenta: «Um milhão de homens de um lado, outro milhão de homens de outro lado. Empate. Quem vai desempatar? O Pistautira (oh!) que se esquecera de que era o grande dia do Povo Soberano. Vão chamar o Pistautira! E o Pistautira chega, e vota. E desempata... Quem foi omnipotente? Quem foi omnisciente? O Pistautira...»
Foi, assim, orientada nestes dois aspectos, a acção doutrinária de Alfredo Pimenta: desfazer os mitos e refazer as realidades, combater os desvios nefastos e apontar o caminho verdadeiro. Numa época desorientada e quase demente, a sua palavra firme, de razão e coerência, foi como fio de água límpida onde irão sempre refrescar-se os que estejam fartos de malabarismos e tenham sede de verdade e de raciocínios claros.
E, para terminar, duas palavras mais. Apenas duas.
Há homens de quem se pode dizer, em verdade, que valeu bem a pena terem passado neste mundo, quanto mais não fosse, ou que mais não valessem, pelo exemplo que deixaram. Alfredo Pimenta pertence incontestavelmente, a esta categoria.
Está, ainda, fresca a terra da sua sepultura. Ainda não cessaram, à volta do seu nome, os ódios e os despeitos. Rugem, ainda, as vozes de rancor. Mas nem os ódios, por mais ferozes, nem os despeitos, por mais ignóbeis, nem o rancor, por mais repugnante, conseguirão, de forma alguma, diminuir a memória do homem, cuja vida foi magnífica lição de carácter, de coragem e desassombro; cuja vida foi exemplo verdadeiro de trabalho exaustivo, de estudo sério e consciente.
Uma vida inteira dedicada ao serviço da Verdade, à Cultura do seu País, ao combate leal pelas suas ideias, à ternura e ao carinho do seu lar. Há ideal mais belo? Há exemplo melhor, agora, que o carácter é feito de transigências, de falsificações e de renúncias? Há exemplo melhor, agora, que a coragem e o desassombro dependem da maior ou menor capacidade do cordão umbilical? Há exemplo melhor, nestes tempos, em que a Verdade anda arrastada pelas ruas da amargura, mutilada e esquecida ?
Júlio Evangelista
(1 — Discurso proferido na homenagem ao Dr. Alfredo Pimenta, promovido pela Junta Escolar Monárquica do Porto, em 28 de Abril de 1951)
(Publicado in «Gil Vicente», vol. II — 2.ª série, págs. 185/195, nº 11/12, Novembro/Dezembro de 1951)
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Há escritores que nascem com um destino singular. Toda a gente fala deles, toda a gente se acha à altura de os discutir, toda a gente os critica, — nos mais pequenos pormenores, nas mais pequenas atitudes. São homens acerca dos quais há sempre uma opinião definida — boa ou má —, acerca dos quais ouvimos dizer coisas, desde o homem da rua ao estudioso, desde o ignorante ao erudito. Ouve-se deles o que há de mais díspar e contraditório, porque, em todas as bocas, o seu nome suscita sempre uma reacção. O certo, porém, é que, se formos a averiguar a fundo, se tentarmos saber os fundamentos de tais opiniões, se quisermos investigar honestamente, ficamos com a desoladora certeza de que muito poucos os leram, muito pouca gente conhece a sua obra. Raros se debruçaram sobre os seus livros e os meditaram. Raros tentaram penetrar no seu pensamento. Raros procuraram compreendê-los. E mais raros, ainda, quiseram saber das razões de muitas das suas atitudes, quantas vezes incompreensíveis à primeira vista!
Há, de facto, escritores e artistas com um destino singular. Possuem uma personalidade tão forte, uma obra tão rica, que se impõem ao espírito e à inteligência dos que sabem ler, e aí são acolhidos, respeitados, discutidos. Mas os que sabem ler são muito poucos. E vem depois a hoste enorme dos que fingem que sabem ler. Estes não se dão, sequer, ao trabalho de consultar os seus livros. Mas têm opiniões: as que escutaram nalguma conversa de café; as que leram em qualquer almanaque ou borda-d`água; as que viram escritas em qualquer história resumida da arte ou da literatura; mas, enfim, opiniões!
Assim nascem os lugares comuns, as ideias generalizadas, que muita gente aceita e de que faz dogmas, certezas, a maior parte das vezes sem qualquer fundamento real, sem nenhuma razão de ser.
Muito disto se passa com Alfredo Pimenta. Quase toda a gente, neste País, se acha no direito de ter opiniões acerca da sua obra e da sua pessoa. E no entanto, quase toda essa gente fala de cor.
Uns conhecem dele alguns artigos de jornal — pouco mais. E isso lhes basta... Outros vêem nele o polemista contundente, o caceteiro que esmagava o adversário com o poder de uma argumentação inabalável. E isso lhes basta. Outros, ainda, porque o escutaram nalguma conferência, sentem-se intimamente satisfeitos e dizem para consigo próprios que estão à altura de poderem discutir a personalidade de Alfredo Pimenta.
Poucos, porém, conhecem, ou tentaram conhecer, a sua vastíssima obra de esclarecimento político; muito poucos leram os seus trabalhos de historiografia; e quase nenhuns sentiram o admirável poeta de "O Livro da Minha Saudade" e de "O Livro das Quimeras".
É por isso que, numa sessão, como esta, de homenagem póstuma a Alfredo Pimenta, eu me sinto no dever de dizer aqui, diante de todos e antes de mais, que a melhor homenagem a prestar à sua memória, a que ele mais estimaria, a mais real e mais profícua, será precisamente a que, por um dever de consciência e por um imperativo da inteligência, cada um de nós fizer por si mesmo, — lendo a sua obra, meditando-a, compreendendo-a.
II
«Tu m`en demandes trop long. J`évolue, comme on dit. Par conséquent, je ne sais pas exactement ou j`en suis. Je sais très bien ce que je ne crois plus, je ne suis pas encore fixé sur ce que je dois croire.» Esta resposta de Jules Lemaître, quando lhe perguntaram o que era, afinal, em política, — se era realista ou se era bonapartista —, vem na "Enquête sur la Monarchie" de Charles Maurras. Um dia, um amigo, de visita a Alfredo Pimenta, abriu o exemplar da "Enquête" que estava sobre a secretária, e encontrou esta passagem sublinhada a lápis. Era em 1915. E, com a queda do Governo de Pimenta de Castro, frustraram-se as derradeiras esperanças dos que ainda poderiam acreditar na viabilidade da República.
Deu-se, durante o século passado e no começo deste, um equívoco de graves consequências. Tinha-se feito do Estado, na expressão de Oliveira Martins, uma agência de caminhos de ferro. Vivia-se de Saldanhadas e de Janeirinhas. Fazia-se política como quem faz ski, por uma encosta demasiado íngreme. Foi-se a moeda, foi-se a noção do respeito, foi-se o prestígio. E quando um hábil Ministro, que se chamou Barros Gomes, caiu, mas firme na defesa dos nossos direitos e dos nossos interesses de País colonial, cedendo apenas diante da força irresistível, em vez do respeito que lhe era devido, em vez das palavras de gratidão e apreço, a que tinha direito, que vemos nós? Vemos a populaça, debaixo das suas janelas, gritando vivas à Pátria, na intenção de, assim, o insultar, e vemos, ainda, preparar-se essa coisa incrível que dá pelo nome de 31 de Janeiro. Vemos a política degradada, perdida a noção das conveniências, e até da decência. Partidos que se degladiam, monárquicos que se insultam e difamam mutuamente. Nem o próprio Rei escapa. «Desde que me conheci» — escreve Alfredo Pimenta — «o menos que ouvi aos monárquicos chamarem-se uns aos outros, a começar no Rei e a terminar no mais sertanejo regedor, foi ladrões.» Isto é mais que sabido, mas é bom recordá-lo. De que servem estadistas de valor, se as instituições lhes tolhem os movimentos? Que poderia fazer um Rei extraordinário, como D. Carlos, se, por força do sistema, ele era apenas o quarto poder do Estado — um vago, teórico poder a que chamavam moderador? De que serviam, além do exemplo e demonstração de vitalidade, feitos gloriosos e heróicos, como os de Mouzinho e Paiva de Andrade, se a política os poderia desperdiçar em qualquer altura, e até por questiúnculas entre Braga e Guimarães — como quando, em Paris, discutíamos importantes problemas de limites e de esferas de influência na África?
Era assim o sistema que felizmente já não nos rege, de que Ramalho zombava, denunciando-lhe a nudez.
Tornara-se evidente que isto não servia. E diante deste espectáculo tristíssimo, temos de admitir que, a muitos espíritos, a República se apresentasse como uma solução desejável. A propaganda era intensa, servia-se de tudo — de discursos, de promessas, de calúnias. O regime caíra no descrédito. Muitos espíritos honestos — sobretudo entre os novos — aderiram ao movimento republicano, fundamentalmente por oposição à Monarquia e ao sistema que não tinha possibilidades de satisfazer aos mais instantes interesses do País. E eis o grande equívoco de que há pouco falei: é que se tomou por Monarquia uma coisa que o não era na realidade. É que se não soube olhar para trás, penetrar no espírito do passado, e tirar daí as lições necessárias. É que se tomou por Monarquia, a Monarquia liberal, embrião e prefácio de todas as repúblicas. Chega a ser paradoxal: eles eram anti-monárquicos — e é o caso de Alfredo Pimenta — porque eram anti-democráticos; eles eram anti-monárquicos, — muitos homens sérios desse tempo —, porque eram anti-liberais; eram contra a Monarquia, porque eram contra o parlamentarismo.
Onde estava o equívoco? No nome de Monarquia, dado a um regime que o não merecia verdadeiramente. Porque uma Monarquia de partidos e discursos da Coroa, uma Monarquia liberal, democrática e parlamentar, pode ser tudo o que quiserem, menos Monarquia. Eis o grave equívoco de que falei. Eles eram contra aquela Monarquia. Não viram, nesse momento, que a solução estava no Passado e no espírito das suas instituições. Não viram — muitos deles — que a satisfação dos seus anseios e dos seus ideais estava precisamente na Monarquia, mas na Monarquia verdadeira, na Monarquia Tradicional, — anti-democrática, porque o Poder vem de Deus; anti-liberal, porque orgânica; anti-parlamentar, porque anti-democrática. Não viram. E sinceramente, convictos, com o idealismo e o entusiasmo dos vinte anos, foram atrás da República, e serviram-na com lealdade, sempre de cara descoberta.
Em breve viria a desilusão. Se a Monarquia liberal era a desordem, a República era a anarquia. Se aquela era um equívoco, esta era uma mentira. E um espírito sério, honesto, não pode servir uma mentira. Foi este o caso de Alfredo Pimenta.
Je sais très bien ce que je ne crois plus. É a desilusão de um honrado lutador que, ao fim de batalhas e batalhas, ingratas e cruéis, vê a inutilidade de tanto esforço dispendido. É mais. É a amargura do soldado que, depois de inúmeros combates, vê tudo de repente iluminado por uma luz mais forte e verdadeira, e conclui, em plena luta, desesperadamente, que a causa porque tanto se bateu, com heroísmo e com fervor, não merecia o seu fervor, nem merecia o seu heroísmo.
Je sais très bien ce que je ne crois plus. Esta confissão é de um extraordinário dramatismo. É o desmoronar de ilusões e de ideais. É ter de concluir que era mentira aquilo que, durante muito tempo, tomamos por verdade e, por isso mesmo, amamos e servimos. É verificar, desoladamente, que era de barro cru o Deus que defendíamos. É o desespero de ver que servimos o mal e julgávamos servir o bem.
Mas é também o começo de um profundo exame de consciência e um sinal de redenção - je ne suis pas encore fixé sur ce que je dois croire. Em Alfredo Pimenta, foram alguns meses de meditação, a sós com os seus livros e com as suas ideias, com os sonhos do passado e os desgostos do presente.
Je ne suis pas encore fixé sur ce que je dois croire. Foram alguns meses de meditação. As suas ideias nunca poderiam concretizar-se em regime republicano. Eram verdadeiramente incompatíveis — umas e outro. Afinal, aquela quimérica República, com as funções do Presidente elevadas ao mais alto grau e as atribuições parlamentares reduzidas à matéria de imposto e pouco mais; afinal, aquela espécie de ditadura presidencialista, que não era parlamentar, que não era democrática, nem era liberal, com um Presidente vitalício, estava próxima da Monarquia tradicional.
Foram alguns meses de reflexão sincera. E, como não podia deixar de acontecer, pôs no vértice da sua doutrina aquilo que lhe faltava para que fosse coerente, lógica e viável: o Rei.
III
Alfredo Pimenta pertencia a uma espécie de espíritos que ele próprio definiu, chamando-lhes expansivos e dizendo que são «tipicamente transformadores», isto é, «caracterizam-se pela actividade; sofrem e reagem; absorvem e exportam». Toda a gente pode acompanhar a evolução das suas ideias, pois ele, precisamente porque era um expansivo, intelectualmente honesto e corajoso, punha-as sempre em letra de forma e proclamava-as onde quer que fosse. Não era homem de arcas encoiradas nem homem que se calasse facilmente, nem homem que dissesse preto onde era branco, verdade onde era mentira, se a sua consciência lhe ensinasse que, de facto, era branco ou era mentira.
Foi monárquico, quando a sua inteligência, iluminada pela cultura e esclarecida pela lição dos factos, verificou a superioridade do princípio monárquico na aplicação ao caso português. E, a partir daí, foi-o com inteireza, com superioridade, e lutou desassombradamente pelas suas ideias.
Foi católico, quando a sua consciência, tocada pela divina claridade da Fé, encontrou e recebeu a Verdade Suprema. E desde então, foi um crente sincero e convicto.
O 14 de Maio tinha posto fim à derradeira esperança de um Governo honrado. Era em 1915. Homens como Alfredo Pimenta, não se afastam, quando isso seria mais cómodo, nem se calam, quando isso fosse, porventura, mais proveitoso. Após meio ano de bem madura reflexão, chegou à Monarquia. Surgiu, assim, "A Solução Monárquica" — opúsculo que não é apenas o depoimento de uma inteligência esclarecida, mas ainda o documento onde se reflecte toda a grandeza moral de uma alma. É com esse depoimento que Alfredo Pimenta inicia a sua notável carreira de doutrinador e apóstolo das ideias monárquicas.
«Na plena posse da minha serenidade, — escrevia ele precisamente nessa altura —, livre de qualquer sugestão, tão profundamente concentrado como se estivesse confiando, na hora última da minha existência, à inteligência de Deus ou ao juízo da História, os meus mais íntimos pensamentos; evocando tudo quanto de belo tive nos sacrifícios do Passado e pensando no destino sagrado dos meus filhos; não esquecendo o que devo ao meu nome que é puro de mácula, e o que devo ao respeito dos homens que em mim confiam — neste estado de espírito e de alma, a minha mão, serena e firme, escreve que a única solução nacional da crise portuguesa, compatível com o orgulho próprio de quem tem uma existência de sete séculos e levou, através os mares e regiões desconhecidas, a Civilização e a Beleza — é a solução monárquica, a restauração da monarquia.» Homens como Alfredo Pimenta não se calam, nem se acomodam. Ele procurava a Verdade, ansiosamente, desesperadamente. Mas uma vez que a encontrou, não a guardava para uso pessoal e recreio egoísta do seu espírito. Procurava-a, para a servir. E um dos meios de servir a Verdade, é dá-la a conhecer aos outros. Eis a razão de ser de toda a sua actividade de escritor — de crítico, de polemista, de historiador, de doutrinador — servir a Verdade!
De doutrinador... De facto, o que é doutrinar, no sentido de missão, que o termo encerra, senão ensinar aos outros a Verdade que se alcançou pela experiência, pela inteligência, pela cultura, ou pela Fé? O que foi a acção doutrinária de Alfredo Pimenta, senão um admirável apostolado, — junto da juventude, para a ensinar e lhe evitar os enganos por que ele passou, o calvário que tanta amargura lhe custou; junto dos mais velhos, a levar-lhes os esclarecimentos de uma sólida erudição, conseguida através de uma vida inteira dedicada ao estudo.
Mas há, ainda, uma faceta curiosa, na sua actividade de doutrinador, que não é inútil referir. Ele foi sempre anti-democrático e, talvez por isso mesmo, nunca falou ou escreveu para as massas, para a multidão, para o grande público. Nem isso compete a um doutrinador. As suas palavras eram dirigidas a um número limitado de pessoas e, muitas vezes, falava ou escrevia para uma pessoa, apenas, uma pessoa, em particular, pouco lhe interessando que os outros o lessem ou o escutassem. Essa pessoa, a quem, na sua finalidade oculta, se dirigiam as suas palavras, sem, muitas vezes, o dar a entender a ninguém, nem mesmo ao próprio, essa pessoa tanto pode ter sido António José de Almeida, como o foi, depois, o Senhor D. Manuel II, como o foi, por último, Salazar.
António José de Almeida era director do jornal "República". O regime republicano entrou a dar imediatamente os seus frutos lastimosos e funestos. Alfredo Pimenta era, como se sabe, um republicano sui generis, pois, entre as constantes do seu pensamento, está o desprezo absoluto pelo mito democrático, pela mistificação da Urna.
Era colaborador do jornal "República". E então, começou aí a desenvolver uma campanha, no sentido de travar o inevitável afundamento na anarquia, para que tudo indicava se iria caminhar. Mas essa campanha, no fundo, era dirigida apenas a António José de Almeida, que foi Chefe do Governo e era um homem com altas responsabilidades na política republicana. O próprio Alfredo Pimenta conta. António José de Almeida, que, como director do jornal, lia os artigos, antecipadamente, dizia-lhe muitas vezes, a propósito de qualquer deles, que não poderia ser publicado — ou porque era muito conservador ou porque criticava asperamente o parlamentarismo. E Pimenta não dizia nada, mas retirava-se intimamente satisfeito. Não lhe interessava a publicação do artigo. O que lhe interessava é que António José de Almeida o tivesse lido. O resto era o menos.
Depois que entrou para o campo monárquico, vemo-lo a exercer a sua acção doutrinária a favor da Monarquia tradicional. E, por outro lado, com o sentido exacto de que mais vale um dos bons do que um milhão dos maus, também, então, a sua acção se exerce, silenciosamente, junto do Senhor D. Manuel II, com quem manteve correspondência, no sentido de provar a El-Rei que tinha caducado o seu juramento aos princípios constitucionais e que era necessário levar a efeito a unidade doutrinaria da Causa Monárquica.
Vem Salazar. Alfredo Pimenta continua a ensinar a doutrina monárquica. Mas quem não vê, em muitas das suas páginas, que elas são especialmente dirigidas ao Sr. Presidente do Conselho? Quem não vê que, quando isso vinha a propósito, Alfredo Pimenta lembrava a Salazar a fragilidade de tudo isto a que já se chamou Estado Novo? Quem não tem ideia de que Alfredo Pimenta lembrava constantemente ao Sr. Presidente do Conselho, o desastrado fim a que estaria condenada toda a sua obra admirável, de mais de duas décadas, se não lhe assegurasse o futuro — preparando o regresso do Rei?
«Pretender que o regime salazariano sobreviva a Salazar — dizia ele — é uma ilusão que pode sair caríssima ao Povo português — em dinheiro, em vidas, em sangue e em honra.» Dizia mais: que o Povo português «não vê em Salazar o primeiro ministro de uma República mas sim o Chefe de uma Nação, o precursor do Rei».
Ele escreveu isto — e muito mais — em artigos de jornal ou em livros que muita gente leu. Mas é flagrante que, na sua intenção profunda, estas palavras foram escritas para serem meditadas por um Homem. O resto era o menos.
IV
Qual era a doutrina ?
A doutrina foram os séculos que a fizeram, moldando as instituições ao carácter do Povo, fazendo a Nação e dando-lhe possibilidade de vida. A doutrina não é o produto da imaginação de um homem — como a que a Revolução Francesa consagrou e exportou. Assenta nas bases firmes de uma História de muitos séculos, acompanhou um Povo inteiro no seu longo evoluir, em horas de grandeza como em momentos de luto e desespero. Deu à Nação consciência da sua unidade, fez dela um corpo inteiro, obedecendo a um pensamento superior e cumprindo admiravelmente o seu destino. A sua lógica é a experiência, o seu fundamento a Tradição e a sua razão de ser é a razão de ser da própria História do Povo que serviu.
Ao doutrinador, em matéria como esta, cumpre ir à História e tirar dela os princípios que informaram a organização social do País. Cumpre-lhe analisar as instituições, acompanhá-las na sua evolução histórica — expondo os resultados dessa análise. Mas doutrinar não é expor friamente, secamente, as ideias e os princípios. É alguma coisa mais. É mostrar as vantagens e virtudes das instituições e as suas possibilidades de adaptação. É fazer a defesa dessas ideias e desses princípios. É dar à exposição um sopro de vida e de alma! E aqui, já o homem que doutrina é, em certa medida, um criador.
Qual o fim de toda a acção doutrinária, entendida como apostolado e missão? É chamar os outros para a nossa verdade. É mostrar-lhes o erro em que se encontram e procurar desviá-los dele. É dizer-lhes as nossas razões e a superioridade dos nossos princípios.
Este é um dos aspectos.
Porque não se doutrina apenas para os que estão no erro. É preciso, também, ensinar os que estão na verdade — mas ignoram porquê. É preciso fazer, de elementos amorfos, elementos conscientes. E então, a actividade consiste, neste caso, em explicar-lhes que a verdade é aquela, aquele o caminho verdadeiro, por tais e tais razões, por estes e estes fundamentos. E aqui, entra, ainda, uma parte de criação. Porque o doutrinador político e social, ao justificar as suas ideias, mesmo que sejam obra da História e de um Povo inteiro, desenvolvidas através dos séculos e da experiência, ao explicar os seus fundamentos, como ao fazer a sua exposição apaixonada, deixa sempre inevitavelmente, nessas operações, qualquer coisa de seu, da sua própria alma, da sua própria inteligência. E nessa medida, ele é um criador.
Alfredo Pimenta foi um doutrinador de Portugalidade, conceito que abrange tudo o que é típica e especificamente nosso, isto é, as instituições e as ideias que são fruto do génio português, a civilização que nós criamos e espalhamos pelo mundo. Portugalidade, em oposição à Latinidade, à Hispanidade, e até, à Lusitanidade. Em oposição às duas primeiras porque, dentro delas, ou nada significamos ou somos confundidos. E em oposição à Lusitanidade, porque Portugal não é precisamente o mesmo que Lusitânia, visto esta não ser toda nossa.
Em matéria político-social, a Portugalidade compõe-se de vários elementos: uns que a criaram e estão, portanto, na sua origem e lhe são, até, anteriores, como a Monarquia; outros que a integraram, completaram e desenvolveram, como o Nacionalismo e a Tradição.
Antes de sermos uma nacionalidade, já éramos um Estado, já éramos uma Monarquia. A Nação, isto é, a consciência de um passado comum, de interesses e de aspirações comuns, surgiu mais tarde e foi obra dos seus Reis e da Igreja Católica. Eis porque um doutrinador de Portugalidade, como o foi Alfredo Pimenta, tem de, fatalmente, defender a Igreja e defender a Realeza. Defender a Igreja, primeiro, porque esta representa Deus na terra, e as sociedades humanas nascem, desenvolvem-se e existem, para servir um fim espiritual, ou seja, para servir a Deus. Depois, porque é em Deus que reside a origem do Poder, para a Monarquia hereditária. E, finalmente, porque, como Alfredo Pimenta escreveu, se «foi a espada dum Rei que fez Portugal», fê-lo «por amor da Cruz e para servir a Cruz». E acrescentava: «Português que não seja fiel a esta dupla tradição religiosa e política, é português transviado por influências estrangeiras ao espírito, aos sentimentos e ao sangue de Portugal, seja qual for o seu valor particular».
Defender a Realeza, porque uma Nação não é o dia de hoje, é o que passou e é o que virá, os seus mortos e os seus heróis, a sua saudade e as suas esperanças. E se «o Rei é anterior à Nação», é, também, o representante visível de uma Dinastia, isto é, e ainda empregando uma expressão de Alfredo Pimenta, «o elo vivo e activo que liga o Passado ao Futuro».
Na actividade doutrinária de Alfredo Pimenta, se há, como não podia deixar de ser, um aspecto positivo, há também um aspecto negativo.
As ideias da Revolução penetraram profundamente nos espíritos, dementaram a Nação, foram consagradas nas constituições, o Estado aceitou-as e obedeceu-lhes. Era preciso, pois, antes de mais, destruir todas as suas influências perniciosas e funestas, pôr a nu os seus sofismas e as suas mentiras. Eis o aspecto negativo, importantíssimo como pressuposto de toda a acção positiva.
Era preciso combater o espírito democrático, provar que a Democracia não passa de uma mistificação — aspecto negativo — e opor-lhe a Monarquia Tradicional e o Nacionalismo Integral — aspecto positivo. Era preciso condenar o liberalismo político, estrangulador das nossas regalias municipais e das nossas liberdades profissionais e corporativas, denunciando a burla do Poder que emana da Urna e do Voto, para se lhe opor o Autoritarismo contra-revolucionário. «O homem, munido do papelinho branco, é omnipotente, é omnisciente»? Oiçam, ainda, Alfredo Pimenta: «Um milhão de homens de um lado, outro milhão de homens de outro lado. Empate. Quem vai desempatar? O Pistautira (oh!) que se esquecera de que era o grande dia do Povo Soberano. Vão chamar o Pistautira! E o Pistautira chega, e vota. E desempata... Quem foi omnipotente? Quem foi omnisciente? O Pistautira...»
Foi, assim, orientada nestes dois aspectos, a acção doutrinária de Alfredo Pimenta: desfazer os mitos e refazer as realidades, combater os desvios nefastos e apontar o caminho verdadeiro. Numa época desorientada e quase demente, a sua palavra firme, de razão e coerência, foi como fio de água límpida onde irão sempre refrescar-se os que estejam fartos de malabarismos e tenham sede de verdade e de raciocínios claros.
E, para terminar, duas palavras mais. Apenas duas.
Há homens de quem se pode dizer, em verdade, que valeu bem a pena terem passado neste mundo, quanto mais não fosse, ou que mais não valessem, pelo exemplo que deixaram. Alfredo Pimenta pertence incontestavelmente, a esta categoria.
Está, ainda, fresca a terra da sua sepultura. Ainda não cessaram, à volta do seu nome, os ódios e os despeitos. Rugem, ainda, as vozes de rancor. Mas nem os ódios, por mais ferozes, nem os despeitos, por mais ignóbeis, nem o rancor, por mais repugnante, conseguirão, de forma alguma, diminuir a memória do homem, cuja vida foi magnífica lição de carácter, de coragem e desassombro; cuja vida foi exemplo verdadeiro de trabalho exaustivo, de estudo sério e consciente.
Uma vida inteira dedicada ao serviço da Verdade, à Cultura do seu País, ao combate leal pelas suas ideias, à ternura e ao carinho do seu lar. Há ideal mais belo? Há exemplo melhor, agora, que o carácter é feito de transigências, de falsificações e de renúncias? Há exemplo melhor, agora, que a coragem e o desassombro dependem da maior ou menor capacidade do cordão umbilical? Há exemplo melhor, nestes tempos, em que a Verdade anda arrastada pelas ruas da amargura, mutilada e esquecida ?
Júlio Evangelista
(1 — Discurso proferido na homenagem ao Dr. Alfredo Pimenta, promovido pela Junta Escolar Monárquica do Porto, em 28 de Abril de 1951)
(Publicado in «Gil Vicente», vol. II — 2.ª série, págs. 185/195, nº 11/12, Novembro/Dezembro de 1951)
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